Paris!?

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Com David Bowie ecoando em meus fones, corro pelas ruas calmas da vizinhança. Não passam das sete da manhã e já devo ter completado uns dez quilômetros perdida. Não, não perdida geograficamente, por mais desatenta que eu seja, eu digo perdida no sentido de pensamentos. Penso e repenso sobre, já que mais uma vez acordei com pesadelos sobre o fatídico dia que minha vida virou de ponta cabeça, e isso tem se tornado uma enorme pedra no meu sapato.

Cometo a falha de permitir que minha mente caia nas armadilhas do passado, sinto todo meu corpo tremer e o coração acelerar. Como em instinto, respiro fundo, temendo não ter mais ar nos pulmões. Minha visão está nublada, o corpo mole e os sentidos nulos. Aperto as unhas na mão, vendo os nós ficarem amarelos pela força. Respira. Inspira. Expira. Balanço a cabeça, afastando todas as memórias que deveriam ser esquecidas. Acelero mais, me concentrando em alcançar a próxima quadra, sinto meus pés batendo no chão com força e olho para o céu, vendo o sol se abrir para mais um dia.

 Em menos de cinco minutos já estou de volta em casa, limpo os pés no tapete que fica na soleira e ao abrir a porta, o cheiro de café invade minhas narinas me fazendo abrir um sorriso instantaneamente. Tiro meu casaco quando passo pela porta e penduro nos ganchos atrás da mesma. Encaro uma foto específica na parede e suspiro pesadamente. Afinal a caminhada não ajudou muito. Me recomponho e sigo para cozinha, de onde está vindo as vozes da minha tia e primo.

— Bom dia  — diz animada ao entrar na cozinha e dar de cara com Felix sentado a mesa.

— Bom dia pra quem, Cosima?  — disse revirando os olhos.

— Alguém está de mau humor hoje, não ligue  — Siobhan se pronunciou e Cosima riu, a observando colocar uma xícara enorme de café na sua frente.

— Levou fora do macho ontem?  — provocou levando uma encarada que a fez rir.

— Pior que isso. Tive que levantar cedo para faxina  — revirou os olhos.

— Você? — perguntou em tom debochado e gargalhou.

— Alison chega amanhã de viagem e se Felix tem amor a vida precisa organizar aquela zona de quarto  — Siobhan informou e Cosima sorriu vendo Felix revirar os olhos  — Dormiu bem, minha querida?  — sentou na cadeira ao lado e pegou sua própria xícara, que estava sobre a mesa.

— Sim, tia — abriu o sorriso mais convincente que conseguia, mas a cara de Siobhan demonstrou que na verdade foi uma péssima atriz  — Levantei cedo para correr, já estava sentindo falta  — segurou a xícara como se sua vida dependesse daquilo.

— Suas olheiras estão enormes  — Felix apontou para Cosima, recebendo um olhar matador da mãe  — Parece que não dorme direito tem um mês.

— Bom dia, família  — a voz sonolenta de Sarah quebrou o silêncio que havia surgido após o comentário de Felix.

Bendita seja minha prima, preciso lembrar de agradecê-la.

— Vou tomar banho e ir trabalhar  — Cosima deu um último gole no café e levantou, deixando a xícara sobre a pia — Hoje devo chegar mais tarde, vou ao cabeleireiro.

 — Resolveu melhorar esse cabelo seco?  — Felix alfinetou rindo de canto.

 — Vou mudar totalmente  — sorriu contente e suspirou  — Mudanças, família. Mudanças.  — piscou sorrindo antes de sair.

— Até quando ela vai tentar nos enganar?  — se pronunciou olhando para Siobhan, que olhava para a porta que a sobrinha saiu as pressas.

—  Felix, não vamos começar com isso novamente — coçou a sobrancelha e suspirou, se perdendo em pensamentos enquanto observava o vapor que saía do seu café — Cosima já é adulta, sabe o que é melhor para si própria.

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