07 | Cuidar

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EVELYN

            Depois de Noah se ter acalmado, seguimos de regresso ao interior da casa. Com um olhar vazio e triste, ele sentiu-se incapaz de comer algo. Receio que pela sua cabeça estejam a passar pensamentos que o atingem como facadas; todos os anos que pensou ser amado tornaram-se numa mentira, os momentos que passou com repugnante pessoa, que, saliento, ter um horrível carácter, ao pensar que enganaria de novo Noah. Pressinto que ele está a martirizar-se interiormente.

Ocupei um lugar na cozinha, não sabendo ao certo o que fazer para o meu pequeno almoço, já que nunca soube cozinhar suficientemente bem. Peguei então em algumas taças, procurando algo que possa fazer de forma bastante fácil. Recordo-me do momento em que a minha mãe me ensinou a fazer crepes; uma forma bastante mais achatada do que as panquecas usuais. Peguei em alguns ovos, bem como em farinha e leite. Era uma receita simples e que alimentava imenso. Fiz o preparado e pré aqueci uma frigideira, colocando uma gota de óleo para que não ficasse com o pequeno-almoço pegado na cerâmica.

O que estás a preparar? – pergunta o moreno, aproximando-se da sua cozinha.

– Nada de especial – abanei os meus ombros, colocando a primeira colherada de massa sobre a frigideira.

– Precisas de ajuda? – volta a questionar-me. Eu nego, mexendo cuidadosamente para que não se queime. – Eu estou um pouco indisposto, não contes comigo – anui perante as suas afirmações.

Noah voltou a ocupar o seu lugar no sofá da sala, deitando-se sobre este. A minha tosse chamou a sua atenção, mas não voltara a mover o seu corpo, permanecendo com o mesmo olhar só e vazio de antes. Após ter algumas crepes sobre um prato, procurei algo com que pudesse comer como acompanhante, encontrando um frasco com chocolate e um sumo de algumas frutas.

A campainha voltara a tocar naquela manhã, deixando-me apreensiva sobre quem seria. Encaminhei-me até ela, e quando a abri esta revelou Sr. Porter com algumas cartas na sua mão e dois senhores atrás de si, que se mostraram surpresos quando me viram ali. As minhas bochechas ganharam, automaticamente, uma cor vermelha intensa; o sangue a fluir a altas velocidades.

– O menino Noah encontra-se em casa? – assenti. – Tenho estas cartas para ele, e os seus pais querem vê-lo – eu deixei-os passar; não tinha autoridade suficiente para os deter, afinal de contas, aquela não era a minha casa.

Pousei as cartas sobre a mesa, e deixando a família em privado, dirigi-me de novo à cozinha para arrumar o que havia colocado fora de sítio. Um símbolo australiano captou a minha atenção, e eu parei imediatamente as minhas tarefas. Consegui aperceber-me que se tratava do símbolo do governo australiano, de um dos seus departamentos, concretamente. A minha curiosidade era maior do que qualquer contenção em abrir aquela carta, então assim o fiz. O nome de Noah estava na carta, igualmente como o meu e alguns dos meus números de identificação como cidadã australiana. Na folha branca notificava-se o moreno para que um anexo, que também ali estava, fosse assinado por mim, para que o mais rápido possível fossem emitidos os meus documentos e enviados para esta morada.

Não consegui evitar se não ficar com lágrimas nos olhos; eu nunca deveria ter saído da minha cidade natal. Nada disto teria acontecido e agora não estaria a viver na casa de um desconhecido que me acolheu por piedade. Quis imediatamente telefonar aos meus pais, dizer-lhes que estavam certos, mas não tinha comigo o meu telemóvel, nem o número deles. A única coisa que eu sabia era a minha antiga morada. Tinha saudades da minha mãe, sempre ternurenta para comigo, e o meu pai, que apesar de rezingão, sempre foi um bom pai para a sua única filha. Ele foi rígido nas suas últimas palavras dirigidas a mim, e eu não o podia censurar agora.

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