e i g h t e e n

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ANABEL 🌙

No domingo minha tia acordou passando mal, bastante gripada, e acumulei tanta coisa da faculdade, que acabei apenas trocando algumas poucas mensagens com Jonathan, ao invés de ir até a clínica, mas na segunda, após ir a minha consulta com Dr. Anthony, lá estava eu para visita-lo, me sentindo mal por não ter ido no dia anterior. Estava extremamente ansiosa, estava em dias femininos difíceis, e o ciclo só reforça minha ansiedade, me deixando extremamente sensível a tudo.
E eu estava absorvendo o ar silencioso e o clima estranho após o enterro do Daniel no sábado. Ou talvez fosse impressão minha. Uma coisa costumeira de uma cidade tão pequena como a nossa com um pouco mais de quatro mil habitantes, é que mesmo que nem todos se conheçam, uma notícia de tragédia se espalha como fumaça, e se torna um grande assunto.

Então tudo ao redor parecia parte daquilo.

Cheguei no quinto andar da clínica, e me guiei até o banheiro para lavar minhas mãos, não vendo o Terry Crews genérico no corredor. É, eles queriam mesmo impedir Jonathan de aparecer no velório. Que horror.

Me aproximei da porta, e quando fiz menção de a abrir, um enfermeiro e uma enfermeira sairam lá de dentro, e me cumprimentaram com um aceno de cabeça. E como em um déjà vu, Jonathan olhou em minha direção, enquanto eu chegava na soleira da porta.

- Posso entrar? - Perguntei ao mesmo, e sempre com aquela sensação estranha de ansiedade no estômago.

- Pode. - Ele respondeu, e eu o fiz, fechando a porta em seguida.

Caminhei até ele, que me parecia tão abatido quanto no sábado, a diferença era a camisa azul clara que ele vestia e o soro que foi colocado na parte superior de sua mão.
Ele estava com o cabelo molhado levemente penteado pra trás, mesmo não estando muito perto, senti o cheiro gostoso da colonia masculina e de shampoo, possivelmente tinha acabado de tomar banho. O que era estranho, por ainda ser muito cedo.

- Como você está? - Perguntei mais perto. Olhando em volta, percebendo uma cadeira de rodas no canto da parede.

As coisas definitivamente não seriam fáceis.

- Inerte. - Respondeu, e eu ponderei sobre, eu sabia como era estar assim.
Você tem todas as possibilidades de se mover, mas está totalmente aprisionado a algo. Intacto, sem nunca se mover. No meu caso era a ansiedade. No dele, a perda.

- Para um objeto deixar a inércia, ele precisa de uma força exterior para se mover. - Falei o que me lembrei das aulas de física na escola, definitivamente era péssima na matéria, mas disso me lembrei por ter visto certa filosofia nisso.

- Não sou um objeto, então, se eu quiser me mover, vai ser com minhas próprias pernas, e te garanto, uma delas não está muito bem. - Respondeu em tom ameno, cansado e continuou. - Senta. - Maneou a cabeça apontando para a cadeira onde me sentei ontem. E eu o fiz.

- E você? Como está? - Se dirigiu a mim.

- Bem, na medida do possível.

- Há muitas variáveis em "na medida do possível".

- Na medida do possível é o classico mais ou menos. Diferente do seu bom humor no dia de hoje. - Comentei, ele estava bastante ranzinza, o que era compreensível.

- Nem eu estou me suportando. - Confessou.

- É normal Jonathan, você só tem que parar de se culpar sobre algo que você não tem controle. - Falei o que eu pensava. Era visível que além da dor da perda, da falta que o irmão iria fazer, ele estava se martirizando por isso.

Ele me olhou um tanto surpreso, creio que ele não esperava por isso.

- Não fiz nada pra evitar Anabel. E se tem algo que odeio mais que a impotencia, é a culpa por não ter feito. - Disse seco.

InérciaOnde histórias criam vida. Descubra agora