Voltei ao apartamento depois que meus instintos acalmaram, estava todo sujo do sangue daquele homem nojento, pelo menos o lobo ficaria satisfeito por um bom tempo. Resolvi entrar pela janela do meu quarto, sempre a deixava aberta para caso precisasse de uma rota de fuga fácil, ou nesse caso, de uma porta de entrada discreta. Avaliei o terreno ao redor me certificando de que não haviam olhos curiosos sob mim, me preparei para escalar e em alguns segundos já estava no meu quarto. Pousei silenciosamente para não anunciar minha chegada e tirei minha roupa suja, o sangue seco craquelava e caia pelo chão com o movimento, me demorei no espelho que ficava na parede perto da cama. Olhei atentamente cada canto do meu corpo procurando algo novo, estava tudo certo, as cicatrizes habituais, minha pele branca, as sardas em meus ombros e costas... Mas algo em minha boca incomodava, mostrei os dentes pro meu reflexo e vi que minhas presas estavam um pouco maiores que os outros dentes e mais afiadas, tentei imitar um sorriso para testar como seria se alguém me visse, as presas não se destacavam muito, davam até um certo charme.
Parei de enrolar e fui tomar um banho, tirar o sangue da pele sempre foi um trabalho chato, ainda mais agora que eu tinha que estar com as unhas limpas. Resmunguei baixinho enquanto esfregava uma esponja de banho nos meus braços, pernas e pescoço, a água da banheira ficou num tom rosa quando terminei o banho. Mais uma vez eu fiquei encarando meu reflexo no espelho, suspirei pesadamente lamentando ser o único vârcolac na região, não tinha a quem recorrer para perguntar o que estava acontecendo comigo. Troquei de roupa e me joguei na cama, vi os primeiros raios da manhã pintarem a noite sem estrelas, dormi quando escutei o primeiro pássaro cantar. O despertador tocou me assustando, meu corpo reclamou quando tentei levantar da cama, estava um pedaço de lixo, não tomei banho já que tinha tomado um que limpara minha alma 1h atrás, coloquei o uniforme horrendo e tentei sentir qualquer coisa que indicasse a presença de Bakugo. Estava tudo silencioso, peguei a mochila e saí de casa trancando a porta, olhei para a saída de emergência que dava acesso as escadas e lembrei dessa madrugada, a sensação da vida de esvaindo daquele maníaco enquanto eu cravava mais fundo os dentes em sua garganta me acalmava. Não gostava me matar humanos, mas quando eu sentia um nível de perversidade como senti naquele sujeito, meu lobo se descontrolava, pelo menos a culpa não era tão grande quanto seria se eu tivesse atacado aquela menina.
Balancei a cabeça me livrando das lembranças quando o elevador chegou ao meu andar, dei bom dia ao porteiro e segui para a estação. O dia estava ensolarado e com uma brisa fresca de primavera, pude sentir os cheiros das flores nos comércios, nas janelas das casas e nos canteiros das calçadas, agora que estava alimentando e satisfeito, manter o controle era mais fácil. Cheguei na estação e vi Katsuki ao longe sentado com fones de ouvido, não fui falar com ele, também não continuei olhando em sua direção, ontem tinha sido um erro, não poderia deixar que acontecesse novamente. O metrô chegou e dessa vez entrei num vagão com mais pessoas, lembrei do homem que tentou me assediar e em como foi delicioso saborear o gosto de sua carne, aparentemente ele mudara de local de ataque depois que me encontrou no metrô e meti medo nele. Eu estava tão bem que nem o vagão lotado de pessoas e cheiros me deixaram inquieto, vi uma menininha me encarando, ela tinha longos cabelos azuis e grandes olhos vermelhos. Sorri sem mostrar os dentes e ela retribuiu com um aceno tímido de mão, vi um homem alto com uma máscara hospitalar puxar a menina e falar alguma coisa em seu ouvido, ele falou rápido, não consegui aguçar a audição a tempo, a menininha me lançou um olhar triste de relance e virou a cabeça para outro lado.
Farejei medo vindo dela o que fez meu corpo enrijecer, senti meu sangue esquentar e meus sentidos aflorarem. No momento em que eu ia levantar de onde estava e ir tirar satisfação com aquele sujeito o metrô parou e as portas se abriram. O movimento das pessoas saindo me fez perder eles de vista, não consegui gravar seus cheiros, o vagão estava muito lotado, saí perguntando para algumas pessoas se viram um homem moreno com máscara e uma menina de cabelo azuis e olhos vermelhos, mas ninguém os tinha visto. Me conformei que seria inútil continuar com a procura e fui para a escola, mas um sentimento ruim parecia encobrir meu coração, meus pelos da nunca estavam eriçados em sinal de alerta, a sensação me acompanhou até os portões da U.A, mas logo diminuiu quando encontrei Mina encostada no muro perto da entrada.