Preso numa mentira

868 63 10
                                    

Paternidade: negativo

O que acontece agora? O que vem depois disso? Eu devo contar a ele? Eu devia ter aberto o exame? Ai, (S/N), você é a médica, claro que devia!

- Eles já estão a caminho. - Dr. Camacho me surpreende, entrando na sala de repente.

- Eu deveria estar tão nervosa por ter lido isso? - Estendo o documento para ele, que o pega, lê e me olha sorrindo.

- Eu já sabia. - Nega com a cabeça - Erick vai ficar tão decepcionado... mesmo já sabendo que não é o pai.

- Acha que ele vai deixá-la com o bebê?

- Isso eu não sei, mas não vou culpá-lo por nada, porque ele a apoiou durante esses nove meses, e ela nem sequer lhe contou a verdade. - Nega com a cabeça - Conte a ele. - Fala direto e mudando de humor.

Aí está a parte ruim de ser interna: nós somos a base da pirâmide, só servimos para ser capacho e seguir ordens dos médicos. Somos usados e tratados como lixo. A sorte desse doutor é ser um moreno maravilhoso, que me dá prazer de trabalhar junto.

Espero a "familia feliz" chegar. Minhas mãos suam e meu coração acelera, como se uma vida dependesse daquela notícia. Quando eles chegam, brincando contentes com o bebê, opto por não dizer nada e apenas entregar o envelope nas mãos do moreno de olhos verdes.

Pude ver o sorriso de Jessica se desmanchando nesse momento, ela me olha desesperada, implorando para que eu não fizesse aquilo, mas eu ignoro. Ele precisa saber a verdade e isso é minha obrigação!

- Jessica? - Erick diz completamente decepcionado, desviando o olhar para a mulher. Ele ergue a mão com o papel e seus olhos brilham por conta das lágrimas. - Como pôde mentir pra mim por nove meses?!

- E-Erick, eu precisava de você. Eu preciso de você. - Ela diz já com lágrimas escorrendo em seu rosto.

Retiro-me do quarto, deixando-os resolver tudo que está pendente. Fico do lado da porta, garantindo que a gritaria não extrapolasse. Ouço alguns soluços vindos de Erick, ele realmente estava magoado. Por quê? Por que ele está assim? Richard não disse que ele já sabia que não era o pai?

- Chega! Eu fiquei noves meses sendo trouxa! Eu amo esse bebê, mas tenho dó dele por ter uma mãe como você! Se ele precisar de alguma coisa, qualquer coisa, eu vou dar. Agora, se você precisar, eu vou fingir que não escutei. Tchau, Jessica. - Quando termina de falar, o homem sai pisando forte do lugar.

Ele se vira, já na porta do PS, limpando as bochechas molhadas, e diz frustrado:

- Doutora, cuide do bebê, por favor. Pede pro Rich me ligar se algo acontecer com ele.

Eu concordo com a cabeça e sinto meu coração se despedaçar quando ele volta a caminhar para fora. Dou meia volta e entro no quarto. Jessica ainda chorava, com o recém-nascido nos braços.

- Foi tudo culpa sua! Você que falou sobre esse teste para ele!

- Eu fiz o que devia ser feito.

- Leve ele para longe! Não quero ele aqui também! - Estendeu seu filho para mim, aquilo terminou de arrebentar meus sentimentos.

Apresso-me para pegar aquele bebê tão indefeso que não tem culpa de nada, muito menos de ter se desenvolvido no meio dessa mentira.

- Anda! Some daqui com isso!

- O que você pretendia fazer? Continuar com sua mentira e estragar a vida de mais uma pessoa? - Digo antes de sair, sem pensar no que estava fazendo.

Encontro Richard no corredor da maternidade e conto o que havia acontecido.

- Vou ligar pro Erick. Agiu muito bem, Dra. (S/N).

- Eu fui grossa com a Jessica antes de sair. - Encolho os ombros e olho para o bebê em meus braços.

- Não devia ter feito isso, mas eu entendo e não vou te dar nenhuma lição por isso. Leve o pequeno...?

- Não sei o nome dele. Acho que não deram ainda.

- Então vamos esperar por isso. Leve-o para junto dos outros bebês e deixe-o em observação, creio que a mãe não vai querer amamentá-lo. Se for preciso, consulte o banco de doação de leite materno.

- Tudo bem, doutor.

- Vai ser um longo plantão. - Ele passa a mão pelo meu ombro e me observa caminhar com o bebezinho.

***

- Eu vou cuidar de você, pequenininho. Não conheço seu pai e sei que sua mãe não está num bom momento, mas você não tem culpa de nada, não merece isso. Vou tomar conta de você e te dar tudo o que precisar. Me avisa se sentir fome, ok? - Converso com ele, antes de entregá-lo à enfermeira da maternidade, que sorri ao ver a cena.

- Pode deixar que eu aviso se alguma coisa acontecer, doutora.

- Muito obrigada... Angelina. - Leio seu crachá e ambas sorrimos. - Tchau, lindinho. - Aceno para eles e saio dali, indo para o quarto de descanso.

Não se passaram nem três horas de plantão e eu já sinto um cansaço extremo tomando conta do meu corpo. Deito na cama de baixo da velha beliche que tem aqui. Fico encarando a madeira sobre mim e acabo pegando no sono.

***

- (S/N), troca comigo, preciso dormir ou vou acabar matando alguém por burrice. - Dani me acorda com sacudidas.

Abro meus olhos lentamente, fazendo uma careta ao encontrar a claridade. Olho o relógio na parede e percebo que só dormi por 20 minutos. Levanto sonolenta e arrumo meu cabelo, indo até o banheiro e lavando o rosto em seguida. Antes de sair, pergunto o número do quarto, mas ela já está dormindo.

- Acho que vou pegar isso aqui. - Pego a prancheta de Dani, com a ficha da paciente. Essa já havia dado a luz, mas a bebê estava com dificuldades para respirar. - Ah que ótimo, outra história triste.

Saio do quarto arrumando meu jaleco, buscando a melhor aparência possível. Desço um andar pelas escadas e vou até o quarto.

- Olá, Senhora Karen, como se sente? - Entro e pergunto simpática, iniciando uma nova consulta.

***

Meu pager acende bem na hora que estou indo ao refeitório e eu mudo a rota para encontrar Angelina e o bebê de Jessica.

Teve treta hein
Tadinho do bebê, né? Foi pesado 💔 aonde o Erick foi??? Comentem e deem estrelinha ❤️

Mi Medicina •EB•Onde histórias criam vida. Descubra agora