Ás de Copas [COMPLETO]

Capítulo 9

Tudo está em um silêncio profundo. Abro os olhos, calmamente, lentamente para não sobrecarregar minha cabeça que parece ter sido golpeada com força. Persianas fechadas, luzes apagadas. Não saberia dizer se é dia ou noite, mas estou muito aquecida nesta cama grande e confortável. Por um momento estou tranquila e serena, desfrutando do ambiente que não conheço. O quarto é enorme, calculo ter pelo menos o triplo do tamanho do meu, e está decorado luxuosamente com uma pintura em tom marfim e móveis de qualidade indubitável.

Vasculho meu cérebro pelas lembranças mais recentes. Onde estou? Como cheguei até aqui? Há um buraco no meu estômago. Fome? Há quanto tempo não como?

Levanto metade do corpo para ficar sentada na cama. Gradativamente, as imagens fragmentadas do que aconteceu começam a me assombrar. Jerome. Eu vi Jerome e desmaiei por causa do choque. Ele está vivo... Como isso é possível? Não recordo como cheguei aqui e estou morrendo de medo de saber a resposta.

Ouço batidas suaves na porta antes de um homem abri-la, entrar e acender as luzes do quarto. Eu me encolho nos lençóis, assustada e um pouco ofuscada pela claridade. Quando levanto o olhar para ele de pé ao meu lado da cama, meu coração está batendo tão forte que o sinto na entrada de minha garganta. É ele. Trocou de roupa? Vestido em um par de calças jeans e um novo suéter preto. Foi ele que eu vi... e ele é Jerome!

Respiro profundamente, sentindo o suor frio descer implacavelmente pela minha testa. Tento falar, mas minha voz não quer sair pela minha boca. Mesmo assim, ele se adianta, seguro e confiante:

— Finalmente nos encontramos. — Seus impenetráveis olhos pretos me olham fixamente.

Não consigo dizer nada nos próximos minutos. É como se tivessem arrancado de mim minha capacidade de me comunicar com as pessoas, minha mente anuviada pelas palavras soltas sem sentido. "Finalmente nos encontramos"? O que ele quer dizer com isso? Estou gelada. Tento engolir, mas minha garganta dói, seca. Não pode ser verdade. Luto para não acreditar, mas não consigo, pois ele está bem aqui na minha frente em carne e osso. Jerome estava morto, eu vi com meus próprios olhos enterrarem seu corpo. Como ele poderia estar vivo e eu não saber?

— Sua tez está pálida. — Ele se senta na beirada da cama e inclina o corpo para me tocar de leve no rosto. Por instinto, recuo com o toque como um animalzinho ferido. É uma reação que não consigo controlar diante do sombrio e fantasmagórico. Ele permanece inalterado. — Cheguei tarde — murmura, sua testa se enrugando levemente enquanto me olha. Ainda está com aquele ar tão perdido, quase em um estado catatônico.

Isso é uma confissão? Ele está dizendo que voltou dos mortos e tinha realmente planos para me visitar? Quantas vezes nesses últimos dias eu não pensei nele, sonhei com ele e senti sua presença... Não, isso não pode ser verdade! Uma assombração...? Ele tem de estar morto! Devo estar alucinando ao querer tanto que meus desejos se tornem realidade. De repente, um pensamento me assalta sem minha permissão, e me lembro de Ghost e o homem que volta para assombrar sua esposa.

Engulo em seco.

— Eu nunca me atraso para meus compromissos — ele continua a dizer, em um tom de represália que parece ser direcionado para ninguém menos do que ele mesmo. — Isso é inadmissível. Me perdoe.

Uma alma penada no meu encalço. Isso só é romântico nos filmes. Um fantasma... o fantasma de Jerome? Como pode ser tão perfeito? Parece tão verdadeiro. Contenho a vontade de tocá-lo para saber se é real. Ele está aqui e estou vendo ele... Eu morri? Essa é a única explicação para isso ou então é um sonho. Um sonho muito bom.

— Sim — murmuro em voz baixa, por fim, pouco a pouco me acostumando com a ideia de que ele está vivo ou... morto. — Sim, sim, claro. Não foi de propósito, sei que alguma coisa deve ter acontecido.