Capítulo 42 ........... Da Água Ao Vinho

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Laura Narrando

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- Quer fazer isso aqui dentro, ou lá fora? – Ela devolveu prontamente, o olhar ainda firme e sério.

Bem, se ela estava disposta a conversar, então que assim fosse.

Sem nada dizer, eu me levantei da banqueta com o celular em mãos e lhe dei as costas. Apesar de não ter respondido sua pergunta verbalmente, Nice pareceu entender o recado quando passou a me seguir. O silêncio sendo nosso principal guia.

Eu passei pelo arco do Hall de entrada, que divide a cozinha da sala de estar, e dei uma rápida espiada para no outro cômodo, a fim de checar a todos - contudo indo em direção a porta. Todos pareciam bem distraídos ouvindo Dylan e Derik discutirem sobre quem foi o verdadeiro responsável por montar a casinha que estava na varanda. Mentalmente, eu agradeci o fato deles estarem monopolizando a atenção de todos e abri a porta o mais sorrateiramente possível, evitando fazer barulhos. Ao passar por ela deixei-a aberta, pois ainda sentia Cleo me seguir.

Atravessei o quintal gramado e observei ao meu redor, pensando em onde poderíamos fazer aquilo. Queria distancia e privacidade, afinal não sabia em como resultaria nossa conversa e não queria assustar ninguém ou acabar com o clima alegre de todos se ouvissem alguma possível discussão com vozes alteradas. Nice e eu geralmente mantemos os ânimos, mas eu me sentia tão fora de mim que não tinha mais certeza de nada e não queria arriscar.

Ainda percorrendo o olhar pelo vasto gramado, avistei mais à frente a única árvore que havia ali, tendo em um dos seus galhos mais firmes dois balanços de ferro e algumas lâmpadas vintages penduradas de outros galhos, deixando-a bem iluminada. Não tive dúvidas de que era o local perfeito, apesar de vento que corria e brincava com as folhas arrepiar minha pele.

Adiantando meus passos, eu ganhei o caminho e me sentei no balanço pintado de rosa. Ainda fui capaz de observar Nice caminhando em minha direção, com o seu rosto pouco iluminado ganhando luz à medida em que se aproximava da árvore.

Eu desviei o olhar assim que ela parou diante de mim.

- Senta aí – sugeri com um encolher de ombros.

Meus olhos pairaram na visão ao meu lado, na área da piscina na lateral da casa, a academia amparada por vidro e no salão de tijolos protegendo a mesa grande e a churrasqueira, distantes.

Não demorou muito para que eu ouvisse um suspiro abandonar o corpo da mulher à frente e então senti-la se afastar. O som de correntes do balanço ao lado preencheu o ar e eu me vi mais tranquila para olhar adiante. Eu não estava me sentindo bem para encarar a mulher ao meu lado. Queria ser firme, e sabia que só seria capaz de fazê-lo se não a visse.

O silêncio perdurou por prolongados minutos. Ela não disse nada e eu tampouco me esforcei para dar início a tão temida conversa. Interiormente eu travava uma batalha, recitando teimosamente que não choraria mesmo sentindo meus olhos já lacrimejando com todos os receios e pensamentos que me atormentavam. O fato de Cleo não dizer nada só piorava a situação e me fazia querer gritar, com raiva de mim, dela, frustrada com tudo e principalmente com medo de abrir a boca e me humilhar implorado para que ela não fosse.

- Posso saber com quem você estava falando? – Ela voltou a perguntar. Minutos intermináveis em silêncio e quando ela me abre a bendita boca é para querer saber com quem eu estava ao celular.

- Minha amante – respondi em tom zombeteiro. Estava irritada e queria que ela soubesse disso, já que aparentemente não se deu conta. Ou, se o fez, estava ignorando deliberadamente.

- Laura... Acredito que não seja o momento para brincadeiras sem graças.

Eu suspirei, no fundo sabendo que ela estava certa e que eu estava agindo de maneira infantil.

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