SANGUE NA NEVE (PARTE 1)

175 63 117
                                    

#pratodosverem | Descrição da imagem: vê-se uma flecha dourada voando em direção a algum alvo

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

#pratodosverem | Descrição da imagem: vê-se uma flecha dourada voando em direção a algum alvo.

***

DRENTON CHUTOU UMA MESA ATÉ DEIXÁ-LA EM FRANGALHOS. Quem passava ao lado da casa, localizada em uma ladeira próxima à Terceira Estufa, assustava-se com o barulho vindo do segundo andar. Os urros do Unagor vinham de suas entranhas e chocavam-se contra as paredes do lugar. Não podia voltar para casa, não podia entrar em sua propriedade, não podia nem mesmo retirar objetos de dentro da estufa. Por sorte, tinha diversas casas em seu nome pela cidade e, ao se ver em situação tão incômoda, lembrou-se dessa residência e expulsou os inquilinos. Para a sorte deles, não ousaram contrariá-lo. O homem não queria desperdiçar nenhuma gota daquele ódio.

Não ainda.

Não com pessoas tão insignificantes.

Como as coisas haviam chegado até aquele ponto, ele não entendia. Buscava por um ponto de fraqueza em seu discurso. De uma hora para outra, perdera sua voz de autoridade e vira seus planos minguarem; convocara o Bastião na certeza de que, em poucos dias, estaria com todas as estufas ao seu lado, dando-lhe poder para "combater o inimigo". Ao invés disso, fora expurgado de suas terras, proibido de usar o título de Unagor e vira seus segredos brotarem do lamaçal.

Olhou pela janela e sua respiração embaçou o vidro. Não queria admitir, mas era claro o quanto estava em uma situação cuja saída era improvável de todos os ângulos possíveis. "Malditos!", pensou ao rememorar a chave de tudo: pediria comissões aos outros Unagor para protegê-los durante a guerra e, com o apoio dos seus aliados continentais, estenderia o conflito até o inverno seguinte. Então, faria uma armadilha para deter a vinda da adorável Nyrill de Arcéh e, com o sumiço da maldita criatura, os arcéh se revoltariam de uma vez por todas contra o continente, as fronteiras da ilha seriam fechadas e ele teria todo o poder em mãos para fazer o que bem entendesse.

Com a quantidade de Manon no subsolo da Terceira Estufa, suas plantações já estariam adaptadas às altas temperaturas do verão. Portanto, sem os cinco anos de neve para amenizar as coisas e com planos de plantar Manon por toda a ilha, os outros Unagor se veriam em maus lençóis com o clima fervente, sem preparo para suportar a perda de seus produtos e à beira do caos.

Nesse momento, Drenton Paberos surgiria como a salvação.

Mas aí veio Lita Delgo e sua ideia de retomar o lugar do marido...

Há anos tivera tanto trabalho para matar Uriel e os outros dois e agora, tanto tempo depois, a viúva de um deles mostrava-se um empecilho. Isso sim era algo impensado. Mas cuidaria disso em breve. Ah, se cuidaria...

Não apenas dela como também de Caroline Ó Midhir.

Era um desperdício essa história de Oiv. Que nome é esse, Oiv? Uma mulher tão linda dizer-se um homem. Um absurdo. Se o imprestável do filho a tivesse tratado do jeito certo desde o primeiro encontro, talvez ela não tivesse enveredado por aquele caminho. "Mas mostramos para ela o que é bom!", lembrou-se e deu um apertão por entre as pernas. "Mostramos, sim.".

Ainda sentia o cheiro dela em seu corpo.

Será que continuava o mesmo?

Paberos sorriu.

Também cuidaria disso...

Tiraria aquele sorriso de triunfo do rosto de Oiv. Mostraria o que é ser um homem de verdade.

E, por fim, a escória Maxil. Como (Oh, sim, como!) se arrependia por não tê-lo matado naquele dia, na floresta, ou tido a coragem de chamar o pássaro mais uma vez para devorar o menino Erwank. E o idiota vai e mostra a pena. Intacta demais para o seu gosto, é claro. Não duvidava mais de quem invadira sua propriedade e libertara o pássaro. Sim. Arrancou uma pena, guardou consigo, convenceu Lita Delgo a retomar o posto do marido, aliou-se com Ó Midhir e criou aquele espetáculo.

— Jogada perfeita, vadias...!

Na manhã seguinte, quando os Unagor visitassem a Terceira Estufa, encontrariam uma floresta de Manon no subsolo, vestígios do pássaro, filhotes de Halbriew, as plantas de tamanho anormal e outros segredos.

Todos os segredos possíveis.

Drenton deu um soco na janela e fez o vidro explodir pela rua. Algumas transeuntes se assustaram e correram para longe. Outros iniciaram xingamentos, mas, ao verem de quem se tratava, preferiram abaixar a cabeça e apertar o passo. Um dos funcionários do agora ex-Unagor correu para o quarto e viu o sangue escorrer pelo parapeito da janela. Perguntou se estava tudo bem.

— Sim. - respondeu Paberos ao olhar para a mão ensanguentada. — Minha mente nunca esteve tão clara. O informante já deu notícias?

— Sim, senhor. O Unagor Ó Midhir está na estalagem ao lado da Torre Norte. Sairá em viagem após o almoço.

— Ótimo. E o outro?

— Erwank Maxil está na casa da senhora Lita Delgo junto à garota. Higor Sotein voltou para a Quinta Estufa e os demais Unagor foram cada um para suas respectivas propriedades.

— E o traidor? Onde está?

— D-Desculpe, senhor... Eu não...

— CHADON?! ONDE ELE ESTÁ? É TÃO DIFÍCIL COMPREENDER?!

— Nã-Não, senhor. O Unagor Chadon retornou para a Segunda Estufa como os...

— Certo, certo. Pode sair. Prepare a carruagem. Tenho pressa. - quando o outro virava-se para deixar o aposento, Drenton complementou:

— Prepare meu arco e minha aljava com as fechas de ponta dourada.

O rapaz fez outra reverência e saiu quase aos tropeções.

Estava há oito anos à disposição do senhor Paberos. Nesse tempo todo, na única vez em que o homem pedira as flechas de ponta dourada cinco continentais foram encontrados mortos nas florestas do noroeste da ilha. Ninguém jamais comprovou o real motivo da morte. Falavam apenas em "ferimentos semelhantes à flechadas".

Não havia como comprovar nada...

Em contato com sangue, a ponta dourada entrava em combustão e consumia toda a flecha.

A violência transformava-se em cinzas.

E as cinzas do poder são levadas pelo vento da impunidade.

E as cinzas do poder são levadas pelo vento da impunidade

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.


O Bailarino de ArcéhOnde histórias criam vida. Descubra agora