Capítulo 10

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Uma noite?

Anna

Todo adolescente já passou por algo vergonhoso em algum momento da vida. É comum de a raça humana escorregar em lugar público, tropeçar em ruas movimentadas, responder alguém que não está falando com você. Provavelmente você já passou por pelo menos um desses casos. Eu não sou diferente do resto da humanidade e, geralmente, faço coisas piores, como dar em cima de um cara gay e depois levar um fora. Isso não é só vergonhoso, é completamente traumatizante.

Henri me olhava com cara de dúvida, seus olhos verdes estavam ainda mais claros e sua pele perdeu o brilho, estava pálida como cera. Apesar do sorriso que estampava se rosto, seus olhos demonstravam medo. As sobrancelhas estavam arqueadas, os olhos arregalados, suas pálpebras tremiam levemente.

— Está tudo bem? — Ele perguntou e sua sobrancelha direita tremeu.

Sorri exageradamente, apesar da vergonha, eu estava bem. Não fazia menor diferença se ele gostava de meninos ou de meninas, eu só não poderia beijá-lo como gostaria. Balancei a cabeça em sinal positivo, mas ele não pareceu acreditar. Sua boca a se fechou em uma linha fina, e Henri baixou a cabeça.

Eu precisava mostrar a ele que tudo estava bem, que nós estávamos bem e que continuaríamos assim, não seria esse pequeno detalhe que mudaria a nossa relação. Muito pelo contrário. Meu cérebro já estava pensando em quem eu poderia apresentar a Henri, assim que as aulas começassem.

— Não me leve a mal, eu não queria mentir para você, eu só...

— Você não mentiu. — Interrompi-o. — Você não me deve explicações Henri, além do mais, sua orientação sexual não é algo para se desculpar.

Henrique sorriu como se eu tivesse tirado um peso de suas costas, mas aquela leveza não durou muito, de um segundo para outro seu olhar passou de quase felicidade para completa dor e tristeza. Era tão devastador que eu podia sentir. Algo não parecia certo.

— Está tudo bem? — Foi a minha vez de questionar. Eu precisava tentar diminuir o peso de suas costas. — Tem algo mais que queira me contar?

— Posso mesmo? — O louro incrivelmente gato levantou a cabeça e me olhou nos olhos, como se buscasse uma âncora. — Ou é só mais uma daquelas perguntas retóricas.

Olhei feio para ele, estava incrivelmente magoada, que tipo de pessoa ele acha que eu sou? Segurei sua mão direita, a mais próxima, e embalei entre as minhas mãos. Era a minha vez de olhar em seus olhos.

— Fale antes que eu arranque a sua língua e a obrigue a me contar. — Sorri de forma doce.

Henri gargalhou e soltou a minha mão. Era óbvio que eu não arrancaria a sua língua, eu não tinha força nem estômago para isso, mas a ameaça cômica deu certo. Henri abriu a boca, como se buscasse as palavras certas. Seus olhar me atravessa, ele olhava para a janela do ônibus como se as paisagens que passavam fossem as cenas de sua longa e triste história. Ele voltou a me encarar, então começou.

— Algumas pessoas dizem que gay se transformam, seja por influência das pessoas ou, como no caso dos meus pais, por influência de forças malignas.

Aquelas primeiras palavras já foram suficientes para eu entender a dor que ele sentia. Eu não fazia ideia do tamanho, do quão magoado ele estava, mas eu sabia que doía, sabia que havia algo que o estava machucando, que estava perfurando a sua alma.

— Eu sempre soube que gostava de garotos. Desde pequeno, desde que tive consciente dos meus desejos sexuais, mas antes do desejo sexual eu já me sentia diferente. Era óbvio para mim, mas não era para os meus pais. Eles me enxergavam como o garoto tímido e introvertido. — Ele fez uma parada rápida, em busca de oxigênio. — Mas a minha timidez excessiva começou a confundi-los com o dom para padre. Assim como meu tio, meu pai sonhava em ser padre, até que conheceu minha mãe na missa e eles se apaixonaram. Quando eu completei dezesseis anos e não apareci com uma namorada, eles surgiram com a ideia absurda.

O Amor dos Meus SonhosOnde histórias criam vida. Descubra agora