02. Oceano.

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Tio Adam achava que sua alegria constante poderia me curar de uma certa forma. Ele acreditava que o seu otimismo iria passar para mim, que só olhava o mundo de uma forma mais triste.

O mundo é triste. As pessoas são ruins. Tudo vai acabar um dia. Se não acabar, esse sofrimento será em vão.

A realidade tem outro nome, a realidade não é aceita.

Eu não estou doente.

Eu sou realista.

Meu moletom preto o incomodava, mas ele queria que eu me sentisse avontade, então me carregava para todo lugar, oque não me ajudava. Eu odeio tumulto, muitas pessoas. Isso me sufoca, me sinto vulnerável. Qualquer um é mais forte que eu, imagina muitas pessoas mais fortes que você te rondando. É um pesadelo.

- Quer levar alguma coisa para você?

Neguei. Ele suspirou.

Não falava muito, só ficava quieta observando tudo. Sentia que isso o frustrava, mas é melhor assim. Já me sinto um peso por ter que estar na sua casa. Se eu abrir a boca e dizer algo que vá magoa-lo, vou me sentir mais péssima.

Uma senhora deixa uma maçã cair no chão, pego para que ela não se abaixe, estendo a mão para que ela pegue, a manga do meu casaco desce, deixando a atadura exposta. A senhora não percebe, apenas sorri e me agradece. Meu tio surta.

- Por que você faz isso, meu amor? - ele me abraça, enquanto pergunta.

Não retribuo, seus braços longos e musculosos me apertam contra si, ele afaga meus cabelos e beija minha cabeça.

Me sinto constragida em passar por isso em um supermercado, mas não o interrompo, as vezes eu sinto que ele só quer me abraçar, mas eu sequer falo direito.

- Meu bem, Joe e eu te amamos tanto. Não precisa fazer isso. Eu sei que está sendo difícil, mas nós estamos aqui.

Errado.

Ninguém está aqui comigo, ninguém sabe como dói.

- Eu tô bem. - respondo, me soltando.

- Não está, Amber. - ele tira uma mecha no meu cabelo do meu rosto. - Promete que não vai mais fazer isso?

- Não.

Suspira.

- Então eu vou revistar seu quarto quando chegarmos. Tudo que possa te fazer mau eu vou tirar de lá.

Então me tire também, eu sou o que mais me faz mau.

(...)

- Isso corta? - Joe pergunta, ao me mostrar uma capa de cd.

- Não pergunte a ela, Joe. Ela vai dizer que não para ficar aqui. - meu tio o repreende.

- Mas essa menina não mente, é até engraçado.

- É verdade.

Eles são engraçados.

- Se eu quebrar posso me cortar com a ponta. - explico, Joe o encara como quem diz "eu falei", Adam revira os olhos.

Eles olham meu closet, meu banheiro, embaixo da cama, a mesa do computador, as fronhas dos travesseiros, embaixo do tapete e por último meu bolso.

- Três giletes, esse trabalho todo para encontramos só isso. - Joe conta.

- Ela não vai fazer mais nada agora.

- Não vai, Amber?

- Não sei. - dei de ombros.

Joe gargalhou, sua risada era engraçada, ele riu como se eu tivesse contado a melhor piada da história. Meu tio acabou acompanhando ele, me sentei na cama meio bagunçada por eles, e fiquei encarando os dois.

Eles faziam um belo casal.

Meu tio é loiro, tem os olhos claros e um ótimo tipo físico. Joe é um pouco mais alto que ele, tem a pele morena, olhos castanhos escuros, cabelos da mesma cor e um rosto perfeito de tão bonito.

Eles são felizes.

Ambos se amam muito. Isso é bonito.

- A sinceridade dela é uma das melhores coisas que eu já vi na vida. Você é ótima, meu bem. - Joe beija minha testa.

Continuo parada.

- Vou pedir o jantar, quando chegar te chamo. - tio Adam beija minha testa também, eles saem.

Depois de arrumar meu quarto, tomei banho e troquei o curativo.

Peguei no sono, acordei com meu tio me chamando para comer, mas não estava com fome.

No dia seguinte ele me levou até o doutor Parker novamente.

- Como se sente?

- Normal. - olhava para meus pés, enquanto ele me olhava.

- Aconteceu alguma coisa diferente desde a última vez que nos vimos?

- Mais ou menos.

- O que foi?

- Meu tio deve ter te falado. - encaro ele.

- A quanto tempo se corta?

- Três meses.

- Depois da morte dos seus pais. - deduz. Concordo. - Por quê?

Voltamos ao jogo de perguntas e respostas.

- A dor me acalma.

- Por que?

- Me concentro em outra coisa.

- Você pensa em quê, Amber?

- Em como minha vida é ruim. - me levanto, olho pela janela a chuva caindo de forma fraca. - Minha mente é como o oceano, pacífico, mas sempre se movimentando muito. Tenho medo de me afogar, ninguém está está prestando atenção no que acontece no meio do oceano. Não reparam nele por ter o nome de pacífico. Mas as tempestades também vão ali.

Parker fez mais algumas perguntas, as quais eu respondi com o menor número de palavras possível.

Ao sair da sua sala, pus meu fone de ouvido, mesmo sem tocar nada. Me destrai com meu tio me chamando e acabei esbarrando em alguém.

- Merda. Desculpa. - a voz rouca disse, enquanto segurava de forma firme meus finos braços.

Olhei seu peitoral largo, coberto por uma blusa preta, subi o olhar até seu rosto bonito e parcialmente preocupado, seus olhos castanhos olhavam meu rosto com atenção.

Nos ancaramos por alguns segundos, estávamos relativamente perto de mais para totais desconhecidos e suas mãos ainda seguravam meus braços.

- Amber, temos que ir, meu bem. - meu tio me chamou.

O estranho me soltou, sem dizer mais nada e me deu as costas, entrando na mesma sala que eu havia saído a alguns minutos atrás.

- Tudo bem?

Assenti.

Dormi a tarde toda. Sonhei com olhos castanhos e acordei assustada.

Levantei para fechar a janela, os gritos dos vizinhos estavam altos.

Estava prestes a fechar a cortina quando uma coisa me chamou atenção. Alguém, para falar a verdade.

O mesmo que me segurou no consultório do doutor Parker agora tinha um cigarro entre os dedos, ele gritava alguns palavrões para quem quer que estivesse dentro de casa, então, entrou dentro do carro que estava estacionado e saiu muito rápido.

Remember, I Love YouOnde histórias criam vida. Descubra agora