CAPÍTULO 5

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Mesmo assim, Julian era um homem como outro qualquer, com as mesmas necessidades. Seu trabalho, todavia, pedia discrição. Ele dava um jeito nisso tendo um número de amigas que lhe acompanhavam aos diversos eventos que seu título o obrigava a comparecer.  Ao espalhar a atenção, ninguém - mulheres ou a imprensa - criava expectativas.
Ele presumia que a reputação de ser frio impedia que ele fosse tachado de playboy.  Katrina ameaçava esse distanciamento dele. A atração dele pela beleza estonteante dela o deixava
ainda mais irritado com toda a situação. Assim como a inteligência que ele encontrara nos olhos violeta dela.   Ela lhe pareceu esperta demais para ter cometido aquele deslize. O que ela estava pensando?
Choque, imaginou ele. Mas isso não era uma desculpa, não na posição dela.   A porta se abriu e Katrina veio descalça para a sala. Ela usava um roupão rosa que chegava à altura das unhas pintadas na mesma cor. Sob o roupão havia uma camisola de seda com um longo V na
frente. Ele não pôde deixar de reparar no cálido colo dela, visível pelo decote. Ela era tão pálida que havia pouca diferença entre a pele e a brancura da seda.

- Sammy está bem? - perguntou ela com uma voz rouca de sono, com o cenho franzido de
preocupação. - Você ligou para o médico?

- O problema não é a concussão - garantiu Julian, sua brusquidão mais para o benefício dele do que
dela. - Tessa o acordou como lhe foi instruído, mas ele não quer voltar a dormir.  Agora ele reparava em como Katrina era pequena, claramente não tinha mais do que 1,65m. Com 1,89m, ele avultava sobre ela. O roupão imenso não ajudava, e tampouco o cabelo preso em uma trança, nas costas. Sem maquiagem, a pele dela parecia impressionantemente branca em comparação
com a cor vibrante de seu cabelo.

- Vamos? - Ela deu um passo adiante, cambaleando de leve.
Ele rangeu os dentes, tentado a mandá-la voltar para a cama, e mais tentado ainda a juntar-se a ela.  Ele afastou o pensamento inapropriado. As necessidades de Samson eram as suas prioridades.

- Onde estão seus sapatos? - quis saber ele, focando no lado prático. Ela franziu a testa de novo, como se precisasse fazer esforço para pensar. Ele lembrou que ela também levara uma pancada na cabeça.

- Vou pegá-los. - A empregada desapareceu no quarto e voltou minutos depois com um par de
chinelos felpudos. Katrina calçou-os, suas unhas cor-de-rosa destacando-se na extremidade.
Ela esfregou a testa.
- O senhor deseja que eu me troque?

Sim. Havia algo íntimo demais em vê-la de roupão e camisola
-Não. - Novamente ele pensou em Samson. - Vamos.

Ele a seguiu para fora dos aposentos, e surpreendeu-se quando a empregada também foi junto.

- Tudo bem, Anna. Obrigado por me vigiar. Pode ir, agora.

- Oh, mas estou seguindo ordens médicas - protestou a jovem.

Irritado pelo atraso, Julian tentou segurar a impaciência ao falar com a moça:
- Quais foram suas instruções? Eu cuidarei dela pelo resto da noite.

Claramente contrariada, Anna repassou as instruções:
- É preciso acordá-la de hora em hora e fazer perguntas para ter certeza se ela está raciocinando com coerência. Se não, ou se você perceber algo de estranho nas pupilas dela, ou se ela passar mal, é preciso chamar o médico imediatamente.

Ele automaticamente olhou nos olhos de Katrina para checar as pupilas, e descobriu-se perdido nas profundezas daquele olhar. Piscando, ele voltou-se para a empregada e a mandou embora. Katrina seguiu adiante, na frente dele.  As ações dela o fizeram franzir o cenho. O protocolo exigia que ela o seguisse. Suspirando, ele decidiu dar um tempo a ela; afinal, ela sofrera uma concussão. Entretanto, não lhe escapou à atenção
que ela parecia conhecer o caminho.  Ocorreu-lhe então que talvez ela o tivesse colocado para dormir, e ele não gostaria que isso tivesse  acontecido. Ele confiara o menino a Tessa, e deixara isso bem claro.
A autoridade dele já estava sendo prejudicada.  Algo que ele não conseguia tolerar.

- Mademoiselle... - Droga. Qual era o nome dela? Ele rapidamente se aproximou dela. - ...eu gostaria de esclarecer algumas coisas. Agradeço sua ajuda com Samson. Mas isso não significa que vou aceitar interferência em minhas decisões relativas aos cuidados dele.

- Claro - respondeu ela pressionando o botão para chamar o elevador.

- Está zombando de mim? - intimou ele.

Ela piscou os imensos olhos violeta para ele, fazendo com que Julian sentisse como se estivesse
castigando alguém inocente.

- Não - disse ela, e entrou no elevador. Ela fechou melhor o roupão. - Sei que você quer o que é melhor para ele. - Um sorriso fraco moveu o canto da boca dela. - Do contrário eu não estaria aqui, agora.

Ele procurou na expressão dela algum traço de astúcia, mas encontrou apenas evidências da
exaustão. Ela parecia tão frágil que ele pensou em mandá-la de volta para a cama. Apenas o sofrimento de Samson manteve a resolução dele.

- Excelente. - A porta do elevador se abriu e ele fez um gesto para ela sair.  Eles caminharam em silêncio pelo corredor, o que tornou ainda mais exasperante o choro de Samson que vinha do quarto dele.   Na suíte, lágrimas manchavam o rosto de Tessa e de Samson. A babá estava tentando ninar o menino, e ao ver Katrina, ela começou a soluçar.

- Não aguento mais. - Ela colocou o bebê nos braços de Katrina e foi embora. Katrina não hesitou. Ela aninhou Samson e começou a falar com ele.

- Ei, mocinho, está tudo bem. Estou aqui. A sua cabeça está doendo? - Ela beijou os cachinhos dele.  - A minha também.
Ele continuou a chorar, mas era inegável que Samson preferia a ruiva à morena. Ao invés de tentar se afastar do corpo dela com os braços e as pernas, ele se agarrou à figura exuberante de Katrina.   Julian achou a cena muito dolorosa de assistir, pois talvez aquele fosse apenas o começo do martírio de seu sobrinho. Por isso ele foi até a lareira e começou a preparar o fogo. Aquela ia ser uma longa
noite.

KATRINA CONTINUOU ninando Sammy até o choro dele começar a diminuir e ele se acomodar em seus braços. Ela usou o colarinho do roupão para limpar as pálidas bochechas dele. O coitadinho tinha uma jornada dura pela frente. Mesmo sendo otimista, ela precisava admitir que as chances dos pais dele
terem sobrevivido à queda e às condições climáticas eram mínimas

A Arte Da Paixão (Arlequin ) Onde histórias criam vida. Descubra agora