5: thunderstruck

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"Minha mente agiu e eu pensei, o que posso fazer? E descobri que estava sem ajuda sem sua ajuda."
AC/DC - Thunderstruck



Durante a minha vida eu tive muitos amigos, mas acho que talvez Gonzalo seja o mais próximo por agora.
Além de trabalharmos no mesmo clube, ele também joga pela Argentina, o que nos aproxima ainda mais e dá a ele a liberdade de opinar na minha vida sem ter a arrogância como resposta.

Neste momento está jogado na cama ao lado da minha, arrumando uma forma de acabar com o meu luto. - Eu acho que você precisa virar uns bons shots -diz meu companheiro de equipe enquanto analisa um novo hematoma em sua mão. - Bem, se isolar do resto da equipe não vai mudar muita coisa. O tempo não volta e as coisas não vão mudar.

Talvez ele estivesse certo. Ou talvez não.
Talvez o luto esteja acabando comigo, ou quem sabe... Costumo não me dar bem com meio-termos, e a palavra "talvez" se encaixa neste padrão.

Eu estou aqui. Estou bem. Estou vivo. Ou nem tão vivo quanto penso que estou, mas vou tentando levar.

Hoje tinha mesmo tudo para ser um dia importante. Meu primeiro jogo como titular na seleção Argentina, e uma vitória em uma das maiores seleções do mundo. Brasil. Nossa maior rivalidade na América.
Eu deveria estar festejando por aí. Bebendo ou cometendo besteiras como os outros caras da equipe.
Mas, por que peguei meu telefone para ligar para Antonella mesmo sabendo que ela não vai atender? Ela está morta, Paulo. Você tem de entender que ela não vai voltar mais e agora você sozinho.
Fracassadamente sozinho.

Sinto que estou apenas existindo. Ou tentando em meio ao mar de amargura que me encontro. Não tenho sequer fôlego para aguentar o olhar de pena das pessoas. Me sinto... Impotente. Fraco.

- Não quero te forçar -Higuaín continua - Mas você tem de voltar a viver, irmão. Você tem um futuro pela frente e eu sei que ela ia querer isso.

Balanço a cabeça.

- Alguns shots, nada mais?

Ele ri. - Nada mais.

No mesmo tempo em que quero ir com Higuaín, não quero passar a impressão que estou foda-se para Antonella. Eu a amava, disso ninguém tinha dúvidas, apenas não consegui ir a seu enterro e as pessoas estavam a comentar sobre isso.
Pensei que se não a visse naquela caixa amadeirada, nada daquilo seria real. Acho que errei em não o fazer.

Porém, agora é tarde para arrependimentos e me trancafiar num quarto só me trará lembranças, e, estou cansado de chorar. Tenho de tomar o primeiro passo. Por ela. E por mim mesmo.


"Hey Gonzalo" uma loura de seios avantajados grita para o jogador a meu lado quando chegamos no camarote da boate.

Fiz questão de vir o mais simples que pude, mas acho que não há como passarmos despercebidos a olhares sendo quem somos em nossos clubes.

Disfarço o momento de Gonzalo, e avisto jogadores da Argentina bebendo num canto. Decido ir até eles.

"O coelho saíste da toca!" Lucas Pratto salta do pequeno sofá e envolve seu braço por meu ombro, apontando para a pista onde decotes semi-nus dançam - Basta escolher e ponto. Assim funciona o futebol. Elas abrem as pernas num estalar de dedos só por você estar na seleção.

Reviro os olhos. Ele está um pouco embriagado. Talvez muito.

"Lucas!" A sonoridade da voz de Higuaín é gélida. Um mandante. Dentro e fora de campo. "Deixe-o em paz."

KATRINA | DYBALA ✨ Onde histórias criam vida. Descubra agora