Dedico à duas pessoas esse capítulo. Elas sabem quem elas são!
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A gente sempre ouve que a nossa vida passa como um flash quando estamos em uma situação de perigo, de medo, ou de enfrentamento ao desconhecido. Não concordo. O que me acontecia naquele momento em que estava ao lado de Valentina desacordada era de pura lentidão. Eu relembrava detalhes de momentos vividos ao lado dela, como se estivesse os revivendo. Lembrei do primeiro toque na pele que senti quando a vi pela primeira vez. Naquele momento em que descobrimos que com apenas um olhar, nosso mundo se transformara. Seus dedos longos seguravam as minhas costas e cabeça. Poderia ser um episódio ridículo se não fosse com ela, mas nunca pensei assim, apesar de ter desmaiado só de vê-la. Senti novamente as borboletas na barriga que estavam presentes no nosso primeiro beijo, aquele sentadas na escada da minha casa, já sabendo que nossa história não seria comum. Todos os dias que se seguiram de distância física, mas nunca uma real do coração, já que ele sempre foi tomado por aquele azul cintilante que me fazia ter episódios neuróticos, literalmente.
Eu sempre pertenci a ela e ela a mim. Nossos corpos nunca estavam totalmente confortáveis se não estivessem na presença do calor uma da outra. Eu poderia jurar que sabia que ela estava chegando em casa apenas por sentir um arrepio pelo meu corpo inteiro. Na época em que a conheci, não entendia o motivo dos meus pelos ficarem alerta apenas por ter a desconfiança de que ela me observava. Era um pouco assustador, mas em sua maioria, era um sentimento de acolhimento e de uma felicidade que eu ainda não havia tido antes.
Enquanto aguardava alguma resposta médica, tanto do Dr. Ricardo sobre meu sangue, quanto dos médicos plantonistas que atendiam a Val, eu acariciava seu braço relembrando o instante definitivo em que fui sua. Aquela noite, naquele carro. A intensidade de tudo que nos cercava. O cheiro do verde, o barulho da água, o suor da pele, os gemidos dos lábios, o amor no olhar. Como aquilo poderia ser finito? Nunca seria na minha mente e na lembrança que meu corpo guardava, mas e se eu nunca mais a sentisse em mim? Aquilo não poderia ser a realidade. Lutamos tanto para ficarmos juntas enfim. Contra o preconceito, contra nossas famílias insanas, contra o passado doloroso, contra nós mesmas. Eu me sentia inútil ali, ao seu lado, sem poder dizer a ela: sou eu amor. Sou eu de fato a sua cura. Essa constatação era apenas um sonho desenhado em nossas esperanças por falas soltas principalmente de um pai alucinado.
Fui tirada do meu transe com a entrada de uma junta médica. O caso de Val era estudado a cada segundo, pois ninguém nunca tinha visto algo parecido. E mal sabiam eles do nosso passado enlouquecedor. Nossas células em ebulição apenas com um olhar. Isso sim seria um caso ganhador de prêmio. Enquanto eles analisavam a ficha, debatiam entre si como diminuir a velocidade dos danos no corpo de Valentina, eu apenas observava seus cenhos sérios, sem muita afeição nem por mim nem pela paciente. Para eles, um caso a ser estudado minuciosamente, para mim, um possível fim. Uma enfermeira entra na sala me chamando para atender a uma ligação. Achei estranho, mas a acompanhei.
- Alô?
- Senhorita Valdés? – uma voz com sotaque inglês estava do outro lado da linha.
- Sim. Sou eu.
- Meu nome é James Smith, sou doctor from Canada. Você entrou em contato with us about Sangue Dourado. – seria cômico se não fosse trágico.
- Sim. Boa tarde. Alguma novidade?
- Sim! Temos um possível match para sua girlfriend.
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O que ficou pra trás
FanfictionSabe quando a gente acha que tá pronto pra seguir em frente? Que o que passou ficou no passado e não nos afeta mais? Que quem um dia foi importante, hoje é apenas a sombra de uma antiga realidade? Então, esquece. Quando o tempo não importa, passado...