A CASA DOS VOGGI (PARTE 3)

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SE ALGUÉM BUSCASSE POR UM LABIRINTO EM ARCÉH O ENCONTRARIA NA CASA DE MADAME VOGGI. A moradia fora projetada com esmero para esconder os segredos da família e confundir os visitantes, fossem eles indesejados ou não. Ao invés de portas, lenços das mais variadas tonalidades separavam os aposentos e davam a impressão de mudarem de cor a cada movimento; caixas e mais caixas cheias de quinquilharias tomavam os corredores e formavam passagens e desvios; pelas paredes, prateleiras exibiam uma variedade de materiais que iam desde livros encontrados em qualquer biblioteca a estatuetas feitas de materiais nunca vistos na ilha e até bichos em conserva.

Para comportar tantos segredos era necessário espaço. Vista pelo lado de fora, a casa não parecia ser tão grande para os padrões de Arcéh, mas, quem tinha a oportunidade de entrar e caminhar pelos seus aposentos, notava o segredo logo nos primeiros passos: as escadarias corriam para as profundezas como se os alicerces da residência estivessem no centro da terra; como se crescessem junto às raízes da cidade. Porém, o principal boato em torno da família nada tinha a ver com a casa.

Nas rodas de conversa, nos olhares dos visitantes, nos murmúrios dos vizinhos, os arcéh se intrigavam pela verdade em relação à chegada de Medebew Voggi à Arcéh - e o porquê de uma família tão grande ter se reduzido a apenas uma velha senhora e o seu neto.

Nas vendas localizadas no centro da cidade às mesas das hospedarias, nos balcões dos bares aos grupos ao redor das fogueiras pela floresta, quando o assunto pendia para o nome Voggi, havia algo entre o solene e o escárnio ao tratar daquela excentricidade de Arcéh. Ditos populares como "você é tão estranho quanto um Voggi" ou a cantiga "Madame Voggi vai te pegar / Se você não se cuidar / Procure respeitar / Para ela não te levar!" eram exemplos do modo como o imaginário dos arcéh moldara teorias sobre a vida da família.

Inveja ou não, mesmo sem admitir, todos tinham vontade de dar uma espiada naquilo tudo. Mas poucos, muito poucos, tiveram ou teriam essa oportunidade na vida.

Phil e Sâmia seguiam aos risos pelo emaranhado de corredores, em busca de ficarem o mais longe possível dos ouvidos de Margareth. O rapaz gostava da sra. Sotein e a achava uma mulher de fibra, contudo, certas paranoias da mulher o tiravam do sério. Mesmo quando eram apenas amigos, era raro, por exemplo, ter a oportunidade de ficar a sós com a garota. Quando visitava a casa dos Sotein, ele e a amiga só podiam conversar na cozinha, um em cada ponta da mesa, com Margareth no fogão fingindo cozinhar algo; caso decidissem sair para um passeio pelas estufas, a sra. Sotein encontrava um jeito de por alguém no encalço deles (isso quando ela mesma não ia junto e andava entre os dois).

Certa vez, estavam na cidade e escolhiam roupas absortos pela companhia um do outro quando, ao tirar um vestido do cabide, Sâmia quase caiu de susto ao se deparar com o rosto da mãe em meio às roupas.

Por isso, uma oportunidade como aquela não poderia ser desperdiçada.

Correram pela casa sem dar atenção a nada, como duas crianças soltas um lugar cheio de brinquedos e possibilidades de diversão. Mas, ao passarem por uma sala repleta de esculturas, Sâmia parou. Talvez pela sobriedade do lugar, talvez pelos olhares petrificados das estátuas, algo ali a atraia. Guiada pelo instinto, andou até um canto mais escuro do aposento e se deteve diante de um quadro na parede encoberto por um pano. De tudo exposto ali, era a única obra com aspecto de sujo, cheia de teias de aranha e manchas. Curiosa e sem atender aos pedidos de Phil para voltarem a andar, Sâmia puxou o pano e revelou a famosa pintura da Nyrill de Arcéh.

 Curiosa e sem atender aos pedidos de Phil para voltarem a andar, Sâmia puxou o pano e revelou a famosa pintura da Nyrill de Arcéh

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