Kristine, 13.

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Sexta-Feira, 23:34.

    Se você já tentou dormir com algo incomodando seu juízo, sabe que é impossível.

    Nem mesmo as músicas mais agitadas são capazes de transportar as preocupações para o inferno, e nem mesmo as séries mais empolgantes conseguem te fazer imergir num mundo paralelo, longe das aflições. Tentei diversas táticas, inclusive cheguei a baixar um livro tosco de romance para ler no kindle, mas minha concentração estava altamente afetada e nada resolvia. Na verdade, a única solução para tudo era voltar no tempo para cortar diversos males pela raiz.

    Se fosse possível, eu não teria cumprimentado o rapaz loiro que esbarrou em mim na barraca de doces, e, consequentemente, não teria sofrido uma tentativa de asfixia meses depois. Também não teria aceitado o beijo de um asiático embriagado na piscina, imediatamente após um evento traumático, e evitaria decepções que me abraçariam logo em seguida. Mas acima de tudo, tudo mesmo, não obedeceria ao pedido de minha mãe para descer naquela noite, pois assim eu me livraria de ter me apaixonado por ele.

    Pelo menos, divagando sobre todas as coisas que aconteceram, decidi que não haviam motivos para chorar sobre um dos ocorridos bizarros da semana: meu envolvimento com Aaron. Ter ficado com ele não era uma vergonha, e apesar de ter feito sob efeito de drogas  o que me arrependo , eu não devia explicações a ninguém justamente por estar solteira. Ele era um cara legal, fazia meu gênero e não me desrespeitou em momento algum, buscando até mesmo limpar sua imagem no outro dia. Quando tirei essa conclusão, senti um peso imenso abandonando meus ombros, e tive um pouco mais de coragem para seguir resolvendo o que ainda me atingia.

    Ainda assim, era difícil pegar no sono.

    Meus amigos estavam ausentes, meu polegar já estava cansado de rolar o feed do Instagram, e as receitas do Tastemade deixaram meu estômago roncando desconfortavelmente. Olhar para o teto ou abandonar o celular me forçaria a pensar demais, piorando meu quadro, e levantar para inventar alguma distração aniquilaria de vez as chances de dormir, o que seria terrível. Quando a gente começa a crescer, o interesse pelas noites viradas em claro simplesmente desaparece, dando lugar a um amor indescritível por bons descansos. 

    Dessa forma, a última opção que me restava era jogar um pouco. Eu poderia começar a construção de uma nova casa, dar uma repaginada nos meus antigos lotes e, com sorte, encontrar KinyX para bater um papo sem compromisso. É claro que este não era o melhor método para me fazer dormir, mas era o melhor para me tirar desse mundo por uns instantes. Era disso que eu precisava, de fato.

    Então, deslizando o dedo pela tela, alcancei o ícone e abri minha fonte de diversão, que sempre me salvava dos piores dias com facilidade.

    O ambiente virtual, composto por seus milhares de pixels e códigos, me trazia a sensação de acolhimento que poucos locais me ofereciam. Escolher entre participar de uma festa ou aprender coisas novas sobre informática no Youtube era bem fácil para mim, e é importante ressaltar que minha alternativa predileta nunca mudava. No entanto, como nem só de estudos e jogos vive a mulher, preciso admitir que eu também me entretinha com discussões banais em fóruns  leia-se debates a respeito do fim do mundo, casos sobrenaturais e crimes sem soluções. O paraíso estava a um clique de distância, então por que perder tempo com o realidade, que só servia para decepcionar?

    E foi durante essa reflexão que as luzes coloridas surgiram na tela, revelando o menu principal e meu tão antigo e amado perfil. Em outras ocasiões, meu inconsciente conduziria meus movimentos em direção à listagem de lotes construídos, onde aproximadamente 17 salas aguardavam pela minha atenção, mas eu tinha outras prioridades no momento. Provavelmente, desde o instante em que decidi entrar naquele universo, eu já tinha sido influenciada pelas minhas motivações involuntárias.

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