Senhora Carvajal

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Tudo que é bom chega ao fim. E essa história não poderia ser diferente. Aproveitem os últimos momentos.

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O silêncio é uma coisa pouco valorizada. Raros os ambientes e momentos em que podemos falar que o silêncio é o único som que nos envolve. Me lembro de algumas poucas situações como estar no meio do mato e ouvir pequenos insetos, o que não é o silêncio total, mas é o que consideramos um ambiente pacífico. Também nas madrugadas de insônia em que acordamos e vemos o nascer do sol sem querer e pensamos "porque não acordo sempre para ver esse momento tão especial"? Mas ai lembramos que temos uma coisa chamada vida para viver, temos que acordar, fazer o café, nos arrumar para então seguir as tarefas do dia. Mas o silêncio que eu me lembro que sempre será o mais marcante é o da morte. Infelizmente eu vivi esse silêncio. E não foi apenas uma vez, mas algumas e todas com uma consequência possível: a perda do meu grande amor.

Parece piegas que a minha vida gire em torno de uma pessoa e que eu considero que essa pessoa não seja eu. Valentina é a razão que eu vivo a minha vida, o motivo que construí a minha história. Com ela eu me descobri, eu vivi, eu morri. É tão louco pensar no nosso passado, que ainda se faz presente todos os dias nas nossas marcas, pois ele é assustadoramente real. Parece que foi tirado de um filme de drama de péssima categoria. Duvido que haja um casal que tenha chorado mais que nós duas. Tá ai uma boa aposta para fazer.

O silêncio e as lágrimas marcaram vários momentos da gente. Tanto das nossas vidas sozinhas, quanto da nossa vida em conjunto. Mas parece que a cada instante desde que nossos sangues foram compartilhados, o drama dava espaço a outro gênero do cinema, algo que não sabíamos ainda como manejar direito, já que se debulhar em choro com novidades pessimistas sempre foi a nossa realidade. Agora o que marcava o dia a dia era o barulho constante, vozes altas e gargalhadas frouxas.

Tínhamos meses de embate onde afinal iria ser o casamento. Eu queria um ambiente controlado, algo pequeno, com teto. A minha intenção era finalizar o casamento e seguir para o que importava: a lua de mel e a vida pós casamento. A cerimônia pra mim nunca foi a coisa mais importante, mas como todos sabem, eu sou uma banana quando se trata das vontades de Valentina. Eu posso tentar negar no começo, argumentar tudo o que eu conseguir, mas ela sempre vai ganhar porque ela me tem na palma da mão, e o pior é que ela sabe disso. Então, depois de muita negociação, ela teria o casamento que ela imaginou pra nós duas.

- Hija, tudo certo com o bufê? – minha mãe, dona Lupe, era a segunda mais empolgada com a cerimônia.

- Mama, já disse que sim. Está tudo certo. Também não é para um batalhão de gente. Acho que não tem muito como dar errado.

- Juliana, vira essa boca pra lá. Nem pensa em coisa negativa.

- Eu não estou pensando, mas você sabe que eu sou realista. Casar na praia já é aventura suficiente.

- Vocês checaram a previsão, né?

- A previsão do tempo está óti......

Não me deu nem tempo de finalizar a palavra. Vi uma Valentina destrambelhada correndo do quarto para a sala dando gritos e com uma cara de pavor no rosto. Já pensei o pior e me pus na posição "Juliana ao resgate".

- Val, pelo amor de Deus, o que houve? Para de gritar e me fala! – eu corri para segura-la e minha mãe vinha logo atrás. Mas ela não parava de gritar histérica. – Valentina, para e me ouve. Respira. Por favor. – ela então foi se acalmando e voltando a si, diminuindo sua respiração em encarando.

- Juls, você vai me matar.

- Val, não sei do que você tá falando, mas se até agora eu não matei, acho difícil que isso aconteça. A não ser que você tenha feito algo muito sério e isso envolta assassinato de um cachorro ou fazer plástica, que eu já disse que você não precisa. – falei essa frase rindo, pois uma vez ela cogitou falar mal do corpo, dizendo que queria colocar peito. Eu quase surtei e falei que se ela mexesse em algo daquele corpo estrutural eu terminaria com ela.

O que ficou pra trásOnde histórias criam vida. Descubra agora