Capitulo 35 - Verdades

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Logo no segundo trimestre da faculdade, as coisas começaram a ficar um pouco mais apertadas depois que Cam resolveu se mudar para um loft com o seu namorado.
Nós duas dividimos todas as despesas do alojamento durante um tempo, e apesar de sufocante as vezes para os meus pais, dava certo.

- Eu queria mesmo pôder te levar, amiga. -ela disse, juntando as suas roupas numa mala. - Mas Bruce acha que não teremos privacidade com aquelas coisas... Ã...Você sabe.

Balanço a cabeça, dando um sorriso confortador para ela. No fundo eu estava completamente desesperada mas não queria que ela se sentisse culpada com aquilo.
Ela não podia desistir do que queria por minha causa, e eu gostava demais de Cam para ficar com raiva da única amizade verdadeira que tive.

Após a saída dela do apartamento, eu peguei um pouco de dinheiro que sobrou das xerox pra faculdade e fiz diversos cartazes em busca de um colega de quarto para me ajudar a dividir as despesas. Eu não conseguiria sozinha. Não com o dinheiro que meus pais me mandavam.

O primeiro interessado foi um rapaz de olhos negros e cabelo louro do quinto ano de Medicina. Eu devia ter desconfiado de sua simpatia e pressa em se mudar para o ap. No fim, descobri um completo cafajeste quando tentou me beijar enquanto estavamos saindo da sorveteria que marcamos a entrevista. "Vai ser bom dividir a casa com uma garota tão linda" ele disse.

Não. Não mesmo!

Em meio aos dias passados, os meus pais começaram a perguntar sobre Cameron durante as chamadas de vídeo que fazíamos no Skype. Eu sempre dizia que ela estava ocupada com as tarefas ou que tinha saído com o seu namorado. Você parece um pouco cansada. Diz a minha mãe, com seu tom levemente preocupado. Eu sabia que precisava contar a eles que tudo havia mudado agora, só, não tinha coragem para fazer isso.
O pouco de dinheiro que o meu pai guardou para a minha faculdade era tudo o que tinha, como eu poderia pedir mais de um simples farmacêutico?

A segunda garota interessada no quarto era uma musicista clássica que admitiu passar toda a parte do seu tempo ensaiando e que foi por isso que a sua colega de quarto a expulsou. Lembrei rapidamente de A Filha do Presidente e da aluna maluca que tocava saxofone o dia inteiro.

Não.

A terceira e última entrevista foi marcada num café, próximo a universidade. Giovan Piero era o nome do rapaz, e na ligação ele disse ser um recém chegado transferido de Roma.
Quando a última aula do dia terminou, eu juntei todo o meu material e comecei a ir em direção ao café para conhecer o meu colega de quarto. Simpático demais e inteligente demais... Aquela ligação talvez tivesse me indicado muito sobre o rapaz, mas eu precisaria conhecê-lo para formar uma opinião, por quê não podia colocar qualquer um no lugar onde eu durmo.
Mas enquanto eu estava caminhando pela via Giuseppe Verdi, o meu telefone tocou, antes mesmo de eu chegar na cafeteria, e junto com aquela ligação vinda do Chile, estava o pior dia da minha vida.

- Os seus pais, Kat... -a Caline disse dando pequenos suspiros. Eu poderia sentir o seu desespero a quilômetros e fiquei trêmula antes mesmo que completasse - Eles estavam indo embora da casa da vovó e um rapaz bêbado atravessou o sinal... O tio Cláudio tentou desviar, ele tentou, mas...Eu sinto muito, Kat!

Fechei os olhos, desejando que aquilo fosse uma piada de mau-gosto, e quando percebi que não era, desejei loucamente que um carro invadisse a calçada e me pegasse ali também.
Meu corpo começou a chamuscar em pequenas faíscas, cargas elétricas de devastação sendo distribuído por cada veia e nervo e a minha respiração ficou tão lenta quanto uma tartaruga recém nascida. Tudo sumiu por um instante, ficando como um pequeno borrão não-identificável.
Sentei-me no chão da calçada, com a minha mochila do lado e a cabeça entre as pernas, desolada.

"Nós iremos visitar você no Natal" o papai disse na ligação de ontem. "A sua mãe está tecendo cachecóis e meias e luvas feito uma desesperada. Você pode dizer para Martina que a Itália não é como a Sibéria?"

Ela resmungou algo ao fundo e eu apenas sorri, sentindo uma saudade fora do comum dos meus criadores.
Nem mesmo tinha ideia que aquela seria a última vez, e, eu queria ter tido mais tempo para me despedir. Queria que o professor Tixan não tivesse passado tarefas extracurriculares para aquela noite para que eu ao menos tivesse a chance de ficar mais tempo com eles naquela ligação.

Foi tudo muito rápido. O pouco de dinheiro que eu tinha estava guardado para a próxima mensalidade da Universidade, e, eu tive de brigar com a escolha de comprar uma passagem para o Chile e desistir de tudo isso, ou, seguir em frente e realizar o sonho de meu pai.
Escolhi seguir o sonho dele, e, não pude vê-los por uma última vez no enterro. A vovó disse que não tinha problema por que eu estava realizando o sonho dele e não deveria deixar as coisas difíceis me fazer desistir, então eu fiz. Segui o seu conselho e pouco mais de dois meses depois, caminhando por uma das ruas levemente gélidas de Torino eu entrei num bar stripper para uma tentativa de pesquisa para o meu TCC, e acabei saindo de lá com um bico de atendente do bar.
Uma das garotas, Cassandra, chamou o seu superior e contou para ele os problemas que eu havia revelado para ela. Á princípio, fiquei com um pequeno receio pelo lugar, mas o gerente, Mike, me disse que não é por que ali era um bar stripper que eu seria desrespeitada.
Eu acreditei, mas, acabei por adotar um pequeno pseudônimo para não prejudicar a minha imagem com a faculdade. Eu estava desesperada demais com as contas acumuladas e não havia uma empresa sequer querendo mais um estagiário.
Aquele foi o único jeito de me manter durante uns meses, e, apesar de ser cantada por uns caras as vezes, Mike O'donel esteve certo sobre eu ser respeitada naquele lugar. Não era muito, mas me ajudou muito.

Meses mais tarde, numa ida ao supermercado para repor o estoque do pequeno apartamento, eu dei de cara com um cartaz num carro dizendo sobre aluguéis de quartos numa pensão não muito distante dali.
Agarrei o meu telemóvel e liguei para o número que constava no papel, logo sendo atendida por uma dócil senhora que marcou uma visita para que eu conhecesse o lugar, e, na primeira vez que eu pus os pés naquela casa aconchegante, soube que era ali que eu queria ficar.

No último período da faculdade, a Cameron entrou em contato comigo para me dizer que havia arrumado um emprego na SporTV e, que, eu deveria tentar uma entrevista lá.
Foi o que eu fiz, e, surpreendentemente consegui. Quando recebi a ligação depois de alguns dias, o Michael entendeu que aquele era o meu sonho e me encorajou a ir.
Foi onde tudo, pela primeira vez, começou a dar certo na minha vida. E deu, durante alguns anos.

Até Paulo Dybala entrar na minha vida, e, consequentemente descobrir sobre essa parte. Essa pequena parte que eu tentei esconder de todos por vergonha de que as suas generalizações me transformassem numa prostituta.
Mas aconteceu o que eu esperava. Ele descobriu e agora me ideia por isso.

KATRINA | DYBALA ✨ Onde histórias criam vida. Descubra agora