Capítulo 67 - Isso jamais mudaria

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Noah

Ele simplesmente me mandou entrar, sem me dar mais explicações. Tentei perguntar, mas pela cara dele já soube que minhas perguntas não seriam respondidas.
Já fui esperando pelo pior, entrei com passos lentos e hesitantes me perguntando se eu conseguiria me despedir dele sem sentir algo morrer dentro de mim também.
Fui até a sua cama, onde ele estava ali, pálido e com olhos fechados. O cabelo que precisava ser aparado estava embelezando o travesseiro branco demais. Cheguei mais perto, sem poupar lágrimas e dor.
Peguei a sua mão gelada e a cobri com a minha, puxando-a para os meus lábios onde dei um demorado beijo.
— Ian — choraminguei. — Eu sinto muito... Se eu soubesse que isso ia acontecer jamais teria deixado você ter essas crianças...eu...eu...eu — gaguejei, sentindo a garganta travar em meio aos soluços.
Fechei os olhos, apertando ainda mais a sua mão. Senti-las frias e tão distantes da temperatura dele, do calor que ele proporcionava era triste, muito triste.
Soltei-o após alguns segundos que na minha cabeça foram séculos. Aproximei-me dele e pressionei meus lábios em sua bochecha fria, deixando lágrimas escaparem e o molharem também.
Quase pulei de susto quando ele se moveu, com um sorriso fraco brincando nos lábios.
— O que está fazendo, meu príncipe? — Ouvi-o dizer, piscando para mim com aqueles cílios longos como um leque.
— Ian — arfei, como se eu tivesse visto um fantasma e voltei a chorar como um louco descontrolado. — Você tá vivo?
— Isso é meio obvio não? — disse rindo com um revirar de olhos.
— Ah, meu amor... — murmurei, sentindo minha voz morrer aos poucos. — Achei que tivesse perdido você, achei que...
— Não vai se livrar de mim tão cedo, meu príncipe — garantiu, oferecendo sua mão para segurar, no intuito de me acalmar.
Eu estava arfante, meu corpo tremia e sofria de espasmos esquisitos. Parecia que eu é quem tinha acabado de parir, embora eu soubesse que eu não teria estruturas para isso.
— Sou um rei agora — sussurrei, assim que me vi mais calmo.
— Para mim sempre será o meu príncipe.
— Temos outro príncipe e uma linda princesa — lembrei, finalmente sorrindo ao ter a imagem daqueles dois na minha cabeça.
Como se tivéssemos os chamado, logo uma enfermeira entrou no quarto segurando dois embrulhos que fizeram meu coração descompassar de imediato. Um estava envolto num pano azul e o outro em um cor de rosa, empinei o queixo para ver melhor, mas não foi necessário, logo ambos estavam no colo de Ian, um de cada lado.
Fitei aquelas bochechas rosadas, aquela pele macia, os sorrisos que tinham...
Arrastei a cadeira para mais perto, para conseguir vê-los melhor, tocá-los...
Ambos eram bem parecidos, tinham muito cabelo, tanto que eu até me assustei. Não eram cabelos negros como eu imaginava, eram cor de areia como os meus, porém com os cachinhos de Ian.
Os olhos eram negros e mal abriam, ambos pareciam estar dormindo, com um sorriso banguela no rosto. Aquelas mãozinhas lindas seguravam o pano e o puxava inconscientemente.
Comecei a fungar alto e tentei esconder isso enterrando meu rosto no braço de Ian, que logo notou.
— Está chorando?
— Não — tentei manter a minha voz estável, mas era gritante o som dos meus soluços. Confesso que eu estava um pouco envergonhado. — É suor masculino.
— Sei... — disse, levantando uma sobrancelha de maneira desconfiada.
— Eles têm seus olhos — observei, sem conseguir mais tirar os olhos daqueles dois anjinhos. Eles tinham aquele poder de hipnotizar a todos e desviar o olhar seria quase um crime. Eu não queria perder nenhuma respiração, nenhum som, nada relacionado a eles, queria estar ao lado deles a todo o momento.
— E ruborizam fácil como você — disse, tocando de leve as bochechas de um deles e olhando para as minhas, que sem dúvida estavam vermelhas.
— Minha Jasmim — sussurrei, finalmente vendo pela primeira vez a minha princesa, a qual fantasiei durante toda a minha vida.
— Noah... — Ian pareceu incerto, teve que pigarrear antes de continuar. — Eu não acho que ela devia ter esse nome. Quer dizer, é um nome muito bonito, eu entendo, é só que eu não me sinto confortável por ela carregar o nome que só me trouxe mágoas. Eu não vou reclamar se você quiser mantê-lo, só que eu tive uma ideia melhor — Ele fez uma pausa, certamente para ver se eu não tinha ficado zangado.
A minha expressão beirava a confusão. Claro que foi o nome que sempre amei e admirei, o nome que soube que seria da minha filha desde que o ouvi pela primeira vez quando perguntei a um dos empregados o nome daquela flor tão bela e delicada que eu tinha visto.
‘‘Jasmim’’, havia sussurrado.
— O meu medo é que eles não se identifiquem com esse nome, entende? Se ela não for Jasmim? O que vamos fazer? Iremos prendê-la a esse nome claramente feminino.
— Está me dizendo que a minha filha não é uma garota? — perguntei, ainda sem entender aonde ele queria chegar.
— Não, não é isso — Ian meneou a cabeça, parecendo aflito. — Não podemos prever, sabe? Ela pode não ser uma garota, como pode ser, assim como ele — Ian tocou o rosto do menino. — Ele pode não ser um menino. Não quero prender meus filhos a nomes com gêneros muito pesados, mas não quero forçá-lo a fazer nada — Ian logo abaixou a cabeça, como se nem quisesse ter falado.
— Então você quer trocar o nome que escolhi por medo de que eles sejam trans? — questionei, tentando entender.
— Não exatamente, só não quero prende-los a nomes. Estava pensando em Alex para a menina e Max para o menino.
— Alex e Max? — Não soava ruim, não era Jasmim, mas ainda eram nomes muito bonitos.
Alex e Max Lavezzo Aurelius Tramontini Chevalier.
Nomes curtos, sucintos, que carregavam um sobrenome gigantesco, digno de realeza.
— Sim, porque eles podem ser quem são e continuarem sendo Alex e Max — concluiu com sorriso que acabei compartilhando no mesmo momento.
Nem ousei discordar, ele tinha razão, era por uma boa causa. Nós escolhíamos os nomes baseando na imagem que tínhamos daquele ser que nem ao menos conhecíamos. Então ele crescia, se tornava totalmente o oposto e aquele nome dado com tanto carinho se transformava numa pedra em seus sapatos, algo que abominavam.
Não queria que nenhum dos meus filhos pensassem assim. Claro que isso não queria dizer que eles seriam trans, isso não era algo que eu podia prever. No entanto, eu queria que eles gostassem do nome que escolhemos e sorrissem ao pronunciar.
Eu entendia o Ian, porque Jasmim foi o nome concebido a ele em seu nascimento e a luta para afugentá-lo de sua vida tinha sido sofrida e diária. Conseguia ver o quão incomodado ele ficava quando alguém o pronunciava, quanto ouvia o som das letras, o arrepio que vinha, causando-o um desconforto.
Isso não fazia diferença para mim porque não importava o que ele tinha entre as pernas e nem que já tenha tido outro nome ao longo da vida, pois no final das contas quando me perdesse na imensidão negra de seus olhos, sempre veria apenas o meu Ian e independente de quanto tempo se passasse, isso jamais mudaria.

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