Décimo Primeiro Capítulo

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Me remexi, desconfortável na cadeira. Arrisquei um olhar para o senhor Montini, mas ele comia calmamente, conversando com tio Lucas. Como se percebesse que era vigiado, virou o olhar pra mim. Abaixei a cabeça instantaneamente. A cena não queria desgrudar de minha cabeça, e meu estômago se embrulhava nervosamente a cada vez que eu lembrava, me fazendo perder a fome. Olhei novamente, ele continuava me olhando, mas abaixou olhar, sorrindo. Eu precisava resolver aquilo, ainda mais se ele residisse nos arredores! Assim que tiraram meu prato quase intocado, minha irmã me cutucou.

- Você está doente, Nina?- olhou preocupada.

- Tirando o pé, estou perfeitamente bem.- falei confusa.

- Algo a incomoda então, você mal tocou na comida. Uma de suas favoritas!- ela disse, alarmada. Só pude rir.

- Calma Analu, você está um pilha!- ela suspirou, concordando.

- Eu sei, temos que conversar mais tarde, sobre... aquilo.- ela falou mais baixo.

- Você vai dormir comigo?- ela assentiu com a cabeça.- Então conversamos na hora de dormir. Também tenho que te contar uma... coisa.- fiz uma careta.

- Oh! Já imagino.- ela soltou um risinho. Acompanhei. Quinzinho se aproximou lentamente e sussurrou. 

- Senhorita, trago um recado para você.- franzi o senho. Ele depositou o pequeno pedaço de papel na minha mão e voltou a sua posição. Só Analu percebeu, pelo visto. Desdobrei o papel e me deparei com uma caligrafia muito bonita.

"Peço perdão pela situação que a expus hoje, senhorita Marina. Espero que me perdoe e que possamos nutrir uma relação amigável, apesar de tudo. Não desejo que fique desconfortável, muito pelo contrário, mas entenderei se me negar. C.M."

Me virei subitamente para Caleb e ele me observava, tenso. Abri um sorriso que ele retribuiu. Minha irmã não foi a única a perceber, afinal. Ele viera me pedir desculpas quando, na verdade, eu é que o devia. Admirei seu gesto e pretendia responder, mas para isso precisava me retirar. Enquanto pensava em uma solução, reparei meu pai me olhando, confuso. Hm, droga. Abri um sorriso tenso, enquanto balançava a perna, nervosamente.

- Nina, como se sente?- minha tia interrompeu os pequenos cochichos, fazendo todos olharem para mim.

- Ahn... Bem, tia. Não dói tanto.- sorri.

- Ah, que ótimo!- ela sorriu, encantadora. Então se virou para o filho mais novo, que estava tristonho na mesa. Sussurrou alguma coisa com ele, que assentiu e depositou aqueles olhinhos em mim. Sorri, o encorajando. Aparentemente minha mãe deve ter explicado a situação para minha tia. Ele levantou do lugar e deu a volta, até parar de frente para mim, olhando para baixo.

- Desculpa Nina, eu não queria te deixar sem roupa. Achei que mamãe tinha esquecido. Não fique brava comigo.- ele esfregou as mãozinhas nos olhos. Aquilo apertou meu coração. Pus um dedo no queixo dele e levantei seu rostinho. Os olhos azuis estavam brilhante de lágrimas.

- Não tem nada do que se desculpar, Bart. Eu esqueço, com uma condição.- seu rosto se animou um pouquinho e um pequeno sorriso se abriu.

- Qual? Eu faço o que você quiser!

- Que me dê um abraço bem apertado!- ele jogou os bracinhos magros em volta do meu pescoço e o apertei em encontro ao meu peito. O espartilho dificultava um pouco, mas me curvei o máximo que consegui. Ele me soltou, com um sorriso largo no rosto.- Ótimo, agora volte e coma sua comida. Não quer ficar sem sobremesa, não é?

- Nem pensar.- ele correu de volta a seu assento e comeu fervorosamente. Parece que Bart na terceira pessoa acabou. Vamos esperar pela próxima. Uma batida na porta chamou a atenção de todos.

- Oh! Deve ser Teodora!- tia Lisa disse contente e o pequeno Bart se animou na cadeira. Ele e Clara, a caçula de tia Teodora, se entendiam desde sempre. Quem sabe aquilo não evoluía? Olhei pra Sam do outro lado da mesa e ele piscou pra mim. Sempre nos víamos em Bart e Clara, já que nunca nos desgrudávamos. Quando crescemos, eu, ele, Analu e Thomas viramos o "quarteto fantástico", como diz minha mãe. Iria ser uma noite agitada, afinal. Mirei uma pessoinha, com os cabelos como fogo, correndo em direção a Bart. Eles começara a conversar e saíram em disparada.

- Clara!- tia Teodora fez uma cara de bronca, mas a essa altura a pequena já estava longe.

- Teodora! Que saudade minha amiga!- tia Lisa se levantou e a abraçou, esquecendo o decoro. Ah, quem liga pra isso quando se encontra alguém que quer muito ver?

- Oh Elisa! O ano que passamos na Austrália foi solitário sem você.- tia Teo choramingou.

- Senti falta de tê-la a duas cercas daqui... Agora, conte-me tudo.- as duas saíram, deixando os Thomas (eu e Sam apelidamos pai e filho assim) na porta.

- Acho que as senhoritas tem assuntos importantes a tratar!- sempre de bom-humor, Thomas pai brincou. Tio Lucas o recebeu animado, junto de meu pai. Olhei para Thomas filho e ele fez um gesto com a cabeça para o jardim. Assenti.

- Analu, se retire e vá para o jardim.- minha irmã assentiu, com um leve sorriso. Percebi uma hesitação enquanto ela corria os olhos pela mesa.- Está tudo bem, minha irmã?

- Mais tarde.- uma expressão aflita tomou conta de seu rosto. O quê foi que ele fez?!

- Tudo bem, vá.- ela assentiu.

- Vou me retirar, com licença.- ela fez uma mesura elegante e caminhou com as costas retas. Ok, aquilo pode esperar mais um pouco. Olhei pra Sam e nem precisei falar nada. Apenas fiz um gesto para o jardim. Ele balbuciou "vá primeiro" antes de voltar sua atenção para a comida.

- Irei ver como minha irmã está, com licença senhores.- arrisquei um olhar para Caleb e ele me olhava atento. Aquilo fez meu coração pular. Respirei fundo e segui para o corredor. Uma passadinha no quarto era o que restava antes dos finalmentes. Andei calmamente até que alguém tampou minha boca e agarrou a muleta. Arregalei os olhos, mas a mão circundou minha cintura facilmente. Comecei a espernear, mas então lembrei dos movimentos que minha mãe tinha me ensinado. Juntei toda a força e chutei as partes dele (com o pé bom, claro.)  Por favor que seja homem. Ouvi um urro e a mão afrouxou. Soltei-me rápido, pegando meu apoio.

- Marina... Porquê você fez isso?- a voz masculina gemeu. Olhei melhor e o homem estava encurvado de dor. Espera. Eu conheço essa voz.

- Thomas? Como você chegou aqui tão rápido?!- fui a seu encontro, tentando ajudar.

- Pelos fundos.- sua voz abafada me fez rir.- Pode rir, eu deixo.

- Desculpe-me, mas você não deveria atacar uma Clarke assim.

- Irei me lembrar disso.- com um tanto de esforço ele se apoiou as mãos nos joelhos, com cara de dor. Pressionei os lábios, prendendo o riso.

- Porque fez isso?- perguntei, pressionando os lábios, evitando sorrir.

- Eu estava... brincando.- falou, som as mãos nas... bem, partes.

- Como passou de viagem?- indaguei, mudando de assunto.

- Nunca vi beleza igual! Esperarei pra contar os detalhes mais tarde.- Thomas olhou pra mim com o olhar. Afirmei com a cabeça.

- Vá na frente. Vou me aprumar.- Thomas concordou e andou ainda um pouco encurvado. Dei um risadinha. Depois de exatos 120 segundos, passei as mãos ajeitando os gomos da saia e me pus a caminho do corredor. Parei por um breve instante em frente ao largo espelho, quando vi uma sombra no final do corredor.

AguardadaOnde histórias criam vida. Descubra agora