É quinta-feira e quando eu desço do carro na frente da escola vejo Eduardo entrando pelo portão, e para não me encontrar sozinho com ele, fico esperando minha mãe virar com o carro na esquina, apenas para ganhar tempo.
Vou andando e assim que entro no corredor da escola vejo que Gustavo e Jeferson prenderam Eduardo contra a parede e estão falando algo que não consigo escutar a essa distância. Começo a apressar meu passo em direção a eles e antes de alcançá-los, eu digo:
— Solta ele agora, seus babacas!
Os três garotos viram a cabeça olhando em minha direção. Gustavo e Jeferson me encaram com expressões de deboche; e Eduardo parece assustado.
— E o que você vai fazer se eu não soltar? — Gustavo fala — Vai me bater com a bengalinha de novo?
— Ou vai nos enfrentar no mano a mano? — Jeferson diz e solta uma gargalhada, como se fosse impossível eu brigar com eles.
O que sinceramente é impossível sim. Eu provavelmente teria um enfarte com a aceleração do meu coração antes que pudesse sequer dar um tapa em um deles.
Me aproximo um pouco mais deles, estou a menos de um metro de distância, e com a cara fechada eu digo:
— Eu fui atropelado por um caminhão e ainda estou aqui de pé, vocês acham que podem ser mais fortes do que isso?
Eles ficam um segundo em silêncio, me encarando. Então soltam a blusa de Eduardo e saem andando, sem falar nada.
— Você não precisava fazer isso! — Ele disse, passando a mão sobre a blusa do uniforme da escola.
— Ah, claro, eu podia ter passado direto e te deixar apanhando. — A adrenalina deve estar correndo louca pelo meu corpo para que eu consiga ser sarcástico.
E então rola um segundo de silêncio constrangedor. Eu estou quase me virando e saindo andando sozinho em direção a nossa sala.
— Eu pensei sobre o que você me falou ontem. — Ele diz, e eu o encaro. — Não foi sua culpa eu ter me machucado, eu que fui o descuidado e... Eu não vou pedir para que você saia do grupo, não seria justo.
— Obrigado, Eduardo!
— Quando eu tinha oito anos, meus pais decidiram se separar. — Ele começa a me contar. — Foi minha mãe que saiu de casa, ela disse que nada mudaria entre nós, mas pouco tempo depois ela se mudou para o Japão e as únicas notícias que tenho dela são quando olho seus stories no Instagram ou quando ela me manda algum presente. Desde então eu tenho tido problema para lidar com mudanças, eu sempre penso que qualquer coisa diferente vai acabar com tudo o de especial que eu tenho em minha vida.
— Quando você me chamou para fazer parte do grupo naquele dia na sala, você estava se esforçando para tentar algo diferente, não é?! — Questiono, me lembrando de como ele parecia incomodado no meu primeiro dia na escola.
— Estava. A minha psicóloga diz que eu nunca vou saber as consequências das mudanças se nunca tentar fazer algo diferente. — Ele respira fundo e abre um sorriso envergonhado. — Parece que eu me abri demais para você.
Sorrio para ele e olho para os colegas que passam pelo corredor e ficam nos encarando.
— Então eu vou nos deixar quites. — Digo voltando a olhar para ele. — Quando eu tinha cinco anos o meu pai decidiu que não nasceu para ser pai e foi embora de casa. A única lembrança que tenho dele é a bolsa em suas costas enquanto ele saía andando para fora. O meu segundo nome, Antônio, foi dado em homenagem a ele, e é por isso que eu o odeio e prefiro ser chamado de José.
— Isso faz bastante sentido. — Eduardo diz e eu sorrio.
— Mas o meu primeiro nome é uma homenagem para o meu avô, e o meu tio também tem o mesmo nome, apesar de preferir ser chamado de Carlos. — Nessa hora me lembro que quando eu era criança e descobri que o nome do meu tio é José Carlos, eu fiquei totalmente chocado. — No fim, depois que o meu pai biológico foi embora, eu acabei tendo dois pais: o meu avô e o meu tio. Então eu acho que algumas mudanças em nossas vidas podem realmente ser ruins, mas o quão maravilhosas podem ser as boas consequências?
— A gente nunca descobriria se nada mudasse. — Ele diz e abre um sorriso realmente enorme.
Começamos a andar em direção a nossa sala, o corredor já está ficando vazio.
— Ei, quase ia esquecendo. — Ele fala.— Os NERDS não são os meus amigos, eles são os nossos amigos. Nós somos os seus amigos, assim como você é nosso!
— Acho que essa é uma das coisas mais bonitas que já me disseram! — Digo sorrindo, e embora possa parecer brincadeira até mesmo para mim, sinto que é realmente verdade.
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José e os NERDS Contra o Mundo
Teen FictionJosé nunca assistiu Star Wars. Os NERDS nunca entraram em um campo de futebol. E mesmo assim uma grande amizade está prestes a começar. Há exatos três anos e seis meses atrás, José sofreu um acidente que o deixou em coma dos 17 aos 20 anos. Ao acord...