Editado: 22/3/2021 às 14h54
Festinha de criança, por mais simples que seja, acaba com a gente. Túlio parecia especialmente exausto, apoiou os cotovelos sobre os joelhos e passou os dedos pelos cabelos levando a fixação do gel embora. Ajoelhei-me na cama atrás dele, abracei suas costas e beijei as pintinhas que cobriam seus ombros.
- Parabéns! - sussurrei.
- Pelo quê? - perguntou cansado.
- Faz cinco anos que você é pai - lembrei.
- Cinco anos... - murmurou Túlio.
Foi difícil fazer Andrew dormir hoje, ele estava extasiado demais com os acontecimentos de hoje. Como se a festa já não fosse motivo de alegria suficiente, o príncipe ganhou brinquedos de toda a família e quis brincar com todos antes de dormir.
- Parece que foi ontem que ele nasceu. - disse ele enquanto eu me mantinha abraçada ao seu corpo - Eu lembro do som do choro, de cada expressão que fazia quando ainda bebê. Lembro dos primeiros dentinhos, dos primeiros sorrisos, do que o fazia rir... De quando começou a engatinhar por esses corredores, de quando tentou descer as escadas e ganhou alguns pontos na testa. - riu - Tudo sobre ele me assustava, Andrew foi minha maior zona de perigo.
- Você assistiu o parto? - interroguei.
- Não, - negou com a cabeça - ela não me queria por perto. - tocou minhas mãos em seus ombros - Ele era tão lindo, tão lindo... - falou com tanta devoção - Parecia mais com meu pai do que eu mesmo já pareci um dia, até aquela pintinha do queixo é herança dele. Andrew transformou minha vida para sempre.
- Ainda bem que você o tinha, seria muito mais difícil encarar a perda dela - concluí.
- Ela iria levá-lo. - pausou por alguns segundos - Elara iria se jogar com ele no colo. Por isso eu me culpo. Nós brigamos, eu o puxei dela, não tinha como segurá-la com um bebê nos braços...
- Eu sinto muito - o abracei mais apertado para mostrar minha solidariedade.
- Não quero ter que contar essas coisas para ele um dia, queria que ele tivesse nascido em outra situação.
- Quando chegar a hora certa, pode deixar que eu conto - ofereci como forma de agradecimento por ele estar sendo tão aberto comigo.
Ele esticou a mão para trás e acarinhou meu braço em forma de agradecimento.
- Desculpa pelos últimos dias - pediu.
- Está tudo bem, - dei de ombros - eu compreendo.
Túlio se virou de lado na cama atrapalhando um pouco nosso abraço, caí sentada no colchão e ele passou a segurar minhas duas mãos.
- Eu não te mereço, Lucillie. - ele disse olhando para as minhas unhas - Tenho medo de não te fazer feliz, de não ser bom para você como não fui para ela. Ela me odiou tanto que... - sua voz sumiu.
...Que se matou.
Arregalei meus olhos com a história trágica. Então é esse sentimento que ele carrega e não consegue esquecer, a mulher que amou o odiou tanto que preferiu morrer a ficar ao lado dele. É claro que não pode ter sido só isso, todos sabemos que a rainha passou por um grave problema de depressão que não pôde ser tratado por conta da gravidez. Não foi só Túlio, foi sua obsessão por poder e riqueza, foi a pressão de seus pais por status. Elara - tão bonita - sempre foi tratada como um produto, perdeu a autonomia da própria felicidade e isso a consumiu de dentro para fora.
- Eu prefiro morrer do que ficar longe de você - assegurei acariciando os cabelos perto de sua nuca como ele gostava.
O canto de seus lábios se ergueram num leve sorriso. Abracei seus ombros, eu gostava de abraçá-lo, gostava de sentir seu corpo sob meus braços, gostava de sentir a textura de sua pele, respirar seu cheiro e estar em contato com ele. Sua cabeça deitou no meu ombro como ele sempre faz quando está precisando de um suporte sentimental (ou até espiritual).
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Lucillie
RomanceUm reino em crise, um rei com um passado persistente, um príncipe sem mãe, uma Lucillie entre a cruz e a espada. Um casamento com fins políticos que pode se misturar com sentimentos, uma filha adotada que não pode fugir das suas origens para sempre...