CAPÍTULO II

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CAPÍTULO II

Ravensford Hall, Kent, 27 de maio de 1814

John Grey estava sentado ao sol, num banco da gale­ria envidraçada de sua casa de campo, tentando absorver um pouco de calor daquele sol de primavera, a última primavera que teria. Estava morrendo lentamente e procurava conformar-se diante do inevitável. Afinal, saía da vida sem temer as obri­gações não cumpridas.

"Não importa", tornou a ponderar. "Fiz o que era neces­sário para garantir a continuidade do ducado. Christian é tudo o que eu esperava que fosse. Posso morrer em paz."

Ouviu o som de passos no vestíbulo de mármore e virou a cabeça. Um momento depois, a porta da galeria abriu-se e a alta figura de lady Margaret apareceu no limiar. Enquanto a observava caminhar em sua direção, não pôde deixar de admirá-la. Ela caminhava com altivez, as costas eretas, ainda vigorosa em seus setenta e oito anos. O tempo, que o trans­formara num velho frágil, fora-lhe clemente. Ela parecia ter vinte anos menos.

— Não quero incomodá-lo, John, mas...

O duque engoliu o gosto azedo de inveja e levantou os olhos.

— Não vai absolutamente incomodar-me. Então? Alguma novidade?

— Ele chegou. A carruagem acaba de entrar na alameda. Já dei instruções a James de levá-lo à biblioteca dentro de meia hora. — Mangaret perscrutou, ansiosa, o rosto do irmão. —
Eram essas suas istruções, não eram?

— Sim, sim! - respondeu o duque , com impaciência. — Agora acompanhe-me ate a biblioteca. Quero estar sentado atrás da escrivaninha quando ele chegar.

Enquanto Margaret lhe passava a bengala, John perguntou-se se não era loucura ocultar de Christian seu estado de saúde. Não ia demorar muito para que o rapaz descobrisse a verdade. Ao pensar no neto, um sorriso curvou os lábios finos.

"Oh, Christian! Faz dez meses que você partiu, mas posso vê-lo tão bem como se estivesse a meu lado. Alto, forte, sadio, cheio de entusiasmo... Se soubesse como senti sua falta!"

Coube a Margaret tomar-lhe o braço e conduzi-lo vagaro­samente pela galeria, fazendo paradas constantes para que ele pudesse recuperar o fôlego e as forças. Mas estava exausto e banhado em suor quando se sentou atrás de sua ampla escri­vaninha. Mal teve tempo de ajeitar o robe em torno do corpo descarnado, uma firme batida na porta indicou-lhe que Christian estava ali.

- Entre! — disse em voz alta, tentando imprimir a sua voz a firmeza de meses antes.

Fixou os olhos na porta e, enquanto via o neto avançar com a displicência e a vivacidade que só os jovens possuem, pensou: "É quase imoral que um homem seja assim tão bonito!" — Meu caro neto! Fez boa viagem?

- Regular, senhor. As estradas são ruins. Mas aqui estou, intacto. — Christian perscrutou avidamente aquele rosto amado e tão familiar. — Como é bom vê-lo de novo! Espero que es­teja passando bem, senhor.

- Bastante bem para meus setenta e oito anos — o duque apressou-se a dizer. — Está com uma ótima aparência, meu rapaz!

- Obrigado, senhor.

- Não é necessário que seja tão formal comigo. Venha sentar-se a meu lado.

- Permita-me antes que... — Christian voltou-se na direção de sua tia:avó e inclinou levemente a cabeça. — Como vai, lady Margaret?

- Bem, obrigada.

Lady Margaret ficou a olhá-lo por um longo momento e en­tão perguntou:

- Quer que mande servir o chá, John?

Equívoco de Christian GreyOnde histórias criam vida. Descubra agora