50.

658 119 56
                                    

Lúcio come devagar, desmanchando com o garfo o conteúdo simplório de seu prato. Acostumado aos banquetes, a porção insignificante de ovos fritos e batatas murchas não serviria para mantê-lo de pé a noite toda. Por outro lado, devorar a pouca comida que o garoto tinha em casa parecia um erro.

- Está tão ruim assim? - Dantálion sorria, tilintando os talheres no prato vazio à sua frente – Parece que ser de baixa classe não faz de mim um bom cozinheiro automaticamente, como você pensava...

- Não está ruim. Eu só...

- Só está se sentindo culpado, porque você acha que eu sou um pobre miserável morrendo de fome. Acertei? – ele sacode a cabeça em zombaria – Não se preocupe. De todos os meus problemas, a fome sempre foi o menor.

Lúcio termina de esvaziar seu prato com garfadas rápidas, encarando as próprias mãos.

- Não é nisso que eu estava pensando.

- Você já se viu mentindo no espelho? – Dantálion pega a caixa de madeira e a abre ao meio sobre a mesa – É a pior encenação que já vi em toda minha vida. Principalmente os olhos. – aponta um dedo para seus olhos escuros e firmes – Você precisa olhar nos olhos das pessoas quando mente, ou nunca vai convencer ninguém.

De dentro da caixa, ele retira vários objetos com formatos diferentes. Parte deles são esculpidos em madeira dourada, outros em madeira preta. Posicionando a caixa para que fique dividida entre quadrados das mesmas cores, Dantálion arruma os objetos sobre ela, um a um, deslizando os dedos delicadamente por cada peça com orgulho.

- Você já jogou xadrez alguma vez, Sacerdote? – pergunta, sem tirar os olhos dos objetos.

- Não. – limita-se a responder, observando sem interesse algum enquanto o outro manuseia os itens.

- Você já jogou algum jogo em sua vida? – pergunta acidamente.

- Não.

- Então isto vai ser um pouco mais difícil do que eu pensava. Sente-se aqui, vou te ensinar como se joga.

Dantálion mostra cada uma das peças, dizendo seus nomes e explicando como devem ser movidas.

- O objetivo do jogo é derrubar o rei. – diz – Se você derrubar o meu, você ganha. As douradas são suas, então você começa.

O Sacerdote move as peças desajeitadamente, muitas vezes para os lugares errados, tendo que retornar o movimento a cada vez que Dantálion o corrige com impaciência.

Em alguns minutos, o garoto o vence.

- Xeque-mate.

- O que significam essas palavras?

- Eu não sei. – Dantálion volta a colocar as peças em seus devidos lugares – Preste mais atenção nos bispos. Estou te cercando muito fácil.

Uma nova partida começa.

- Pare. O que pensa que está fazendo agora?

- Derrubando suas peças.

- Isso é xadrez, não damas. Você não pode sair pegando a primeira peça que estiver na sua frente.

- Mas eu pensei que...

- Pensou errado. Você precisa atingir o rei. A quantidade de peças que você derrota não é importante.

- Estou enfraquecendo você.

- Não se não estiver prestando atenção no seu território. Você está em xeque, aliás. Precisa parar de subestimar os peões.

Dantálion [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora