3. A garota do queixo de bandida

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— Não quero ir a esse evento.

— É por uma boa causa.

— Sei que é por uma boa causa, mas eu acabei de chegar aqui. E ficar esbanjando o quanto somos ricos não é a minha ideia de diversão.

— Você é um Carver. Não pode ignorar esse chamado — minha mãe me disse, colocando o par de brincos em frente ao espelho da sala de jantar sem se importar em endereçar para mim um olhar sequer. — Além do mais, sou a anfitriã honorária deste evento, e você é o meu filho. Sua presença é indispensável. Se quiser ter algum reconhecimento e sucesso na vida, precisa dar as caras e se mostrar mais participativo em eventos como este. Precisa mostrar que se importa com aqueles que dependem das nossas doações.

— Não é que eu não me importe. Posso fazer doações sem ter que ficar me exibindo por aí.

— Você é mesmo péssimo em autopromoção. Um preguiçoso decepcionante. Se seu pai estivesse vivo, teria vergonha de você. — E como pode ver, minha mãe era péssima em disfarçar seu aborrecimento quando não fazíamos o que ela queria. Ela não media esforços em nos colocar para baixo quando achava que merecíamos.

— Não quero me autopromover. Só quero aproveitar meus dias aqui! — salientei, irritado por já saber que essa vitória não seria minha. — Pelo amor de Deus, faz tanto tempo que não nos encontramos e essa é a primeira coisa que você vê em mim quando coloco meus pés nesta cidade? Uma oportunidade de alavancar a imagem que você quer que as pessoas tenham de mim? Quer controlar até isso? Diga-me, qual é o seu interesse nisso tudo?

Foi então que Sylvia Carver dignou-se a olhar para mim, seu filho. Contra toda a minha natureza revoltada e insurreta, eu quis me encolher diante daquele olhar de aço.

— Você vai. Ponto final — sentenciou ela, irredutível. Mas eu sabia qual era seu real interesse por trás disso tudo: ela queria me preparar para o império que desejava colocar em minhas mãos, sob meu comando. Não foi à toa que eu e meu irmão tivemos que virar adulto antes do tempo e trocar horas de brincadeira por horas de estudo e aprendizado. Jameson era o mais velho e devia estar interessado no legado Carver tanto quanto nossa mãe queria que ele estivesse, mas o cara era tão escorregadio que todas as atenções da Dama de Ferro acabaram se voltando para mim, o idiota que não sabia dizer não.

Veja bem, sei que na época ela se arrependeu muito de ter me arrastado para aquele evento de caridade. Quanto a mim, sou incontestavelmente agradecido por ter ido — ainda que contrariado de início — a um lugar que eu não queria estar.

Caso contrário, como eu teria conhecido você, Ellie?

Dedico este capítulo do diário para falar sobre algo tão importante quanto isso: a primeira vez que pus os olhos em você.

Naquela noite, eu fiquei me sentindo o tal, pois consegui fazer duas coisas sem que você tivesse percebido. A primeira delas: notei você entre os convidados sem ter sido pego em flagrante em momento algum. E a segunda — da qual não me orgulho tanto assim —: empreendi uma perseguição alucinante atrás da garota que roubou meu coração.

Mas vamos por partes.

Você estava vestida com seu meio avental, circulando pelo salão do hotel enquanto oferecia os petiscos sobre a bandeja que você segurava. Depois de a Sra. Carver me ter feito ir de um extremo a outro para cumprimentar alguns investidores e compradores, me estabeleci junto a um grupo de conhecidos, filhos e filhas de empresários e empresárias bem-sucedidos. Não digo nem que eram amigos, porque as recordações que eu tinha deles eram poucas e eram da época em que eu ainda estudava em Atlanta. Ou seja, há muito tempo. A única pessoa que eu fazia questão que estivesse ali era Henry, meu melhor amigo de infância. E mesmo assim, o panaca estava atrasado.

Ás de Copas [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora