09 | Desconhecido

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EVELYN

            Umas semanas haviam decorrido e a minha vida permanecia monótona. Noah ia e regressava do seu trabalho, jantávamos, e eu dirigia-me para o quarto em silêncio. Não queria causar qualquer incómodo ao moreno, por essas mesmas razões me tenho encontrado tão pouco com ele.

Fazia alguns dias que toda a minha documentação legal chegara aqui, precisamente para esta morada, juntamente com uma carta de ambos os meus progenitores, a qual não havia tido coragem de terminar. Sei que se trata de um pedido de desculpas por parte da minha mãe e um «eu bem te avisei» do meu pai.

As minhas pernas estavam cruzadas sob a colcha da cama. Os meus olhos não se desviavam nem um minuto do livro que lia. Estava quase no final desta emocionante história acerca de dois amantes que foram impedidos de se amarem pelas suas famílias. Tento colocar-me em ambas as situações, e não sei se aguentaria tanto quanto a vida que lhes concedeu o seu escritor. Ouço algum barulho vindo do andar de baixo, mas não me preocupo em descer, pois sei que é Noah e este passa diretamente para o seu escritório.

A minha vida não tem sido nada mais do que fazer umas limpezas aqui e ali, e dormir, embalada pelo som da chuva e do vento invernal. Estávamos no pico desta estação, e tenho de agradecer ao rapaz por ter sido tão gentil em oferecer-me uma roupa tão variada e quente, para que não pudesse voltar a agravar a doença que havia sido totalmente ultrapassada à muito pouco tempo.

– Posso? – ouço a sua voz, do outro lado da madeira e concedo-lhe passagem. – Trago algumas novidades! – Noah chega perto de mim, e sentando-se ao meu lado, pousa o pequeno computador portátil à minha frente.

– Como correu o teu dia? – pergunto, antes de tudo.

– Foi muito aborrecido. Mais de seis horas encerrado numa sala a ouvir propostas de potenciais clientes. – descreve, suspirando. – Mas adiante, recebi alguns telefonemas. – ele clica numa janela de uma página de internet e eu reconheço de imediato o logotipo. – Eles reabriram algumas vagas para serem preenchidas até ao final desta semana. Penso que não se distancia muito daquilo que ambicionas – mostra-me as várias cadeiras que teriam de estudar, e apenas o nome de algumas me faz convencer a tentar a minha sorte; última oportunidade. – Foi mesmo há pouco que foram lançadas, tens de te inscrever rápido! – ele apressa-me, com um sorriso na face.

Demoro alguns minutos a preencher a minha candidatura e envio os meus pequenos projetos para que possam ter uma maior perspetiva sobre o meu trabalho. O curso em que me pretendo candidatar está relacionado com as artes gráficas, mas contém a arte da fotografia inserida. O estágio será feito num estúdio de sessões fotográficos com um projeto escolhido pelo estagiário. Este plano interessou-me bastante, e restava-me 1% de esperança em conseguir este lugar. Apenas estavam abertas quinze cagas, o que era extremamente difícil de não preencher em algumas horas.

– Espero que consigas! – reconforta-me, e deposita um beijo sobre a minha bochecha. Sorrio, sem jeito. Ele tem-me tratado como um verdadeiro ser humano, com demasiado carinho à mistura, apesar do afastamento ser constante, o que não contraria a nossa relação de amizade, que se tem tornado cada vez mais forte. – Agora é a vez de te informar que o caso de polícia no qual tu foste, implicitamente, envolvida irá seguir para tribunal, e tu terás de testemunhar contra os ladrões. Estás preparada para tudo isso? –

– Que mais poderei eu fazer? Não tenho qualquer outra opção... – falo, cabisbaixa. Recordar-me daquele momento ainda fazia o meu cérebro entrar em conflito emocional, mas tenho reestabelecido as ligações cada vez mais; e sei que, apesar de tudo, quero ser alguém que não cai com apenas um empurrão.

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