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Caminham mais um tempo, dois espíritos assombrando o bosque.

O Sacerdote tem medo no início, mas logo se sente confortável vestido daquela forma. De certa maneira, o fato de esconder seu rosto e seu corpo todo o faz sentir mais livre e mais forte. Não precisava mais ser o Sacerdote, podia ser quem quisesse. Podia ser Moloque.

Param diante de um poço abandonado.

- Siga-me. – ordena Dantálion, desaparecendo pela abertura.

Iluminado pela lua, o Sacerdote vê que ele desce por uma escada improvisada, encostada à lateral. Ele o segue, lutando contra o impulso claustrofóbico que o impele a sair daquele lugar estreito e escuro.

No fundo do poço, seco há muitos anos e coberto por uma camada de poeira, há um pequeno corredor, invisível da superfície, dentro do qual surge uma porta de madeira maciça.

Dantálion está parado diante da porta, sua voz alterada vindo do além:

- Agora, Moloque, eu preciso que você seja sincero de verdade.

Ele gesticula na direção da porta.

- Eu não posso te obrigar a seguir daqui em diante. Você precisa saber o risco que estará correndo se atravessar esta porta.

O Sacerdote permanece em silêncio, cada músculo de seu corpo tenso.

- Atrás desta porta estão os seus maiores inimigos. Eles odeiam você e os seus companheiros do Palácio. Eles te matariam se soubessem quem você é, e jamais aceitariam sua presença no meio deles. Eles vivem e respiram com o único objetivo de te verem derrotado.

Apesar do disfarce na voz, é possível ouvir a seriedade:

- Por isso é importante que eles nunca saibam quem você é. – ele suspira, o som tomando um aspecto horripilante através da máscara, como de um animal uivando – Você pode ser morto por estar aqui. Você pode me ver morrer. Você pode ver todas as pessoas que você ama morrerem, pode inclusive ser responsável pela morte delas. Pense bem se é isso que você deseja. Você tem uma vida boa, garoto. Tem a melhor vida que qualquer um de nós poderia querer. Você tem poder, tem admiradores, tem respeito, e essas coisas não são de se jogar fora. Você está disposto a perder tudo isso? Eu te juro, Moloque, se fosse eu no seu lugar, eu não atravessaria esta porta. Então pense muito bem. Você está disposto a viver uma vida de miséria e sofrimento conosco? Porque é só isso que você vai encontrar lá dentro.

- Você acha que minha vida pode ser boa no Palácio, cercado de pessoas que me matariam por seus interesses?

Dantálion aponta o polegar desanimadamente para a passagem.

- Pois tenha certeza de que você acabou de descrever o tipo de gente que está aí dentro.

- Você não vai me dissuadir. Acha que posso simplesmente voltar a ser quem eu era e esquecer tudo que você me mostrou?

- Você não sabe o que eu daria para ter essa escolha.

- Então, se você tivesse a chance, não atravessaria a porta? É isso que está me dizendo? Que você escolheria viver como uma pessoa comum, se pudesse? – pergunta o Sacerdote, inconformado com a covardia do outro.

- Pudesse é uma palavra que eu não conheci em toda minha vida, Moloque.

- Mas, se você pudesse escolher, você certamente entraria, Dantálion. Eu conheço você suficientemente bem para saber que nós faríamos a mesma coisa. Nós dois queremos saber a verdade. E você não voltaria atrás depois de saber o que sabe. Voltaria?

- Podemos ser iguais em curiosidade, mas será que somos iguais em capacidade de aguentar a dor? – ele aperta um dedo com força contra o peito do Sacerdote - Você não faz ideia do que sofrer significa, e eu não estou falando de levar um tapa no rosto, estou falando de sentir sua sanidade mental sendo lentamente rasgada ao meio e não ter uma única saída a não ser fingir que está tudo bem.

Dantálion se aproxima de seu rosto, sussurrando:

- Estou falando de querer morrer e ter que continuar vivo.

Impaciente, o Sacerdote endireita as costas e passa por ele, colocando a mão sobre a porta para abri-la. Ele vira o rosto para o outro com firmeza:

- Eu já tomei minha decisão. Não tenho dúvidas.

Dantálion lhe dá um tapa de leve no ombro e o afasta, tomando seu lugar para inserir um pequeno objeto metálico numa abertura invisível da porta. Ao girar a peça, um estalo ecoa, e a porta recua alguns centímetros para trás. Antes de entrar, porém, ele se volta para o Sacerdote:

- Já que você está dentro, precisamos ter algumas aulas de encenação.Você continua sendo um péssimo mentiroso.    

Que orgulho do nosso menininho, crescendo!

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Que orgulho do nosso menininho, crescendo!

Mas será que ele tem noção de onde está se metendo???

Dantálion [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora