É sexta-feira e eu estou no caixa passando um troco para um cliente quando Pedro me diz:
— Ei, vou pegar uns copos descartáveis lá no fundo, você me cobre por uns minutos?
— Claro!
Saio do caixa e vou ficar no balcão. A maioria dos nossos clientes são mais velhos, na casa dos 40 para cima — os NERDS se destacam bastante quando vêm aqui — então eu acho mega estranho quando esse cara de mais ou menos 25 anos entra no Café e caminha até o balcão.
— Boa tarde! — Digo sorrindo para ele.
— Boa tarde. — Ele diz sorrindo. O cara é realmente bonito, alto, negro, cabelo raspado. — Você é o único atendente aqui?
— Não, meu colego precisou ir lá no fundo, mas...
— Você quer saber porque eu perguntei isso não é?! — Ele diz rindo e eu assinto com a cabeça, sorrindo também. — Desculpa, eu sou meio lerdo, ás vezes.
— Eu sou quase sempre, então não te julgo.
A gente fica uns dois segundos em silêncio, se encarando, e eu fico com vergonha de perguntar o motivo dele querer saber se há outro atendente, então pergunto:
— Então, o que você gostaria de pedir?
— Ah, eu não... — Ele começa a falar, mas é interrompido por Pedro que abre a porta carregando uma caixa de papel grande.
— Não acredito que a gente guardou os copos debaixo da caixa de café! — Ele e coloca a caixa no chão, então se vira e fecha a cara, olhando para o cara em minha frente. — Marcos? O que você tá fazendo aqui?
— Eu queria conversar com você! — Marcos responde.
— Eu estou trabalhando.
— Vai ser rápido, por favor!
Sinto que há uma leve tensão entre os dois e me sinto envergonhado por estar assistindo tudo tão de perto, então me viro e começo a andar em direção ao caixa.
— José! — Pedro diz, eu paro e volto a me virar para ele. — Será que você pode ficar aqui mais um pouco?
— Claro!
— Obrigado, cara! — Marcos diz para mim.
Pedro rapidamente tira o avental e o deixa encima do balcão, acompanhando Marcos para fora do Café.
Pelo vidro da porta consigo ver os dois conversando, um de frente para o outro. Marcos segura a mão de Pedro enquanto fala e eu logo suponho que ele seja o cara com quem está saindo.
Sinto que estou assistindo a uma novela mexicana quando Pedro solta a mão de Marcos, coloca as duas mãos sobre seus ombros e conversa o olhando nos olhos. Quando Pedro o solta, os dois se abraçam e então Marcos vai embora.
Pedro volta para dentro e eu fico o encarando enquanto coloca o avental de volta.
— Está tudo bem? — Eu pergunto, porque ele está com a expressão séria.
— Está sim.
Rola um segundo de silêncio constrangedor e eu decido voltar ao meu lugar.
Minutos depois não estou aguentando o silêncio entre nós dois e decido puxar papo.
— Então, aquele é o famoso carinha?
NÃO ACREDITO que eu deixei que essa frase escapasse da minha boca. Era para eu perguntar sobre como anda a faculdade, ou então sobre seus amigos. Ou melhor, sobre como um bolo vegano é feito. Por que eu tinha que falar sem pensar antes?
— Famoso? — Ele solta um risinho. — Sim, era com ele que eu estava saindo.
Se antes ele não tinha minha total atenção, agora ela é toda dele.
— Estava? — Questiono.
Ele respira fundo e abaixa a cabeça. Pela primeira vez desde que voltei a me encontrar com Pedro percebo que ele está envergonhado.
— Sim, eu decidi que não podia mais sair com o Marcos porque estou interessado em outra pessoa.
Puxa vida.
— Oh, então tem mais um na equação. — Concluo em voz alta. Por que eu preciso dizer isso em voz alta? — Pelo visto eu não tinha mesmo chance.
Alguém precisa aparecer e me dar um tiro no meio da testa. Por que eu não consigo segurar o que estou falando?
— O quê? — Ele fala me encarando. — O que você acha, que eu saio com um monte de caras?
Ele parece meio estressado.
— É você quem tá falando...
— Eu disse que estou interessado por outra pessoa, não que há um terceiro cara.
— Eu não estou entendendo.
— É você José. Eu gosto de você!
Ele meio que fala isso alto demais e um casal de idosos em uma mesa próxima ao balcão se vira sorrindo.
Sinto meu coração se acelerando e eu saio do caixa e ando até o balcão, ficando em sua frente.
— Eu não estou entendendo nada, aquele dia você... — Começo a falar, mas ele me interrompe novamente.
— Naquele dia eu realmente estava saindo com o Marcos — ele começa a explicar. — Mas depois eu percebi que também gosto de você, então eu decidi terminar com ele. Hoje ele veio conversar, mas eu disse que não tem como a gente voltar.
— Espera aí, você também gosta de mim? E não pretendia me contar isso?
— Eu não sei! Não queria que você achasse que eu penso que posso tê-lo quando quiser.
Solto um riso e seguro em sua mão.
— Mas você pode.
Ele sorri de volta para mim, e embora eu queira o beijá-lo, não faço isso porque os clientes estão nos olhando; então apenas aperto sua mão e volto para o meu lugar.
Ás 18hrs em ponto Pedro fecha o Café da Neide e ficamos olhando enquanto nossos colegas de trabalho caminham juntos em direção ao ponto de ônibus.
— Então... — eu digo e me viro ficando de frente para ele.
— Será que eu posso te beijar agora? — Ele pergunta.
— Claro que pode!
Eu sou um pouco mais alto que ele, então Pedro precisa esticar o pescoço. Eu envolvo em meus braços quando ele abraça minha cintura e o puxo para junto do meu corpo, o beijando como se não fizesse isso há anos — o que eu realmente não fiz.
— Eu vou acabar me atrasando para ir para a faculdade. — Ele diz alguns minutos depois, sorrindo para mim.
— Os NERDS vão ficar se perguntando sobre a minha demora. — Eu digo sorrindo.
E continuamos a nos beijar até que meu telefone começa a vibrar com as mensagens dos garotos.
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José e os NERDS Contra o Mundo
Teen FictionJosé nunca assistiu Star Wars. Os NERDS nunca entraram em um campo de futebol. E mesmo assim uma grande amizade está prestes a começar. Há exatos três anos e seis meses atrás, José sofreu um acidente que o deixou em coma dos 17 aos 20 anos. Ao acord...