Capítulo 38: se arrependimento matasse

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Quando deixei meu quarto, sábado de manhã, a sala de estar estava cheia de malas e bolsas.

Felicia, em um canto, observava tudo com os braços cruzados e o rosto limpo, com olheiras profundas em evidência. Para não estar usando maquiagem, a coisa deve estar bem feia.

— Pai? – Aproximo-me, angustiada.

Martin está indo e voltando, levando as coisas para o carro. É doloroso pensar que tudo está despedaçado dentro da nossa casa, me pergunto o porquê disso estar acontecendo comigo, o porquê de não ter uma família normal.

— Oi, querida. Bom dia.

— Já vai? – Pergunto, mesmo sabendo a resposta.

— Sim, preciso ir.

— Não quero ficar aqui sozinha com Felicia, ela me odeia.

Andrew afaga meus cabelos, mas não parece disposto a mudar de ideia.

— Você é maior de idade e tem um apartamento, pode se mudar quando quiser – sugere.

— E a Hailey? – Lamento.

— Ela já é bem grandinha, sabe se virar.

Baixo os olhos para os meus pés, pensando no que ele disse. Talvez seja hora de pensar em uma mudança, se meu pai está indo embora, também posso ir. Felicia ficaria agradecida, de qualquer forma.

O motorista pega as duas últimas malas, então papai me envolve em um abraço aconchegante, se despedindo de mim.

— Você pode me visitar sempre que desejar, vou adorar receber você e sua irmã.

— Fico feliz que tenha mudado, pai. – Sorrio.

— Só estou saindo do alcance da sua mãe. – Beija minha testa. — Até mais, filha. – Se afasta, lançando-me um sorriso antes de se virar para sair. — Adeus, Felicia.

Ela não responde, permanece com a expressão dura e fria, até papai sair pela porta e colocar o ponto final no casamento de tanto tempo. Então, finalmente vejo-a subir as escadas, se trancando no quarto que agora é só seu.

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Deitada em minha cama, Hailey e eu estamos jogando conversa fora, falando sobre coisas aleatórias.

— Acho que não aguento mais um ano naquela escola – resmunga, revirando os olhos.

— Por quê?

— Aquelas pessoas sugam minhas energias, é como se eu devesse algo a eles por ser popular.

— Nossa, que difícil – ironizo.

Ela bato um travesseiro em mim, então suspiro, fazendo-a me olhar.

— O que foi? – Franze o cenho.

— Estou com boas expectativas sobre o próximo ano, será ótimo não ter que ver Tristan por todo lado, é tão difícil evitá-lo.

— Não evite.

— Ele me usou. Papai te contou sobre o acidente do senhor Cobain, não é? – Ela acena. — Tristan se aproximou de mim para se vingar, nem quero pensar o que ele faria comigo se eu não tivesse ouvido tudo.

Hailey está com uma careta, parecendo chocada com o que eu disse.

— Ele fez o quê?! – Fica de boca aberta.

Dou de ombros, apenas, não preciso dizer nada mais.

— Que escroto!

— É, ele foi sujo. Odeio sentir tanto. – Suspiro.

Minha irmã se vira para mim, dando um sorriso carinhoso.

— Vai passar, nada dura para sempre, não vê mamãe e papai?

Concordo, desejando que ela esteja certa.

— Além disso, eu posso melhorar sua situação quando contar a minha. – Solta um riso.

Com uma sobrancelha erguida, espero ela começar a contar o que está acontecendo. Nesses dias que passaram, fiquei tão presa em minha própria bolha que acabei me esquecendo de que preciso ouvir minha irmã. Só pensava em como faria para desviar de Tristan Cobain mais uma vez, já que ele parecia onipresente.

— É o Antony.

Reviro os olhos já de início.

— O que aquele cuzão fez de novo?

— Além de passar a vida me rejeitando? – Aperta os lábios. — Ele vai para Nova Iorque.

— Fazer o que lá? – Questiono com estranheza.

— Vai concluir os últimos três anos do curso e especializar em oncologia.

— Hum, é uma profissão muito nobre, apesar dele ser um idiota.

Ficamos em silêncio, até uma pergunta insistente martelar outra vez em minha cabeça.

— Ele sabe? – Não preciso entrar em detalhes, a pergunta é óbvia o suficiente.

— Não, e prefiro que não saiba nunca. Antony nunca foi muito receptivo comigo, a não ser quando precisava de uma foda fácil.

— E por que você se dá tão fácil para ele, irmã?

— Porque o amo. – Suspira. — Porém, estou como você, feliz por ele ir embora, vai ser ótimo não vê-lo mais.
De qualquer forma, me arrependo muito de não ter sido capaz de contrariar nossa mãe naquele dia, meu bebê não tinha culpa de nada.

Puxo-a para meus braços, beijando o topo de sua cabeça e acariciando seu rosto até pegarmos no sono juntas.

IMPERFEITA - VOL IOnde histórias criam vida. Descubra agora