CAPÍTULO XXII

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CAPÍTULO XXII

Ao chegarem à pequena igreja normanda do vilarejo, ha­via poucas pessoas no adro calçado de pedras. Os Grey estavam de luto, e a cerimónia nupcial seria despojada de qual­quer pompa.

Da carruagem, Anastasia procurou seu noivo com os olhos. Christian esperava-os ao lado do pequeno faetonte descoberto que ele mesmo guiara. A luz dourada do sol já baixo iluminava seu rosto. Mas havia tal falta de compaixão em sua fisiono­mia que Anastasia acreditou estar olhando para um ser perigo­so, que lhe inspirava medo.

Sentiu o coração bater descompassadamente no peito e te­ve vontade de fugir. Que estava fazendo ali? Como pudera se esquecer do lado sombrio, cruel, desse homem que era ain­da um estranho para ela? Mais do que isso, um enigma?

Enquanto pensava nisso, viu fecharem-se diante de si todas as vias de escape. Patrick já a ajudava a descer, e o sr. Smythe, o pastor, adiantava-se para cumprimentá-la. Avançou timi­damente. A dois passos de Christian, antes que ele se virasse para entrar na igreja, encontrou seu olhar insondável e teve a im­pressão de estar rolando num turbilhão dentro daqueles olhos azuis. Sentiu as pernas tremerem e foi obrigada a apoiar-se no braço do irmão para refrear a tontura.

— Está sentindo alguma coisa? — perguntou ele, preo­
cupado.

— Não — disse ela, conseguindo afinal desviar a vista.
Diante do altar despojado, enquanto o pastor entoava as palavras rituais, ousou lançar um olhar de soslaio àquele ho­mem alto e esguio a seu lado. Mas ele parecia absorvido no exame das figuras de pedra enfileiradas nos vãos das paredes. Christian não a olhava, mas pensava nela, fazia-a surgir de sua imaginação. Vira-a descer da carruagem e seguira cada um de seus movimentos. Sob os raios oblíquos de poeira solar, ela parecia uma visão de contos de fada flutuando no ar...

De repente, sentiu seu olhar pousado nele e virou-se. Viu-a empalidecer e seus olhos dilatarem-se quando encontraram os dele. Ela estava assustada. Teve o impulso de toma-la nos bra­ços e acalmá-la, murmurando-lhe palavras de carinho. Mas conteve-se, percebendo que não era o momento de confortá-la.

E depois, não se levando em conta o começo de suas rela­ções, ele a tratava sempre com a mais completa cortesia. Che­gara até a afastar-se dela, jurando a si mesmo que não a tocaria. Não fora fácil, porque a desejava... Oh, como a desejava!

Enquanto a ouvia repetir os votos sagrados: "Diante de Deus e dos homens"... pensou, de súbito, ter descoberto o motivo de sua tensão. O leito nupcial! Recordou com exatidão tudo o que se passara entre ambos durante aquela infeliz noite de intimidade. E de novo reconheceu que não fora gentil com ela.

Mas não lhe seria difícil, em vez de desconfiança, despertar ternura. Sabia agradar uma mulher na cama. E, quando, em lugar das coisas que a aterrorizavam, ela encontrasse praze­res deliciosos e um amante afetuoso e submisso, seu medo se desvaneceria. Então, poderia pensar num herdeiro para seu ducado. Não era essa a finalidade do matrimónio?

Imbuído dessa certeza, permitiu-se esboçar um leve sorri­so. E, confiante, ajoelhou-se ao lado dela para receber a bên­ção do pastor.

Uma hora depois, Anastasia entrava na saleta do andar su­perior, mergulhada nas sombras rosadas do crepúsculo. As por­tas francesas escancaradas deixavam passar a brisa fresca, exalando, levemente, reminiscências de bosques, de folhagens verdes, de jasmineiros floridos.

Automaticamente, saiu para o balcão. Começava já a escu­recer e no céu de opala cintilavam as primeiras estrelas. Sons noturnos pontuavam o silêncio. Eram ruídos tranquilos e fa­miliares, que deveriam transmitir-lhe calma, mas que, estra­nhamente, só faziam aumentar sua inquietação. Tinha a impressão nítida de que, se esticasse o braço, uma garra gela­da a apanharia sem demora...

Equívoco de Christian GreyOnde histórias criam vida. Descubra agora