Acordei incomodada. Um barulho de zíper sendo aberto, cheiro de café, luz vindo de algum lugar e contemplando o meu rosto que só desejava a escuridão no momento. Derrotada, esfreguei os olhos e me sentei lentamente.
Quando pude observar melhor, me deparei com Mia vestindo uma calça jeans qualquer, uma blusa encardida e um blazer cheio de marcas escuras desagradáveis. Sério, meus olhos ardiam com aquilo. Mesmo não sendo feia em absoluto, era tão estranho como desnecessário uma pessoa se vestir tão mal.
— Bom dia. — cumprimentei, tentando ser educada. Kiara ainda estava deitada em cima de mim, então a movimentei cuidadosamente para o chão sem que a acordasse. Não deu certo. A gata saiu apressada para perto da dona.
Mia me fitou por alguns segundos e assentiu. Eu não sei se aquilo era retribuir o meu "bom dia", mas de cara era percebível que não era de falar muito.
— Você ouviu o quanto ela miou de noite? — comentei, puxando assunto.
— Não. — respondeu Mia, calçando um tênis que desviei o olhar para não ter espasmos lembrando de sua falta de ética à moda.
— Sério? Foi bem alto.
— Eu tenho o sono pesado. — respondeu, indo em direção à cozinha. Trouxe uma xícara consigo e me ofereceu. Era café com leite. Aceitei de bom grado, mesmo tendo certos problemas com café.
Mia se sentou em cima da mesinha de madeira e, como antes: séria, inexpressiva e braços cruzados.
— Por que fugiu?
— Bom... Sabe... meu pai quer que eu faça faculdade de economia. Mas de jeito nenhum... — comecei, sem saber como explicar corretamente.
— Você fugiu de casa porque não quer fazer faculdade? — questionou confusa.
— Não, eu quero! Mas não disso, ué...
— E sua mãe?
Travei. A palavra "mãe" me causava desgosto. Olha, sendo direta... É horrível confiar, se espelhar, amar uma pessoa e ela te decepcionar. Não tem sensação pior. Descobri meu defeito de confiar com facilidade nas pessoas desde então. Certo, no caso, era a minha mãe, mas...
Veja bem. Mal conheço esta mulher, Mia, e confio nela apenas por ter me ajudado uma única vez. Isso é muito errado. O bom é que, pelo menos, reconheço isso.
— Não tenho contato com ela há alguns anos. — respondi, não querendo me aprofundar. Mia me fitou com cautela. Aquele olhar realmente causava calafrios. Era muito estranho. Ela não parecia ser tão velha, mas seu olhar passava essa sensação. A sensação de uma pessoa muito "experiente" te examinando e pontuando todos seus erros mais discretos. Eu só consigo recordar da minha vó me olhando desse jeito.
— Somos obrigados a aceitar e conviver com o que os pais impõem mesmo sem concordância. É o que faz de nós filhos. — argumentou, levantando-se.
— Mas não quero viver aceitando tudo que meu pai acha ser o certo. — respondi indignada.
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Oculta
RomanceBethany tem uma ótima vida superficialmente. Mas, como qualquer pessoa, tem pequenas partes ocultadas em seu interior. Em um momento oportuno de ousadia, ela foge de tudo que a aborrece, tenta seguir com uma nova vida e, claro, sem preparo algum, ac...