Capítulo trinta e Um

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Paulo...

Dois dias depois, não havia muita gente na sala da audiência. Minha estada ali era notícias sobre meu subposto sobrinho. Que até então não sabíamos se existia mesmo ou não.

Quando o juiz deu a palavra à promotoria, um promotor de mais idade, devia ter muita experiência, porque depois de suas primeiras palavras, eu mesmo condenaria a Sabrine, caso estivesse fosse o juiz. A sorte da Garota, é que ela estava respaldada por duas ótimas advogadas, que em contrapartida à experiência do promotor, demonstravam raciocínio jovem e lógico. A Nina e a Franchesca, de fato me surpreenderam. E por mais que eu estivesse furioso com a Sabrine, por tudo o que tinha feito, eu não lhe queria mal.

- Minha cliente, foi somente uma peça no jogo. Usada por pai e irmão, em um plano que ela desconhecia. Assim que teve consciência do que se passava à sua volta, começou a buscar uma forma de desvincular-se, mesmo sendo ameaçada e chantageada, arriscando assim sua própria vida. Minha cliente em momento algum se negou a dizer o que sabia. O que se lembrava, e detalhes que talvez fossem importantes para o caso.

Ela consultou o relógio e sorriu...

- Agora sobre a última questão que nossa promotoria alega, nós temos aqui em mãos, este documento, que confirma a versão de minha cliente sobre conhecer a senhora Jordânia. Nem ao menos saber de sua existência.

Ouve um murmúrio geral.

- E como à senhora tem tanta certeza disso? - O Promotor interveio.

- Porque a senhorita nem sequer é filha de Sandra Marques e Eduardo Marques. - O promotor pegou a folha que a Franchesca entregava a ele...

- Quando minha cliente apresentou a documentação, a própria polícia foi notificada que haviam citações sobre a mesma em uma cidade vizinha. Fomos até lá e descobrimos que há vinte anos, a mesma foi dada como "desaparecida". – Eu estava chocado com a notícia. – Nos arquivos do processo, havia uma acusação contra um suspeito "Eduardo Benfica". O nome pode ser coincidência, mas a foto, se observarmos... – A Fran passou a foto para o promotor e para o Juiz. – Embora mais velho, não temos dúvida de que seja o "pai" ou melhor, o senhor "Eduardo Marques". Fichado na época por adulteração de registros. – O som das vozes cresceu e quando juiz pediu silencio, a Fran, voltou a falar. – Saído de tal cidade, o suposto pai de minha cliente, veio morar nessa cidade, onde recrutava crianças pra ganhar seu sustento, nas ruas. – Estávamos todos de olhos atentos. – Foi quando conheceu a vítima. O Senhor Paulo. – Se observarem na próxima página, sua primeira passagem pela polícia da cidade foi de exploração infantil. O senhor Eduardo... Trabalhava nas praças próximas aos morros, fazendo com que as crianças menores pedissem, e roubando as crianças que tentavam ganhar a vida como engraxates ou vendedores nos semáforos.

A Franchesca falava e eu ia me lembrando de quando éramos crianças... Um dos rapazes da praça para onde tínhamos ido. Lembro-me como se fosse hoje. Nós estávamos falando sobre o Lucca ter voltado quando fomos abordados.

- Hei garotos, venham aqui. - Ele era bem mais velho que nós.

Quando chegamos perto, ele foi dizendo... Cheio das gírias e das marras...

- Ceis tá ligado mano que tão entrando na área que minha responsa mano. - Ninguém poderia imaginar que até nas praças tinha quem mandasse. Mas os aproveitadores estavam por todos os lados.

- Nã...o. Não... A gente não sabia não. Já vamos sair. - Meu irmão já estava envolvido com drogas, com o crime e eu era medroso o suficiente para não me envolver com esse tipo de gente.

- Não precisa não seus maluco... A parada é seguinte. Todo dia que vierem para trabalhar terão que pagar um imposto mano. – Imposto? Eu nem sabia o que era direito, mas ouvia os adultos falarem que o governo roubava o trabalhador com tantos impostos. Então cutuquei o JP e disse que em outras palavras o cara queria roubar a gente.

- Como assim pagar? Mal ganhamos para comprar material e pagar a condução. - O JP sempre foi mais boca dura...

- Por exemplo maluco... Quanto ganharam hoje?

- Nada. - Ele até mentiu para o cara.

- Ah maluco fala sério... Estou vendo vocês a tarde toda caralho e quer me dizer que não ganharam nada? Passa para cá o dinheiro, metade mano,
metade do ganho do dia. E já to sendo generoso demais.

Eu não pensei duas vezes na época. Minha mãe sempre dizia: Filho se algum dia alguém te abordar pedindo seu dinheiro ou algo que tem, entrega... Prefiro que fiquemos sem dinheiro do que sem a vida.

Levei a mão no bolso e tirei meus... Me lembro até hoje. O Lucca tinha sido generoso... Oitenta reais em um dia. E nesse dia o desgraçado levou quarenta do que eu tinha. Depois ele mesmo pegou a caixa do JP e contou e retirou sessenta reais. Depois deste dia não voltamos mais naquela praça. Por isso, o Lucca me deu o trabalho na casa dele. O JP não iria mais para a praça e eu ficaria sozinho. Sei lá... Acho que o JP falou com ele ou a Tia Vanessa. Sei que foi um ato de compaixão, por isso me sinto agradecido.

Naquele dia também me desanimei de ser policial. Eu tinha pensado em ser como eles um dia, eram meus heróis, mas um deles me decepcionou profundamente. Ficou olhando o rapaz levar nosso dinheiro e não fez nada.

Quando voltei à realidade a Franchesca estava terminando de explicar que a Sabrine não era registrada na verdade em nome do tal homem. Só constava nos documentos dela, mas em nenhum cartório.

- Não como Sabrine Marques. – A Fran sorriu. – Sabrine Afonso.

A Sabrine estava aos prantos...

Mais tarde minha própria irmã viria a explicar que mais jovens foram encontrados na mesma situação que a Sabrine, pelas mãos do mesmo criminosos.

O Juiz suspendeu a sessão e daqui a pouco se pronunciaria. Minha mãe e a Vanessa aproveitaram para sentarem atrás da Sabrine e conversarem com ela.

Depois de alguns minutos o juiz voltou. Chamou as meninas. Falou algo e depois pronunciou.

- Esta audiência está suspensa até que se tenha provas mais específicas ou por exatos noventa dias.

A Franchesca levou à mão a cabeça.

- Contudo levando em consideração o estado da ré... Recuso o pedido da promotoria para transferência mantendo a ré em prisão provisória devido ao conflito com o princípio da presunção de inocência. Mas também garantindo assim coerência diante o processo enquanto se firma as provas concretas. Esta comarca entende que mesmo que tenha sido criada por pessoas de má índole a senhorita Sabrine agiu de má fé ao esconder fatos importantes da família e de amigos da criança em questão. Enquanto esta comarca não tiver provas concretas a senhorita fica sob custódia em lugar seguro podendo se fazer dos direitos que tem as mulheres em sua condição gestacional.

Ele se levantou e se foi.

- Noventa dias? Noventa dias carra? O que foi isso. - A Franchesca estava revoltada.

O Promotor veio até elas...

- Muito pouco para uma criminosa. - Eu senti que a Fran iria xingá-lo.

- Fran, não perdemos. A promotoria estava pedindo condenação. Já ganhamos só de ela não ser condenada e ainda continuar no presídio onde está. Dentro da cidade. Não tem superlotação. Não fique assim. - A Nina abraçou a Fran.

Mas ela saiu brava do lugar. Elas ainda continuaram com a Sabrine durante um tempo. Eu não tinha nada a falar. Nenhuma palavra sequer. Não queria julgar. Queria dar o benefício da dúvida. Embora me doesse realmente saber que nós fomos privados de ver o filho do meu irmão crescer, eu não queria que o JP passasse pela mesma situação e não acompanhar o desenvolvimento de seu bebê.

Um turbilhão de emoções se passava em minha cabeça. Não eram poucas. Eram muito mais que eu podia suportar.

Sai do lugar sem falar para ninguém. Quando cheguei à porta do fórum encontrei a Fran que conversava com alguém ao telefone e chorava.

- Fran... - Ela desligou o telefone. - Não chora vai...

- Ele a encontrou. Ele a encontrou. - Ela repetia e chorava.

- Ele quem encontrou quem Fran? - Não estava entendendo.

- O JP encontrou a mãe da Sabrine e o garoto. Eles também estão voltando para o Brasil!

Paulo - Amor e GratidãoOnde histórias criam vida. Descubra agora