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| J O A N A |

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| J O A N A |

Os nossos corpos estavam embolados um no outro, na parte detrás do carro. A respiração serena do Tomás acertava o meu ombro nu, enquanto eu lhe fazia círculos invisíveis, com a ponta do dedo, no seu peito.

Olhei-o diretamente nos olhos, passei-lhe as mãos pela face, contornei-lhe os lábios, rocei o meu nariz no seu e por fim mordi-lhe o queixo, acrescentando uma careta.

Voltei a aninhar-me no seu peito morno, abraçando-lhe fortemente a cintura e sentindo os braços dele rodearem os meus ombros, apoiando a sua cabeça no topo da minha.

- Sei que eventualmente teremos de ir embora, mas não me apetece nada. – A minha voz saiu abafada, contra a pele do Tomás.

Depois de dizer aquilo, voltamos a deixar que o silêncio nos envolvesse, apenas sentindo-nos um ao outro. As nossas respirações misturavam-se no ar e o chilrear dos pássaros fazia-nos companhia.

- Eu tinha dezasseis anos – a voz do Tomás fez-se ouvir, inesperadamente. – Foi nesse dia que conheci o Lourenço.

Fiz a minha cabeça descolar-se do peito dele, para que o pudesse olhar. Os seus olhos estavam fechados, mas ele abriu-os por segundos, o suficiente para ver a minha cara de interesse e espanto.

Do fundo do seu âmago, um suspiro foi expelido.

- As coisas nunca tinham sido fáceis, mas naquele ano estavam especialmente complicadas. O meu pai tinha morrido num assalto e a minha mãe... - ele deu uma risada amargurada – fazia questão de me culpar. Dizia que ele apenas cometia os assaltos por causa de mim, logo eu tinha sido o culpado pela sua morte.

Mordi a língua a tempo de não soltar um insulto nada agradável contra essa mulher. Se havia algum culpado da morte do pai do Tomás, era ele mesmo, que decidira cometer um crime e justificar-se com o filho.

Para além disso, a mulher só podia ser doente em culpar um filho da morte do pai, em pleno tempo de luto, dor e perda. Como se fosse fácil lidar com a morte do pai, o Tomás ainda teve de levar com as culpas da mãe, com a sua falta de apoio. Deve ter sido um tempo dos diabos na sua vida.

- Então, comecei a traficar.

Senti que o ar pesava tonelada sobre nós. Fiquei sem reação, estática, com os braços do Tomás em volta dos meus ombros, que me agarravam como se eu fosse a sua bóia salva-vidas.

- Eram drogas leves. Pouco consumia, pelo menos não ao ponto de me tornar dependente. Andava constantemente metido em brigas, tanto na escola como fora dela. A minha mãe não queria saber, de todas as maneiras...

A saliva custou a passar na minha garganta, enquanto me separava dele, suavemente. As suas feições ostentavam um ar compenetrado na história do seu passado. Os olhos postos no nada, o vinco entre as sobrancelhas, os lábios cerrados friamente.

E no meio do silencio que se fez, um meio sorriso despontou dos seus lábios. Era um sorriso triste, mas feliz ao mesmo tempo.

- No meio de toda a merda que era a minha vida, eu conheci uma menina.

O meu coração deu um baque sonoro no meu peito.

- Éramos dois fodidos, com uma vida de merda, ideais uma para o outro. Mesmo assim, fui capaz de lhe destruir a vida de vez.

Senti a respiração do Tomás bater com força no meu ombro. Um lampejo de fúria passou pelos seus olhos.

- Ela ficou grávida e a sua gravidez estava a passar por complicações. Ela era cardíaca, e depois ganhou pré-eclâmpsia. Um dia ela ficou sozinha em casa e... morreu.

A voz do Tomás saiu estrangulada, enquanto um filete transparente lhe cortava a bochechas, recortando-lhe a pele, delimitando um caminho triste e profundo. A lágrima solitária estacionou nos seus lábios.

- Morreu enquanto eu fumava atrás de um barracão qualquer. Sem ninguém para a ajudar. Sem ninguém para lhe assegurar que tudo ia ficar bem.

As palavras custavam-lhe a sair, misturando-se ao sufoco que com certeza lhe tapava o peito. Os meus olhos encheram-se de lágrimas, e sem ser capaz de me condoer perante o sofrimento do Tomás, verteram lágrimas grandes e grossas.

- Ela tinha um irmão mais velho, e lá no bairro era olho por olho, dente por dente. Então ele um dia apanhou-me num bar, totalmente bêbado. Decidiu que a vingança perfeita era dar-me porrada e esfaquear-me.

Os seus próprios dedos migraram para a cicatriz, sublinhando-a com as suas digitais, enquanto os seus olhos continuavam fixos num ponto indistinto. Fiz com que os meus dedos lhe tocassem o pulso, fizesse um caminho suave até aos nós dos seus dedos e posteriormente se entrelaçassem nos seus.

O meu gesto fez com que os seus olhos se chocassem com os meus. Eu queria que ele soubesse que eu estava ali, que podia confiar em mim, que eu não o julgaria.

Bem, a historia da cicatriz estava contada, mas o seu passado não estava totalmente desvendado. Eu sabia disso, sabia perfeitamente que ainda havia mais.

- A minha sorte foi que o Lourenço também estava lá, num estado bem melhor que eu. Ele ajudou-me, levou-me para o hospital e tudo – um outro suspiro despontou dos seus pulmões. – Pouco tempo depois fui apanhado com droga e fui preso. Um ano e sete meses lá dentro, quando saí soube que tinha uma irmã. Nesse momento, eu tive a certeza que não podia deixar que a Milena passasse pelo mesmo que eu, mas para isso tinha de arranjar condições para cuidar legalmente de uma criança.

Eu ouvia atentamente a história do Tomás.

- Depois nasceu o João. E, entretanto, eu consegui uma vida estável, mas o meu passado não me ajudou, nunca me ajudou. E o juiz prefere dar a guarda das crianças a uma mulher que não quer saber delas, que apenas as usa para extorquir dinheiro aos amantes, do que ao irmão que os ama mais que tudo – a revolta na voz do Tomás era notável.

E era compreensível a sua revolta. Afinal, estávamos a falar de uma mulher que nunca quis saber dele, que preferia culpar o filho pela morte do próprio pai.

- Sei que nada disto é fácil, que o meu passado não é um colírio para que te mantenhas ao meu lado. E compreendo se achares que isso é algo que ainda me define...

- Hey, Tomás! – puxei o seu rosto de forma a que me olhasse nos olhos. – Bonito ou feio, passado é isso mesmo: passado. E eu não te vou abandonar apenas porque o teu passado é um tanto tenebroso, tenho a certeza de que conseguimos fazer do presente e futuro algo melhor.

~~~~~''~~~~

Ahhhhhhhhhhh!! 

Este fim... eles são tão fofos juntosss!!

Ás vezes dá-me vontade de pegar na Joana e no Tomás e colocá-lo dentro de um potinho para que nada de mal lhes aconteça! 😂😂

Nunca pensei gostar tanto deles e da história deles, sério! Esta deve ser a história que mais estou a gostar de escrever. Um pouco, talvez, por saber que ninguém gostava da Joana, eu admito... Outro tanto, porque talvez a minha escrita esteja a evoluir e com isso se torne mais aprazível na leitura. 

Bem, com muita pena minha, as coisas más vão ter de acontecer, toda a gente sabe disso. Por isso, preparem-se!!

Como sempre, apelo pela vossa estrelinha ⭐ e pelos vossos comentário. Quero saber TUDO, sobre o que estão a achar destes dois!! 

Volto para o próximo domingo!! 

Beijinhos, amo muito vocês!! 💜😘

[Concluída] Acasos da vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora