5.

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Minutos se passam, e nada. Não ouve nada. Talvez não seja capaz de ouvir a Voz. Talvez a Voz esteja tentando falar com ele agora, e ele não consegue ouvir. Ou talvez a Voz não queira se comunicar com ele porque havia profanado o Templo duas vezes, e porque estava cheio de dúvidas, e porque sentia medo, e porque...

As lágrimas não se contêm desta vez. Logo ele chora e soluça como uma criança. Ele, o líder de seu povo, que deveria ser o guia espiritual de todos, está ali, sozinho, sem o auxílio espiritual de que precisa. Em breve as portas seriam abertas e eles o veriam como estava: sentado como um menino assustado, chorando e gemendo, sem coragem para tomar atitude nenhuma. Porque a Voz o abandonara, e seu povo logo o abandonaria. Porque tudo que ele tinha feito a vida inteira havia sido em vão. Porque sua vida estava acabada. Seu pai o odiaria. Seu povo o odiaria. Os Auxiliadores o odiariam. Se a própria Voz o odiasse também, poderia cair morto a qualquer instante. Ele mesmo odiava sua própria vida.

O choro alivia seu peito. Fazia tempo que não chorava assim. Aliás, nunca tinha chorado assim, nunca teve motivos para tanto. Sua vida sempre foi tão perfeita e exata, e só nos últimos meses é que começaram a aparecer as dúvidas, os medos...

O choro alivia seu peito e o ajuda a se levantar e olhar ao redor. Todo o Templo é feito de um tipo de mármore azulado, desde o chão até as colunas e o teto altíssimo. Não há mobília alguma. Uma fina camada de poeira cobre o chão do ambiente completamente vazio, tornando o azul ainda mais pálido. A pouca luz que mal ilumina o Templo desce suavemente pelas janelas, que são altas demais para que alguém veja através delas. A luz chega azulada.

Logo o ambiente sereno, silencioso e azul invade o interior do Sacerdote. Os olhos, já secos, olham para tudo com calma e paz. Não há nada ali, e aquele ambiente lhe desperta um sentimento nunca antes sentido: o de privacidade.

Apesar da multidão ansiosa lá fora, ele tem seu primeiro tempo de liberdade, longe de tudo e de todos. Aquele lugar era agora só dele, já que só ele poderia entrar. E, se a vida como filho do Sacerdote jamais havia lhe permitido qualquer privacidade, o Templo seria seu único refúgio durante as Audições. Sem olhares curiosos. Sem Auxiliadores o controlando. Sem cumprimentos e cordialidades demoradas e cansativas. O Templo era um lar como o que nunca teve, um lar de silêncio.

Mas rapidamente sua paz azul é substituída por um sentimento de urgência. A Voz nada dissera, e ele não podia sair de lá sem uma mensagem. Pensa em inventar algo, e seu rosto imediatamente queima. Como pode pensar em tal profanação, ali dentro? Ele implora novamente por perdão.

Deve haver algo que possa ser feito sem que se ofenda a Voz. Talvez dizer a verdade, que não ouviu nada? De maneira alguma! Isso nunca havia acontecido a nenhum Sacerdote antes, e nem pode acontecer! As consequências seriam desastrosas. É preciso pensar...

Uma nova sensação emerge de repente: e se a Voz, na verdade, não falasse externamente, mas internamente? E se os seus próprios pensamentos fossem a Voz? Talvez ele estivesse se concentrando demais para ouvir, quando na verdade deveria apenas escutar os próprios pensamentos. Ninguém havia lhe dito explicitamente que escutaria a Voz com seus ouvidos físicos. Ele respira, deixando os pensamentos fluírem. O que a Voz gostaria que dissesse ao povo?

A resposta chega tão clara e límpida que seu coração se enche de alegria e esperança. A Voz havia finalmente se revelado a ele, e tudo voltaria à normalidade.

Ele caminha na direção das portas, mas elas não se abrem. Pensa em bater, mas logo desiste da ideia ridícula. Só então percebe uma pequena alavanca ao lado das portas. Ele a aciona. Com um estouro e um rugido de pedra raspando sobre pedra, a luz do sol atinge seu rosto com intensidade.    

O que acham dessa solução elegante que o Sacerdote encontrou para seu pequeno grande problema? Fez sentido para vocês? Para mim, não muito rsrs

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