Hayato, 9.

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Quarta-feira, 9:30 P.M. - Restaurante El Cabrón

    Nem mesmo os nachos em nossa mesa conseguiram ser tão lindos quanto ela em seu melhor vestido, e nem mesmo aqueles 600 ml de cerveja me deixaram tão louco quanto seu perfume de morangos e champanhe. À propósito, ninguém fica bêbado com uma garrafa só o que é muito decepcionante, já que seria ótimo se embriagar gastando pouco, mas o ser humano sofre para nascer e nasce para sofrer, está em nosso DNA.

    Aí vai uma frase do tiozão que acorda na manhã de natal, numa ressaca desgraçada, cismando que sonhou com um macaco e precisa jogar no bicho porque "dessa vez vai": eu bebo pra ficar ruim, se fosse pra ficar bom eu tomava remédio.

    E com essa belíssima filosofia de vida, inicio mais uma narrativa super empolgante sobre meu abençoado meio de semana, que, sem saber, estava me preparando aos poucos para situações desconcertantes. Olha eu, me coçando para soltar spoiler.

    Nosso jantar se desenrolara ao som de músicas mexicanas, tocadas por mariachis animados e cheios de gás, enquanto nossas línguas se exaltaram com o sabor apimentado das deliciosas iguarias. Eu havia dito que preferia o Pérola Negra, restaurante temático no estilo pirata, mas ela estava alucinada por burritos, tacos e nachos. Sua opinião nunca vai valer mais do que a de uma mulher faminta e decidida, entenda isto e será bem sucedido.

      — Vamos, mi amor Perguntou, retirando o sombrero colorido em sua cabeça.

      — Si señora Respondi, concordando.  Uma pena ter tirado o chapéu, estava fabulosa.

    E realmente estava. Os longos cabelos foram deixados soltos, descendo em leves ondas até abaixo dos fartos seios, iluminados pelas lâmpadas amareladas que os faziam ficar ainda mais encantadores. A maquiagem leve servia para ressaltar seus mais belos traços, e ainda que ela não precisasse de nada disso para alcançar a perfeição, não posso negar que lhe caiu muito bem. Eu me sentia como uma criança que torce o nariz para um prato requintadíssimo, porque possui o paladar infantil: alguém que não sente prazer em comer coisas de qualidade. Se bem que o sabor que eu mais desejava provar era de primeira linha também.

    Em resumo, tive o prazer de jantar com uma verdadeira estrela de Hollywood, que exibia seu sorriso continuamente para expressar a felicidade que tomava conta de si. Diversos homens a observaram, sem se atentarem ao fato de que já estava acompanhada do cara mais bonito do universo, e percebi que eu era mesmo um puta sortudo. Tudo o que pedi aos céus se materializara diante de mim, equilibrada com maestria em sapatos de salto alto, exalando afeição e cuidado com alguém que só lhe dava decepções.

    Ela sabia que eu amava outra mulher, estava escrito na sua testa que eu não a convenci com minhas mentiras, e mesmo assim aceitou que recomeçássemos do zero. Eu não tinha mais o direito de desapontá-la.

      — Se quiser, compro um pra usar no dia-a-dia.  Ela piscou.  Só assim sou elogiada com frequência.

    Nossa, head shot. Tocou na ferida com classe, sem me ofender ou criar um clima pesado. Dois pontos para Elena, zero para mim.

    Preferi não rebater, apenas arregalei os olhos e sorri envergonhado, como fazemos com nossa mães ao esquecer de lavar a louça do almoço. Até hoje me lembro de quando ela voltava do serviço e gritava da cozinha "kuso, Hayato! Shinjirarenai..." (droga, Hayato! Não acredito...), fazendo minha alma estremecer por notar que havia vacilado novamente. Bons tempos.

    Com a conta devidamente paga, levantamo-nos e fomos em direção à saída, nos despedindo dos funcionários que controlavam a porta principal. Meu estômago pesava por conta do excesso de petiscos que comemos, e a depressão pós prato me abraçava docemente, me convidando a deitar e dormir o quanto antes. Nada de punheta, leituras ou programas de culinária, eu só queria me entregar ao sofá com urgência, sem nem tomar banho ou trocar as roupas por um pijama.

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