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Aproveitando os dias seguintes para restaurar as energias perdidas em tantas noites insones, o Sacerdote vai ao ponto de encontro apenas três noites depois. Ele chega cedo, os últimos raios de sol ainda visíveis.

Para disfarçar qualquer suspeita, havia dito a Vero que não estava se sentindo bem e passaria o resto do dia no quarto, descansando, antes de pular pela janela e disparar na direção do bosque. As marcas azuladas sob seus olhos eram convincentes por si sós.

Dantálion aparece à distância, caminhando devagar, mancando sobre a perna esquerda. Há algo errado em seu rosto.

Quando se aproxima, o Sacerdote retém um sibilo. O rosto de Dantálion está vermelho, um dos olhos roxo e inchado, seus lábios marcados por um corte enegrecido de sangue coagulado.

- O que houve com você?! – pergunta o Sacerdote, correndo em sua direção.

- Nada.

- Nada?! Qual o seu problema?! Você viu o estado do seu rosto?

Dantálion responde casualmente, depositando sua mochila a um canto, como se o fato em si não tivesse importância alguma:

- Eu fui assaltado.

O Sacerdote ergue as sobrancelhas, analisando cada marca e ferida em seu rosto. Aparentemente alguém havia tratado de suas feridas, mas não da forma mais eficaz.

- Deixe-me adivinhar, você resolveu dar uma de herói e lutou com ele?

- Com eles. Eram três.

Embora ainda mantivesse seu tom desleixado, o sorriso de vaidade na fala de Dantálion não passou despercebido.

- Por que você não deu o que eles queriam? Não deveria ter reagido.

Dantálion solta um riso nervoso, contraindo os lábios dolorosamente. Ele enfia a mão nos bolsos da calça e começa a retirar, um por um, vários itens exóticos, provavelmente saqueados em suas excursões fora da cidade. Alguns são feitos de um tipo de metal, outros de vidro, e outros de materiais desconhecidos. Mesmo sem poder dizer qual a utilidade deles, qualquer um saberia que não foram produzidos dentro da cidade.

- Preciso te explicar por que não pude entregar a eles? – indaga rispidamente - Prefiro morrer na mão de alguns ladrões idiotas do que morrer nas mãos de um de vocês.

As palavras atingem o Sacerdote. Num impulso irracional, ele encolhe os ombros e prende a respiração, como se pudesse, de algum modo, tornar-se invisível.

- Mas não se preocupe com isso. Não foi hoje, e já estou melhorando. Os outros ficaram bem piores. – complementa, sorrindo.

O Sacerdote esfrega um dos pés sobre a terra, limpando as folhas e galhos caídos.

- Você fez... Bem, você sabe...

- Se eu matei algum deles? – ri o garoto, seus olhos escuros brilhando de contentamento – Não. Pode ficar tranquilo. Matar é uma coisa da qual o seu tipo se orgulha, não o meu.

- Pensei que os Surdos quisessem matar todos do Palácio. – Lúcio o fuzila.

- Agora estamos falando de algo totalmente diferente. Existe uma grande diferença entre matar ditadores e matar um imbecil que rouba sapatos no meio da floresta.

- São todos seres humanos.

- Alguns são mais humanos que outros.

- Isso parece bastante arrogante vindo de você.

- Olhe só o que está falando! Você é o único aqui que já matou alguém. E foi muito pior do que executar um criminoso.

- Tecnicamente, ela era uma criminosa.

Dantálion [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora