O Amigo

Capítulo 30

Christiano estava sentado ao meu lado no sofá comendo uma maçã e eu estava apenas calado e pensando nas coisas que estavam acontecendo. Liguei a televisão e deixei num canal de filmes.

– Estamos bem agora? – disse Christiano.
– Acho que sim.
– Acha? – ele me olhou de relance.
– Não sei ficar com raiva de você.
– Te peço desculpas mais uma vez. Vamos esquecer tudo e recomeçar. – disse ele dando uma mordida na maça.
– Posso te perguntar uma coisa?
– Pode mandar a pergunta aí...
– Quando você falou comigo no seu primeiro dia de aula, você já tinha a intenção de ficar comigo?
– Não! Eu só queria fazer amizade e você me pareceu uma pessoa legal. E você?
– Também não tive intenção alguma quando te conheci.
– Tem certeza? – ele estreitou os olhos. – Eu te vi me olhando.
– Eu estava só olhando. – eu disse rindo. – Confesso que te achei muito bonito, mas nunca passou pela minha cabeça que um dia nós poderíamos ter alguma coisa.
– Você e essa mania de me achar muito bonito.
– Apenas a verdade. – voltei minha atenção para a televisão e só naquele momento eu me dei conta de qual filme estava passando. Apontei para a televisão.
– Olha só...
– O que foi?
– Esse é um dos meus filmes favoritos.
– Diário de uma paixão?
– É! E era esse filme que passava na hora que nós tivemos o nosso primeiro beijo.
– Caraca, é verdade. – ele sorriu e olhou pra mim. – Você lembra até do filme que estava passando na hora. Eu fiquei tão tenso que não lembro de quase nada.
– Claro que eu lembro.

– Meu pai e eu sempre vínhamos aqui, deitávamos pra ver o farol mudar. Ver ir do verde
pro vermelho, do vermelho pro amarelo... Pode tentar, se você quiser.
– Não!
– Porque não?
– Ah! Por que... Ah! Eu não sei... Levanta daí!
– Esse é o seu problema. Sabe disso? Você não faz o que quer.
– Ta bom!
– E o que acontece se vier um carro?
– Você morre.
– O que?
– Fique calma. Confie. Você precisa aprender a confiar.

– Esse filme é perfeito. – voltei a falar. – Sei que é um filme, mas tenho uma imensa vontade de viver um romance assim.
– Como esse filme?
– Como esse e vários outros.

Christiano me olhou pelo canto dos olhos e sorriu. Esticou sua perna esquerda em cima do sofá e abriu os braços.

– O que foi?
– Chega aqui.

Me rendi ao seu pedido e fui encontrar seus braços. Me sentei entre suas pernas e repousei minhas costas em seu peitoral. Seus braços quentes me envolveram e me apertaram num abraço afetuoso e gostoso. Senti a ponta gelada de seu nariz tocar em minha orelha e em seguida senti sua respiração quente contra minha pele.

– Posso ser o cara que vai viver um romance de filme com você?
– É claro que sim. Eu ficarei imensamente feliz em poder viver um romance de filme com você.

Não tive como conter o grande sorriso que crescia em meu rosto. Segurei seu pulso e beijei as costas de sua mão.

...

Conforme o tempo foi passando, Christiano foi se sentindo mais a vontade comigo e vice e versa. Nós já não escondíamos mais nada de ninguém e muito menos nos importávamos com o que poderiam falar de nós. Tudo estava indo muito bem entre nós.

Nós nos víamos todos os dias na escola e pelo menos duas vezes por semana eu passava a tarde inteira com ele em seu apartamento. Christiano tomava muito cuidado e gostava de dar um passo de cada vez e por isso, mesmo depois de todo aquele tempo, nós ainda não éramos namorados. Se dependesse de mim, Christiano já seria meu namorado oficialmente, com direito a pedido de namoro e tudo mais, mas eu sabia que pra ele talvez isso fosse um grande avanço e um pouco assustador, então eu nem tocava no assunto de namoro. Queria que ele me pedisse em namoro quando se sentisse bem e pronto para ser namorado de outro homem.

Durante uma semana inteira, eu e Christiano não pudemos passar a tarde juntos. Seus pais ficaram de folga durante vários dias seguidos e isso impedia os nossos encontros diários, além da escola. Assim que ele matou toda a saudade dos pais e os deixou no aeroporto, nós marcamos de nos encontrar no shopping para pegar um cinema.

Tudo com o tempo muda. As pessoas, os sentimentos e até a natureza, mas tinha uma coisa em mim que não mudava nunca. Sempre que eu estava prestes a encontrá-lo, meu coração sacolejava dentro do meu peito, era como se meu corpo inteiro se estremecesse ao vê-lo se aproximar com um sorriso no rosto.

– Já comprou os ingressos? – disse ele me dando um abraço apertado, sem se importar com as pessoas ao redor.
– Já! Nossa sessão começa daqui a pouco.
– Então vamos comprar um sacão de pipoca e correr pra sala.

O filme parecia ser muito legal, mas os lábios do Christiano estavam bem mais interessantes que a história do filme. Durante o começo do filme, tudo o que fiz foi beijá-lo e depois que meu maxilar pediu descanso nós voltamos a atenção para o filme. Vez ou outra eu parava para observá-lo. Olhava discretamente para o lado e admirava sua beleza sendo iluminada pelo grande telão do cinema. Eu gostava quando ele deixava o cabelo bagunçado daquela forma, com as leves ondas se rebelando umas com as outras, umas caindo sobre a testa e outras jogadas para trás. Seu nariz comprido e fino era tão belo e harmonioso com seu rosto que muitas vezes, ao olhar para seu rosto, eu me lembrava de Narciso. Eu tinha a vaga impressão de que Christiano era uma versão moderna de Narciso. Meus olhos pararam em seu braço repousado no apoio da poltrona e pela milésima vez, desde que o conhecera, eu me senti patético por achar cada pedaço daquele homem atraente. A manga de sua camisa estava dobrada um pouco abaixo do cotovelo, seu antebraço era grosso e com alguns pelos escuros, mas que muitas vezes pareciam loiros quando expostos ao sol. Sua mão de dedos compridos e grossos também me atraia estranhamente, talvez por ser tão bonita e ao mesmo tempo muito masculina... Passei meu braço por baixo do seu e então toquei em sua mão. Entrelacei meus dedos nos seus. Ele virou o rosto lentamente e me olhou nos olhos. Deu um sorriso torto e então voltou a assistir o filme.

...