Capítulo 6 - Caixa Silenciosa

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Loretta Narrando

Depois do jantar e tomar banho, todos os pacientes devem retornar para os seus quartos, dito e feito, foi o que aconteceu.

Enquanto caminhava, eu só conseguia pensar em Charlotte, que a esta hora ainda estava na solitária e só saíria de madrugada, o que me fazia sentir um pouco de pena dela. Aquele lugar é excessivamente silencioso, dependendo de quanto tempo uma pessoa permanece ali, encarando as mesmas paredes, acordando com uma sirene desnecessariamente alta e sendo alimentada com uma comida pior do que a que já é oferecida pelos cozinheiros, pode acabar se tornando o inferno de qualquer um.

Coisas desse tipo, pelo que eu lia, só aconteciam na prisão. Mas talvez esse fosse um método dos médicos e funcionários, de manter a ordem no HPL.

Ao virar o corredor, que dá no meu quarto, avistei Darla entrando no cômodo, com a feição um pouco preocupada. Me aproximei da porta, girei a maçaneta e, assim que a abri, ela me encarou por alguns segundos, o que me assustou.

- o que foi agora? - questionei ao fitar seu olhar fixado em mim.

Darla - não é nada... - foi rápida em negar. Eu fechei a porta, ainda sem tirar os olhos dela.

- então tá... - ela está escondendo alguma coisa.

Resolvi ignorar a atmosfera estranha e ir me deitar, foi só depois de pousar a cabeça sobre o travesseiro, que percebi a tamanha exaustão que sentia. Então, só precisei fechar os olhos e respirar fundo para cair no sono.

] ~~~ [

Peter - Loretta... Loretta - de onde está vindo essa voz? - Loretta... Socorro...

Diante dos meus olhos, via apenas um espaço vazio, totalmente branco e solitário.

Eu quero gritar. Quero avisá-lo que não o vejo, mas cada vez que tento dizer alguma coisa, nenhum som sai da minha boca. Continuo forçando, porém não adianta, é como se minha mente quisesse falar com meu amigo, mas minha garganta esquecesse como se expressar no caminho.

Peter - preciso da sua ajuda... - continuava sussurrando .

Eu não consigo lhe ver! Onde você está?!

Desespero, é o que eu sinto quando ouço repetidas vezes o pedido de socorro, fraco e dolorido, do Peter, mas não consigo pronunciar nenhuma palavra. Antes que tudo ficasse ainda mais aterrorizante, a voz se calou, e eu ainda continuava naquele lugar.

O sentimento de impotência, inutilidade, vazio... me tomou por completo, e por isso eu enterrei os dedos em meu cabelo e deixei meu corpo desmoronar no chão; me sentei, escondi meu rosto, o apoiando nos joelhos e, mesmo que possa parecer ridículo, continuei com as mãos na cabeça - como se aquilo fosse fazer o peso do silêncio, se tornar mais leve - silêncio que, muitas vezes odiei por ter sido sufocada por ele a vida toda, retornava a esmagar o meu cérebro.

De repente, senti uma mão fria tocando o meu ombro, junto a um sussurro, mas não era a voz do meu amigo, era a de Darla. Imediatamente ergui a cabeça, me sentindo em estado de pânico.

Darla - se acalme, querida. Logo isso vai acabar... - ela estava com um sorriso cínico no rosto, sorriso que se manteve firme, mesmo quando o som de um grito estridente ecoou por todo o local.

Era Peter quem gritava, e nesse momento eu já não sabia o que era pior, o peso do silêncio ou o grito imensamente alto da pessoa em quem eu mais confiava na vida.

[ ~~~ ]

Ainda afetada pelo recente pesadelo, abri meu olhos devagar, processando tudo o que eu acabara de ver e viver dentro da minha cabeça. Eu, particularmente, nunca acreditei que sonhos pudessem significar algo, até acordar e me deparar com a face daquela mulher, enquanto tinha em mãos uma seringa, da qual era apontada à lateral do meu pescoço.

- VOCÊ ENLOUQUECEU, DARLA?? - afastei o objeto afiado, o jogando para o outro lado do quarto.

Darla - eu preciso deixar você igual a eles - seu rosto não esboçava reação.

- o que quer dizer com isso? - abaixei o tom de voz, me sentando na cama.

Darla - eu não vou te machucar, eu só preciso... - a enfermeira que sempre alegou ter me acolhido, se virou, andou em direção a seringa jogada no chão e abaixou para pegá-la, eu imediatamente me coloquei de pé - que me obedeça... - ela se levantou, ainda de costas para mim.

Devagar, enquanto Darla continuava falando sem fazer contato visual, me aproximei da porta.

Ela está completamente fora de si...

Darla - é minha obrigação... é minha culpa... - sussurrava. Ao chegar perto o suficiente da porta, eu girei a maçaneta, estava pronta para sair dali. Ela se virou imediatamente. - NÃO FUJA DE MIM! - a mesma andou na minha direção, em passos pesados e apressados. Eu abri a porta.

Mas assim que fiz tal coisa, a mesma deixou de andar e começou a correr atrás de mim. A única coisa que pensei foi em fugir e me esconder dela.

Saí do quarto, correndo o mais rápido que podia, o manicômio já estava com a maioria das luzes apagadas e era muito difícil enxergar alguma coisa em meio a escuridão, então resolvi apenas manter as pernas em movimento. Ao me virar para trás por alguns segundos, consegui notar que Darla continuava com aquela seringa na mão, a todo momento me perseguindo.

Comecei a sentir meus pulmões enfraquecendo; estava ficando sem fôlego. O hospital é muito grande, e naquele momento eu já nem sabia em que parte dele eu estava. Ao encontrar um outro corredor, sem pensar, entrei nele, na tentativa de despistá-la.

Porém, no momento em que voltei a olhar para trás e fiz menção de verificar se tinha conseguido realizar o objetivo, senti meu corpo se chocar contra algo ou alguém, me fazendo perder o equilíbrio e cair no chão.

Completamente sem fôlego, ergui o rosto, buscando identificar o que me fizera desmoronar e, com o pouco que se era possível enxergar, tive a impressão de ver uma face familiar.

Charlotte - o que você faz acordada, garota?! - ela estendeu a mão para mim, e a sua voz me fez ter certeza de quem era.

- não posso explicar agora, Charlotte - aceitei a sua ajuda, porém devido a pressa, eu a ignorei e continuei o que eu estava fazendo.

Charlotte - pode sim! - a garota segurou o meu braço, antes que eu conseguisse sair.

- não. - exclamei - não posso, Charlotte! - a mesma se manteve em silêncio, parecendo estar com uma aura confusa e inconformada, ao mesmo tempo.

Charlotte - que se dane, vai logo! - me soltou e continuou andando em meio à escuridão, o que me despertou uma dúvida.

No caso da Darla se encontrar com ela, Charlotte dirá para que lado eu fui, ou não?

Sem tempo, afastei tais pensamentos e continuei correndo. Quando virei a direita, logo avistei uma porta de madeira e, depois de checar, me certificando de que Darla não tenha me visto, decidi me esconder.

Ofegante, ao me aproximar o suficiente, a abri, reconhecendo ser um quartinho de limpeza. Entrei e deitei ali mesmo, no chão. Meu peito era incapaz de desacelerar e respirar fazia meus pulmões doerem.

E novamente, como se o sonho se tornasse realidade, eu estava em um cômodo vazio, sozinha e incapaz de gritar.

Eu era uma pequena bailarina, presa dentro de uma caixa de música quebrada, esperando que um milagre acontecesse e pudesse ouvir a melodia do mundo novamente.
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Mar De Mármore - O Paraíso É Uma Alucinação.Onde histórias criam vida. Descubra agora