Capítulo 27.

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Mason.

Minhas pernas tremeram e senti a bile subir pela garganta. Não quis olhar para trás, eu sabia que aqueles olhos estariam me fitando, querendo descobrir minha alma. Continuei imóvel, torcendo para que ela estivesse delirando e que me achasse uma miragem ou a porra de um sonho. Mas o silêncio insuportável rondou o quarto por alguns minutos, até quando decidi encarar a realidade que eu havia escolhido para mim. Suspirei, torcendo para que eu não desmoronasse nesse chão gelado e girei os calcanhares não demorando para encontrá-la.

Lá estavam eles. Azuis feito o Mar Mediterrâneo. Grandes olhos que despiam as minhas partes mais cobertas e desvendavam os meus medos mais profundos. Emery estava me dissipando todo ódio e todo rancor que eu alimentava desde criança, ali, naquele momento. Estava me dando pequenos vislumbres da paz enquanto eu nadava nas pérolas que eram sua íris. O que me matava era saber que quando eu saísse daquele transe aquilo acabaria, que como um maldito viciado, eu não pararia de usá-la para me livrar do meu passado até que eu não conseguisse mais viver sem ela. A gastaria, a destruiria e depois só Deus sabe quando eu encontraria outra maldita droga dessas para me salvar.

"Pare de me olhar." Ela sussurrou tão baixo que eu não perceberia se meus pés não tivessem se descolocado involuntariamente para perto dela. Puxou o lençol até a altura de seu rosto e se afundou naquele leito pálido.
"Nem se eu quisesse, não conseguiria." Gemi quando ela se afastou e o rastro do cheiro dos seus cabelos pairou no travesseiro amassado. Ela se afundou ainda mais, transformando seu rosto em uma careta de dor e choro.
"Pare de me olhar, Mason. Eu não quero que me olhe." Ela alterou a voz embargada, ainda se escondendo nos lençóis amassados, movimentando pouco as pernas. Eu grudei na barra de ferro não conseguindo me conter. Por que isso agora? Por que não posso olhá-la? Eu quero ficar aqui e só ficar aqui olhando para o seu rosto o resto da vida.
"O que está acontecendo? Por que está fazendo isso?" Não percebi meu tom amargo e reparei que estava sendo rejeitado pela quem me dera vida, maldita vida passageira. Toquei em seu braço e ela pareceu tomar um choque. Se contorceu e as lágrimas jorravam sem parar. Ela gritou algumas vezes e fiquei imaginando em quanto tempo chegariam aqui.
"Não me toca! Não me toca!" Ela se debatia, bagunçando os cabelos emaranhados. Os olhos correndo de um lado para o outro, como se estivesse vendo alucinações. Me desesperei, era uma sensação do caralho. Parecia que meu peito iria explodir se eu não fizesse alguma coisa.
"Sou eu, Emery. Sou eu, porra! Eu to aqui. Não vou sair daqui nunca mais." A peguei pelo braço, descobrindo seus lençóis e jogando sua manta para longe. Ela estava com as pernas descobertas, com o avental bordado do hospital, e vários hematomas cobriam sua coxa lateralmente e internamente. Mordidas ainda cicatrizavam e eu podia ver o formato perfeito da boca deles. Me estremeci e ela percebeu. Não deixei que se esquivasse de mim e a peguei no colo, tirando-a da cama mal encapada. Ela tentou lutar, mas não sabia se lutava contra mim ou contra os demônios que a assombravam.
"Você vai sentir nojo de mim. Eu estou com nojo de mim. Eles me tocaram, eles me lamberam, me morderam. Eu quero que você sinta nojo de mim e vá embora. Eu estou imunda e nenhuma água vai me tirar essa sujeira." Ela vomitou essas palavras na minha cara e cada uma foi ferindo cada parte do meu ego abalado. Eu a estava apertando com tanta força que não percebi que a pressão em seus braços estava branca. Ela não dizia nada, só podia ver as lágrimas correndo quentes e pela minha camiseta.
"Eu vou matá-los. Assim que saírem daqui." Eu não tinha um plano e não sei por qual razão a contei isso. Ela não tinha que saber do que eu estava tramando e eu prometi para sua mãe que não relembraria essa merda. Alguma coisa da minha vida imprestável eu tenho que fazer valer.

Ela olhou para mim, com o rosto impassível e tentei desvendar alguma expressão. Mas ela já tinha ido embora para um lugar que eu não conseguia encontrá-la. Seus olhos já não brilhavam tanto e eu estava aqui, com a mulher que me reviveu nas mãos, mas sozinho ao mesmo tempo.
"Emery." Minha voz saiu rouca, esquisita. "Eu não sei o que é isso, não sei se posso confirmar o que quero dizer, mas não vou dizer até que eu tenha certeza do que é. A única coisa que eu sei é que eu não vou sair daqui e eu não me importo com nada disso." Apontei para o nada, tentando fazê-la entender o que nem eu mesmo conseguia explicar. "Eu nunca nessa vida vou ter nojo de você. Eu te desejo desde que eu te vi e não me controlo nem nesse maldito hospital." Ela voltou o olhar para mim e para as minhas palavras medíocres, então continuei. "Eu vou te fazer esquecer essa merda, vamos fazer isso juntos." Mais uma promessa entrelinhas que eu guardei na minha lista de "pessoas a quem vou decepcionar." Ela afundou o rosto no meu ombro e aquele cheirou arrepiou todos os pelos da minha nuca. Mesmo machucada, as pernas dela esquentavam meu colo e me permiti desenhar círculos onde haviam os hematomas. Ela se retraiu e seus pelos se eriçaram. Sussurrei em seu ouvido, próximo suficiente para quase sentir o gosto da sua pele. "Quando isso acontecer, quando você não se lembrar de nada disso e eu te fizer feliz..." Parei, pensando se deveria continuar. Ela não desviou e aproximou mais o corpo do meu. "Eu vou te foder até você não tiver nenhum nome para chamar, se não o meu... Essa promessa, Emery, eu posso cumprir." 

***
NOTAS DA AUTORA


Esse foi o último capítulo de Mason. Não sei quando vou fazer um POV dele novamente, então vocês que lutem nos comentários se quiserem alguma coisa diferente. 


Estrelinhas para quem gostou, comentar para quem amou. 


After 6: Depois da calmaOnde histórias criam vida. Descubra agora