Eu sonhava em ver a Torre Eiffel, mas pegamos o metrô e fomos parar em
Kremlin-Bicêtre, no subúrbio da cidade. Eu imaginava exotismo e me vi rodeada de
árabes.
– A França é isso? – perguntei a meu pai enquanto íamos ao encontro de um de
seus amigos em um restaurante de uma rede especializada em frango halal. Fiquei
decepcionada. Fazia um frio polar, meu nariz e meus pés estavam congelados, tudo
me parecia péssimo.
– Amanhã tudo vai melhorar – disse papai, tentando me animar.
Passamos a noite em um pequeno hotel próximo à estação Porte d'Italie, de
onde se via o anel viário da cidade. E acordei sentindo falta de cigarro, que logo se
tornou uma obsessão.
Tínhamos um encontro marcado com seu amigo Habib e fomos esperar em um
café ali perto. Garotas fumavam no terraço, descontraídas, normais. Aquilo me
encheu de esperança. Não se tratava de um defeito nem de uma imoralidade,
como queriam me fazer crer. Pedi um chocolate quente, papai um café e, antes que
o pedido viesse, saiu para fumar. Ele não aceitaria que eu o acompanhasse, então
fui ao banheiro fumar um Marlboro, que trouxera escondido. Habib chegou e nos
convidou para ir à casa dele, perto da estação Porte de Choisy. Foi então que
mamãe telefonou. Soddeik, o motorista de Bab al-Azizia, passara em nossa casa
em Trípoli.
– Onde está Soraya? Por que não atende o telefone?
– Porque ela está em Sirte – lhe responderam.
Ele se contentou com a resposta, mas mamãe estava muito inquieta, e meu pai
começou a tremer. Estava pálido, em estado de choque. Excesso de emoções. Teve
um colapso nervoso na frente de Habib. Levaram-no ao hospital. Ele saiu no meio
da noite, decidido a voltar a Trípoli imediatamente. Deixou comigo mil euros, o que
me pareceu uma fortuna, um cartão de telefone e pediu a Habib que me alugasse
uma quitinete. Então, os dois se dirigiram ao aeroporto. Abatido e ansioso, ele não
me abraçou, apenas acenou discretamente.
– Se Deus me der saúde – eu sabia o que ele estava pensando: Se não me
matarem –, eu lhe envio mais dinheiro.
Chorei ao lhe dizer adeus.
Habib me arranjou um quarto em um hotel próximo à estação Porte de Choisy.
Eu não estava no coração de Paris, mas não era assim tão mau. A recepcionista era
marroquina, pudemos conversar em árabe. E logo aprendi a me virar nos trajetos
de ônibus e de metrô. Um primeiro teste de orientação me levou ao Quartier Latin,
perto da estação Saint Michel, onde tomei um café olhando as pessoas passarem.
Eu era livre. Livre! Era algo que repetia a mim mesma, sem acreditar. Não tinha
nenhum plano nem o menor projeto que fosse. Sem amigos, sem relações. Mas eu
era livre. E isso era atordoante.
Na mesa ao lado, duas moças e um homem de origem árabe iam badalar, tarde
da noite, em uma boate. Eu ouvia, num misto de inveja e fascínio. Mordia-me de
vontade de abordá-los. Não tive coragem. A cidade, a um só tempo elegante e
despreocupada, me intimidava. Voltei para o hotel.
Na manhã seguinte, tomei o metrô para a estação Champs-Elysées. Sonhava
com aquilo desde criança. O céu estava claro, a avenida era ainda mais larga do
que eu imaginara, e o café Le Deauville ficava exatamente no local que minha mãe
indicara. Telefonei para ela.
– O Le Deauville é sempre azul! – Eu sabia que com isso tocava seu ponto
fraco.
– Você vê como a história se repete? Minha filha anda pelos mesmos lugares
dos meus vinte anos... Como eu gostaria de estar aí com você, Soraya!
Fui à Sephora, tinha ouvido Mabruka falar que comprava ali. Na seção de
perfumes, testei tudo que podia, sob o olhar desconfiado dos seguranças. Uma
atendente tentou me vender um vidro do perfume Paris, de Yves Saint Laurent,
mas eu tinha de fazer minhas contas. Vejamos: eu tinha mil euros; o hotel saía
vinte e cinco euros ao dia; mais vinte e cinco eu gastava com comida e transporte.
O dinheiro daria para vinte dias. Adeus, perfume. Quanto aos corredores de
maquiagem, que me enchiam de vontade, dei as costas. Ficariam para depois. Eu
percorreria um por um, tinha todo o tempo do mundo.
Ao passar por um casal de namorados que se abraçava livremente, pensei em
Hicham. Eu me segurava para não ligar para ele. Para quê? Eu não passava de uma
fonte de preocupações. Mas logo fui comprar créditos para o celular. Quando ouvi
sua voz, comecei a chorar.
– Faz dois dias que você foi embora – disse ele. – Dois dias que penso em você
o tempo todo! Vou te encontrar assim que puder. Já estou vendo para tirar o
passaporte.
Aquilo era sério? Ele queria viver perto de mim? Meu Deus! Eu não via a hora.
Ele tinha de acelerar o processo, conseguir o famigerado passaporte, objeto tão
raro e precioso na Líbia. Mas com dinheiro tudo era possível. Telefonei rapidamente
para papai.
– Você me deixou só mil euros! É muito pouco! Como quer que eu me vire
aqui?
No dia seguinte, ele me transferiu dois mil euros, dos quais repassei metade a
Hicham.
Foi então que fiz uma série de contatos que, pensando hoje, levaram minha
estada na França ao completo fracasso. É horrível ter de reconhecer isso. Como é
humilhante ter de admitir que deixei minha chance escapar. Como foi possível?
Creio ter confiado nas pessoas erradas. Fiz escolhas ruins. Fui de uma ingenuidade
lamentável. Mas convenhamos... Cheguei a Paris em fevereiro de 2009, faltando
alguns dias para completar vinte anos, e não conhecia nada. Exceto a veleidade, a
perversidade e o cinismo do mundinho que me sequestrara. Nada da vida que
envolvesse trabalho, relações em sociedade, gestão de tempo e dinheiro,
relacionamentos equilibrados entre homens e mulheres. E nada do ritmo do
mundo. Jamais havia lido um jornal...
Eu estava sentada em um banco na Champs-Elysées quando uma jovem loira
chegou perto de mim.
– Olá. Tem lugar pra mim?
– Claro. Como se chama?
– Warda.
– É um nome árabe!
Ela era de origem argelina, e rapidamente nos simpatizamos.
– Ah, logo vi que você acabou de chegar a Paris. De onde você é?
– Adivinha.
– Marrocos?
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No Harém De Kadafi
Misterio / SuspensoA história real de uma das jovens presas do ditador da Líbia.