Bolsos Cheios, Coração Vazio

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A manhã de sexta feira chegou rápido demais para meu corpo cansado. O relógio já marcava uma da manhã quando me enfiei debaixo dos cobertores e saber que Malfoy e suas tramoias era a razão das minhas pálpebras pesadas apenas me fez querer empurrá-lo escada abaixo.

— Ugh, Mal, só porque dizem que isso aqui é um ninho de cobras não quer dizer que você tenha que aparentar ter dormido em um — Pansy franziu as sobrancelhas para mim enquanto subíamos as escadas para o Grande Salão. Não nego que eu estava mais desarrumada do que o costume, mas não era de Parkinson que eu iria ouvir isso. Mostrei os dentes para ela em algo que não era um sorriso e andei a passos largos em direção a mesa da Sonserina.

Meus olhos correram por toda a extensão de bancos até se focarem em um cabeça especifica. Uma bastante loira. Draco tinha Crabbe e Goyle sentados de cada lado, mas meu querido Blásio abriu imediatamente um espaço entre ele e Nott quando me viu, fazendo com que eu me sentasse cara a cara com Malfoy. Eu até poderia achar graça de sua boca aberta de choque se não estivesse tão predisposta a arrancar seus dentes.

— Aquele zelador é mesmo um incompetente — rosnou para mim. Lhe dei meu sorriso mais doce em resposta, juntando as mãos na minha frente e as deixando bastante expostas. Me dava um prazer perverso observar como ele as olhava de canto de olho, temeroso de piscar e perder algum movimento.

— Filch é um velho, Londres chove muito e, já que estamos falando de fatos óbvios sobre a vida e o mundo, vamos a esse: a única coisa no mundo em que você é bom é em fugir, covarde.

Sua única reação física foi os olhos estreitos, mas Draco Malfoy não era uma pessoa de quem eu sentia pena de invadir os pensamentos. A barreira tênue e provavelmente inconsciente que havia ali era ridícula comparada a que eu estava aprendendo a montar, noite após noite, com Snape. Anotei em um canto da minha mente que o garoto tinha um dom natural de oclumência inexplorado, e o guardei para mim. Era triste e vergonhoso como eu não havia errado em nada nas minhas convicções e nem mesmo precisei de invadi-lo.

Draco era apenas um menino rico com os bolsos muito cheios e o coração muito vazio. Vi a estúpida casa onde ele morava, a mansão grande demais para apenas três pessoas, fria demais, cheia de passados e deveres demais. Vi sua infância fria, seu crescimento assistido de perto, seus ensinamentos tortos sobre como o mundo funcionava pela voz ríspida e gelada do pai. O único calor que vinha dele era direcionado a sua mãe, a mulher quase tão loura quanto o filho, de olhos muito azuis. Mas o pequeno pedaço de coração que isso havia salvado não compensava todo o veneno e todo podridão em volta.

— Não se atreva a me chamar de covarde, Lewis — me respondeu devagar. — Eu nunca me rebaixaria ao nível de Potter, deveria saber disso.

— Oh, eu sempre soube que você não apareceria — larguei sua mente de lado, desgostosa com o cinza que era. — Mas isso não tem nada a ver com ele. Eu fico me perguntando se algum dia sua vida vai deixar de ser vazia o suficiente a ponto de ter que se esforçar tanto para tornar a dos outros infeliz.

— Minha vida é ótima — Draco rosnou para mim, o rosto de pedra perdendo a compostura. — Eu tenho uma mãe, um pai, uma casa e tudo que eu quiser. E você? Você não tem...

— Nada? — O interrompi enquanto batia meus dedos na mesa e mantinha uma sobrancelha arqueada. — Vai dizer que não tenho nada? Nem uma casa, nem uma família e nem dinheiro. Sim, Malfoy, não tenho mesmo nada disso. É apenas a minha realidade e não vai me ver chorar por isso. Quer tentar outra vez? Não? Ótimo — me levantei daquele lugar, apertando o ombro de Zabini em despedida. — Bom dia para você, Blás, e meus pêsames, mais uma vez.

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