33 | Dor

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EVELYN

Dor. Sinto-a consumir-me do exterior para o interior. O conhecimento magoa, destrói. Preferi viajar para o outro lado do mundo, certa que tudo iria mudar, mas a vida trai-nos, esfaqueia-nos pelas costas, bem profundo. Jurei nunca mais voltar. Mas o percurso, feito a mais de novecentos quilómetros por hora, deixa-me cada vez mais perto de encarar a destruição.

Saber que o perdia a cada minuto que passava deixara-me apática. Não sinto, mas sinto que sinto demais. É surreal.

Não conseguira ainda encarar Noah, adormecido durante praticamente todo o trajeto onde todos os continentes do planeta foram ultrapassados a velocidades alucinantes. Desconfio que ele não conseguira dormir durante a única noite passada lá em casa sabidos tais acontecimentos. O medo de ele me achar falhada era maior do que a minha procura pelo meu bem.

A minha progenitora seguia no banco da frente, muito sossegada, e o arrependimento de ter sido tão rígida para ela a tomar conta de mim. Não a encarei da melhor forma, quando me contou do atentado solitário na nossa cidade não consegui pedir-lhe desculpa, não consegui dizer-lhe que a amo e que não a quero perder.

Tenho medo. As minhas mãos tremem desde o primeiro segundo em que entrara neste avião. As colunas do mesmo avisam a aterragem no aeroporto de Sydney. Não quero sair.

Nesse momento Noah acordara, e depois de toda a turbulência passar, pude respirar fundo, sendo a última a sair quando o meu marido e a sua sogra pegaram nas suas malas e seguiram em frente.

Eu já não comandava no meu corpo fazia muitas horas. O centro de controlo estava a conduzir-me à insanidade, pelo simples facto das minhas unhas arranharem o meu próprio braço com força quando as lágrimas queriam denunciar o meu sofrimento. Se me mantinha quieta, todo o meu corpo tremia, e não só do frio. Estava a sofrer reações nervosas demasiado intensas.

– Eve – eu ouvi-a a sua voz, mais baixa que todas as outras vezes, o que me levou a encarar os seus olhos. – Vem, amor – e ele guiou-me por entre o escuro da madrugada deste continente novo para ele.

– Mathias, Maria – ouvi um leve sussurro da mulher e logo um longo abraço tomou conta dos três. – Este é o Noah, companheiro da minha Evelyn –

– Um prazer conhecer-te – eu continuava meio escondida atrás do moreno, pelo que apenas depois de se conheceram deram pela minha presença.

A minha tia correu até mim e abraçou-me. Sentia tanta a falta da minha melhor amiga. – Estás bem, princesa? – pergunta, depois de me encarar, ao qual eu respondi com um assentir leve. O irmão mais novo da minha mãe embrulhou os seus braços à volta de ambas afirmando que sentia imensas saudades minhas.

As palavras trocadas foram poucas. Entrámos no carro e a viagem de meia hora de volta para casa fora feita em silêncio. O casal trocava algumas frases entre si sobre o dia de amanhã.

Três da manhã. Noah trocava mensagens com os pais assegurando estar tudo bem por aqui.

Chegados à vivenda, as luzes estavam acesas e vi uma senhora alta com uma bebé ao colo. Reconheci Hailey e quis chorar. Como é que eu a pude deixar assim...? Com o aproximar e a claridade a senhora ruiva desconhecida tornara-se numa cara bastante conhecida – a única irmã do meu pai.

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