Capítulo 20 - Sua Vez

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Acordei com a cabeça latejando. Mas não incomodava tanto. Não tanto quanto a possibilidade de sonhar.

Felizmente, quando eu bebia, acabava não tendo pesadelo algum. Admito, na época em que descobri isso, tornei-me uma completa alcoólatra ao anoitecer.

Porém, por ser muito nova, prejudicou bastante o meu organismo. Quase fui remanejada ao orfanato novamente. Mas fiz um acordo com os meus responsáveis anteriores e me contive com severidade. Era ter os malditos pesadelos, dormir mal ou entrar em coma e depois em um processo de reabilitação. Preferi a primeira opção. No fim, tornei-me um pouco vulnerável a bebidas alcoólicas após este episódio. Bebo uma vez ou outra em casa, mas sempre sozinha.

É engraçado. A vida lhe dá mais problemas mesmo ciente que você está em uma situação desprezível. Mas, mesmo naquele tempo, eu estava acostumada com isso.

Encarei o teto do meu quarto. Algo envolvia o meu corpo e não era só um cobertor. Havia uma leve e intermediada respiração próxima ao meu ouvido. Isso me deixou mais relaxada a ponto de querer dormir outra vez.

Virei o rosto e visualizei seus cabelos loiros esvoaçados e espalhados pelo rosto e travesseiro. O quarto estava escuro, pois como as paredes, a janela também é coberta pelo isolamento acústico, sendo assim a única iluminação vinha da porta, que pousava mais sobre Bethany do que em mim.

Até a luz sabia disso: que ela era mais iluminada, mais viva do que eu. E eu não discordava. Era pura verdade. Tão pura quanto ela.

Pousei uma mão em sua bochecha exposta. Sua pele era como algodão. Fofa, macia. E muito clara. Tão clara, tão pálida... Qualquer área ficava avermelhada se eu pressionasse meus dedos por um momento. Era provocante. Eu gosto deste aspecto.

Fiquei acariciando seu rosto por um tempo. Depois subi a palma até a lateral de sua cabeça, seguindo até o cabelo e comecei a alisá-lo lentamente.

Notei que seu nariz era meio arrebitado. Era fino também, e não só pela estrutura, mas também pela elegância. Lembrava-me um pouco sua mãe.

Às vezes, eu as comparava. E às vezes parecia conhecer uma pessoa só ao contrário de duas.

Denise e Bethany eram extremamente parecidas em muitos aspectos. Era até perturbador o quanto suas personalidades e aparências podiam ser semelhantes.

Imagino se pareço com a minha mãe também. Mas, inconscientemente, certifico de não ser. Mas como? Não tive tempo suficiente para conhecê-la de verdade.

E se eu for exatamente igual a ela, como Bethany e sua mãe são? Realmente não sei. E não me alegra imaginar.

Bethany ainda dormia sem dar indícios de que acordaria. Acho que ter este tipo de sono é um de meus maiores sonhos.

Que irônico, não?

Voltei a minha atenção à sua mandíbula. Deslizei meus dedos por esta e Bethany finalmente remexeu-se e resmungou, mas não pareceu acordar. Dali, desci ao seu pescoço, vendo-a resmungar de novo. Ousei-me então e alisei um lado de sua clavícula. Desta vez, Bethany se mexeu com certa preguiça e seu braço que me rodeava comprimiu um pouco, fazendo-me ficar mais próxima.

Sinto exalar um alto poder de toque em Bethany. É como se fosse submissa a ele.

E, infelizmente, isso me relembra certos ensinamentos.

Engoli em seco. Não.

Nunca.

Isso não é amor. É maldade. É cruel. Nunca, de maneira alguma, serei um pingo disso com Bethany.

Ela merece tudo. Ela merece ter todo prazer.

Imagino que o maior prazer é dado com amor. E se quero proporcionar isso a ela...

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