Auden.
As nuvens pareciam carregadas, o vento era úmido e as árvores balançavam com as correntes frias. O tempo havia mudado, exatamente como tudo o que estava acontecendo nessa casa. Eu não ouvia mais risos, passos apressados ou música. As televisões viviam desligadas e a cafeteira parecia ser a única coisa a se ouvir funcionar, quando não se havia mais nada para escutar.
Eu estava rodeado de olhares desconfiados, pessoas presas em si mesmas, sentimentos afogados no mais profundo cansaço. Eu não conhecia mais ninguém aqui, pareciam não ser da minha família, eram estranhos convivendo por um único motivo que aparentava não ter salvação. Eu permanecia em pé, porque ainda acreditava, mas a pergunta era: acreditava em quê?
"A gente precisa conversar sobre isso, uma hora ou outra, amor" Catherine apoiou-se em seu par de botas brancos, colocando os cabelos louros atrás da orelha.
Ela não estava feliz com o que estava acontecendo, mas também, não demonstrava qualquer tipo reação quanto aos meus problemas familiares. Sua única questão era nos tirar daqui e afastar-se desse incômodo episódio. Por mais que aquilo estivesse consumindo o restante das forças que eu usava para me manter de pé e intacto, eu não conseguia enxergar a minha vida sem minha família. Era difícil me desvencilhar, difícil tentar construir algo em que eles não fizessem parte.
Deixar Emery aqui, sabendo que ela precisa de mim, depende de mim e qualquer migalha dela é muito bem-vinda, seria egoísmo e muito errado. Então, estou empurrando tudo com a barriga. Tento manter Cat por perto, mas ela resolveu se mudar para o flat dela novamente. Aos finais de semana ela vem para cá, mas os gritos de Mason nunca a deixam dormir, então nossa noite nunca consegue findar e o amanhecer é sempre muito estressante.
"Eu sei. Estou pedindo mais algumas semanas... Ela está melhorando, eu sei que está" confirmei a segunda frase mais para mim, do que para qualquer outra pessoa que estivesse ouvindo.
Não sei até onde eu iria com essa história, também não sei até que ponto o retorno de Mason teria sido bom. Será que a morte dele não teria sido melhor? Emery estava se recuperando, ela estava voltando, até que esse maldito apareceu.
Meu corpo estremeceu e minhas mãos tremeram junto com o prato de canja que eu estava segurando. Virei-me para Catherine que me fitava silenciosa, até misteriosa com aqueles globos azuis, sérios. Sempre me analisando, estudando meus movimentos, notando minha fala... eu não sabia o que eu sentia ás vezes, mas ela me fascinava em tudo o que fazia. Eu poderia me esconder nos seus braços frios e até que esquentassem, nunca mais sair de lá.
"Vou levar para Emery, esperar ela almoçar. Assim que ela acabar, você quer ir para algum lugar?" sugeri, virando meus pés nos calcanhares e me dirigindo às escadarias. Senti seu olhar em minhas costas e seus saltos me acompanhando no chão de porcelanato. Ela suspirou e quando virei o rosto para olhá-la, ela sorriu fraco.
"Sim, tudo bem, vamos ao parque. O que acha?"
Eu assenti, tentando mostrar entusiasmo, acelerando os passos nos degraus. Não está tudo bem e não sei quando vai ficar.
Não encontrei Mason pela casa, na verdade, eu nem o procurei. Enquanto procurar manter distância desse ser humano desprezível, meus dias serão mais alegres e menos sugados. Fico pensando em como Emery era antes disso tudo, o quanto sua risada alegrava nossos dias, seus passos pesados ricocheteavam no piso e nossas manhãs eram insuportavelmente falantes.
Ele conseguiu desprendê-la do mundo, a levou para um lugar escuro, abusou da sua bondade, tirou todo o seu vigor e se viciou nela, como uma maldita droga. Quando voltou para buscar mais, para se saciar, como um maldito zumbi, já havia a esgotado. Ele acabou com ela, com sua longevidade e toda sua expectativa. Sugou a todos nós e continua nos drenando, até que não sobre nada. Somente ele e seu tempo longo de deterioração na terra.
"Em, sou eu, vamos almoçar? Hoje tem sopa... eu fiz uma canjinha, alguma coisa mais leve, tudo bem? Sei que você jantou mal ontem, fiquei receoso de que não estivesse tão boa a comida ou que você estivesse passando mal. Sabe que pode me dizer se não estiver bem, não sabe? Eu estou aqui, não precisa sair do quarto se quiser é só me deixar entrar e..." minha voz suplicante foi ficando baixa e cansada.
Como quase todos os discursos e tudo o que eu tenho vontade de dizer a ela. Minha voz some no meio dos meus próprios pensamentos, enquanto estou pensando nas grandes coisas que eu queria que ela soubesse. Nos meus grandes feitos, nas minhas conquistas e em como ela era minha melhor amiga.
A porta se abre com um click e a escuridão parece tomar conta de todo o corredor. Um silêncio devastador e eu só podia escutar sua respiração chiada, fraca. Ela está coberta por um cobertor, cobrindo os olhos e todo rosto. Apenas seu cabelo que parecia estar batendo na coxa, aparecia. Estava opaco, sem vida, embaraçado e sujo. Grande demais, pelo tempo que estava nessa situação, não o cortara mais.
Eu aproximei a bandeja com um copo de suco e o prato cheio de sopa. Suas mãos alcançaram as minhas e estavam frias, feito duas pedras de gelo. Suspirei, segurando as lágrimas que ameaçavam querer aparecer.
"Coma tudo, está bem? Hoje não vou poder ficar. Catherine e eu temos planos. Deixe a bandeja do lado de fora que quando eu voltar, recolho a bagunça." Eu sorri, mesmo não conseguindo enxergar a feição dela pela escuridão.
Ela não me respondeu. Retirou a bandeja com os braços trêmulos da minha mão e fechou a porta atrás de si. Encostei a testa no batente e respirei fundo.
Quando isso vai acabar?
NOTA DA AUTORA
Aquela estrelinha marota e um comentário safado, hein?
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After 6: Depois da calma
RomanceUma silenciosa paz e calma se instaura pela família Scott, perpetuando o final feliz de Hardin e Tessa. Os anos se passaram e as mágoas e más escolhas foram deixadas para trás. Mas parece que o aparecimento de alguém indesejado e os medos passados e...