Observei a paisagem por um tempo, senti os olhos pesando e mergulhei em um sono sem sonhos. Não sei quanto tempo tinha se passado desde que apagara, mas acordei com o barulho da porta da cabine sendo forçada para ser aberta, enfiei a mão no bolso no casaco e retirei uma máscara preta. Ela deixava a região dos meus olhos à mostra, mas conseguia cobrir minhas sardas. Levantei o capuz e fingi dormir, a pessoa entrou na cabine e sentou-se ao lado de Katsuki.
- Desculpe-me, mas as outras cabines já estavam cheias. - Percebi ser um homem pelo tom de voz. - Turistas? - Ele insistiu em uma conversa.
- Não, estamos visitando uns parentes. - Katsuki respondeu com desconfiança.
- Bucareste é muito linda nesta época do ano. - Merda, será que Katsuki vai saber? - Oh, perdão, me chamo Tomura Shigaraki. - Merda, merda, merda, merda. Como conseguimos encontrar um caçador justo agora?
- Darius Albescu. - Katsuki respondeu, nada mal.
- E o seu amigo? - Senti meus músculos tensionarem.
- Izuku Albescu, ele é meu primo. - Katsuki encostou o joelho no meu discretamente e senti um onda de calmaria invadir meu corpo.
Lembrei de como Toshinori conseguia mudar a cor dos olhos, será que eu também consigo? Mas como? Pensei em como a marca funcionava, eu pensava no sentimento que queria transmitir e acontecia. Pensei em meus olhos mudando de cor, mas não senti nada acontecer. Eu tenho que pensar na cor também? Os olhos de Katsuki são vermelhos, imaginei meu verde esmeralda se preenchendo de pigmentos vermelhos... Nada. Deve ser mais biológico que isso. Concentrei em sentir cada nervo óptico, agucei meu sentindo da visão, então pensei nas células de melanina verdes sendo substituídas por células vermelhas. Meus olhos arderam um pouco e consegui sentir a mudança acontecendo. Fingi acordar, bocejei e alonguei as costas; abri um pouco o olhos e pisquei algumas vezes para acostumar. Olhei primeiro para Katsuki, pela expressão de choque e confusão dele eu sabia que tinha funcionado.
- Ah, olá. - Abri um sorriso caloroso, mas lembrei que estava de máscara. - Estou meio gripado, Izuku Albescu. - Estendi a mão para cumprimentar, a pele dele era fria e áspera.
- Tomura Shigaraki, prazer conhecê-lo. - Ele tinha cabelos brancos, mas não aparentava ter mais de 30 anos, também tinham algumas escoriações em seu pescoço... Olhos vermelhos, mas era um vermelho mais escuro, diferente do de Katsuki.
- Negócios? - Apontei para a maleta que todo caçador carregava, era onde eles escondiam as armas e conseguiam se disfarçar de empresários.
- Sim... Sim. - Ele pousou a mão sobre a maleta e me olhou nos olhos. O trem começou a desacelerar e Tomura desviou o olhar, pegou a pasta executiva e levantou. - Prazer conhecê-los senhores Albescu.
Ele saiu da cabine e relaxei, fechei os olhos e fiz a transformação parar; aquilo drenou muito minhas energias. Como Toshinori conseguia ficar tanto tempo assim? Olhei de novo para Katsuki, já estava com os olhos verdes, a confusão em seu rosto aumentou.
- Não sabia que você conseguia fazer isso.
- Nem eu. - Observei a janela de soslaio, estávamos chegando à estação. - Vamos procurar uma pousada, amanhã continuamos a viagem.
ᕙ✧●〜〜●✧ᕗ
O quarto era simples, mas só tinha disponível com cama de casal. Fiquei sentado na cama esperando Katsuki sair do banheiro para eu poder tomar banho, saímos tão repentinamente que não deu tempo dele se despedir dos amigos ou da família. Me senti mal por não dar esse momento para ele, sei o quanto é horrível ir embora sem falar com as pessoas que são importantes para você. Lembranças do clã vieram de supetão, deixei todos para trás, eu era o único alfa, não sabia se tinham conseguido se manter. Era dever do alfa comandar o grupo de caça por causa dos sentindo mais aguçados, era dever do alfa distribuir os trabalhos para o povo, era dever do alfa proteger a todos... Não consegui evitar a tristeza e raiva que surgiram em meu peito, voltar aqui era reviver tudo que me forcei a esquecer por anos. Tanto que lutei contra essas memórias, contra esses sentimentos... E agora tudo estava regredindo.
- Ei. - Ouvi a voz dele me chamar e senti a melancólica se desfazendo. - O que foi? - Não tive coragem de virar em sua direção, permaneci sentado na cama de costas para a entrada do banheiro.
- Você gostaria de ligar para sua família... E seus amigos? - Eu o devia esse momento.
- Não... Minha família não liga muito pra onde eu estou. Já me despedi de Kirishima, ele deve passar o recado. - Ouvir o nome daquele ruivo saindo da boca dele me incomodava.
- Certo. - Mas que merda. Essa porra de sentimento não vai embora nunca? Ciúmes é a última coisa de que preciso nesse momento. - Você fica com a cama.
Passei por ele e entrei no banheiro. Rosnei baixinho enquanto tirava a roupa para tomar uma ducha gelada e clarear a mente. A água fria realmente me acalmou um pouco, respirei fundo tentando expelir todo aquele peso dos ombros. Saí do banheiro com a toalha na cintura, não olhei na direção da cama, peguei uma calça na minha mochila e voltei para o banheiro. Se eu olhar pra ele agora, ele vai perceber como me sinto? Merda! Saí do banheiro vestindo uma calça moletom, peguei um travesseiro da cama e coloquei no chão ainda evitando olhar para ele. Deitei no carpete com cheiro de mofo e encarei o teto, faltava pouco para entrar na floresta. Puta merda! Como vou entrar com Katsuki naquele lugar? Ele não cheira como um habitante dos Bálcãs, vou ter que me manter em alerta até chegar na vila. Não dormi, o cochilo no trem foi suficiente.
ᕙ✧●〜〜●✧ᕗ
Saímos da pousada assim que o dia clareou, foram poucas horas de sono, o trem tinha chegado de madrugada. Katsuki reclamou quando o acordei, mas tínhamos que sair cedo, a floresta pode parecer pequena por fora, mas sua verdadeira extensão só é revelada quando adentrada. Pegamos um ônibus e descemos no local mais próximo da floresta; andamos por mais alguns minutos e fiquei de frente para as enormes árvores negras. Katsuki estava nervoso, toquei sua mão com as pontas dos dedos, ele estendeu a palma e segurou minha mão. Olhei em seus olhos e sorri sem mostrar os dentes, ele expeliu o ar do pulmões devagar, senti o aperto na minha mão aumentar. Voltei a olhar para as árvores, minha casa estava mais perto do que nunca. Voltar aqui me parecia um sonho inalcançável, desejei tanto esse instante, mas estava hesitante. Levar Katsuki comigo era arriscado, os lobos poderiam querer expulsá-lo, poderiam querer me expulsar. Tarde demais para voltar atrás, atravessei a primeira árvore e puxei Katsuki para perto de mim. A atmosfera da floresta era diferente do restante do mundo, respirar aquele ar puro novamente me encheu de energia e nostalgia.
- Não importa o que veja, escute ou sinta. Não solte minha mão. - Falei em aviso para Katsuki que assentiu com a cabeça.
Andamos juntos pelo solo macio, meu senso de direção estava ligado com a vila, como um GPS. Minha nova vida... Nossa nova vida, olhei o loiro pelo canto do olho, começa agora.
Fim da parte 1, semana que vem começa a parte 2 kkkkkkkkkk. Eles agora vão chegar na vila do Deku e meu deus gente, tanta coisa vai acontecer. Deku vai reencontrar uma pessoa especial que ele fez questão de esquecer mais que tudo. Enfim, até semana que vem meus lobinhos ✌️😘