Michael Wheeler

359 37 116
                                    

 Periferia - Cidade de Hawkins, 4 de abril de 2022

 Michael Wheeler

 Quando identifico a garota tropeçando nos próprios cadarços e seu corpo se chocando contra o asfalto, percebo que não podia mais ficar sem fazer nada.

 Ela estava a vários quilômetros, mas isso não me impedia de ajudá-la. Minha irmã mais velha, a Nancy, dizia que não havia obstáculos para uma pessoa que quisesse ajudar outra; isso contava na amizade, no amor, ou em qualquer outra circunstância. Jamais esqueceria desse seu conselho, afinal era raro esses seus momentos de "partilhamento da sabedoria do irmão mais velho".

 - Mike! - Max cutuca ao meu lado no telhado, desviando sua atenção do binóculo. - você está maluco? Não temos mais que cinco minutos para dar o fora daqui. Há patrulhas muito próximas.

 - Não posso deixar a garota morrer, Max. - discordo. Minha liberdade não valia mais do que uma vida inocente. 

 A ruiva me olha com preocupação enquanto eu apoio as mãos no parapeito do telhado para pegar impulso e salto no chão na sequência.

 - Dustin e Lucas já estão vindo. Assim que eles puserem os pés aqui, temos que voltar.

 - Eu sei. - digo, ouvindo outro grito da menina. Minha pele se arrepia pelo seu desespero quase palpável pairando no ar. - Me dê apenas cobertura enquanto eu resolvo isto.

 - Ah, claro senhor. - ela chia, revirando os olhos azuis claros - Você vai ficar me devendo essa, cara de sapo!

 Rio com o apelido que me deu há tempos atrás e ponho o capuz sobre a cabeça para esconder minha identidade caso esbarrasse com algum soldado.

 - Também te amo, cabeça de abóbora!

 Eu não tinha a habilidade de ser tão rápido quanto a Max, porém não podia tirá-la de sua vigília. Nossa alimentação da noite e do resto da semana dependia do sucesso dos garotos em sua ação ao supermercado do lado militar da cidade. Não iríamos tirar dos pobres o pouco que eles tinham, então seria ilógico ir aos mercados da Periferia.

 Viro à esquerda na primeira rua e contino correndo até descer uma meia ladeira que me ajudaria a chegar perto mais rápido de onde o demogorgon em forma de cão, Demodog como Dustin nomeara, ameaçava se alimentar de uma garotinha.

 O relógio apita no meu pulso, indicando que eu já havia perdido um minuto em minha corrida super heróica. Tensiono a mandíbula ao ter que saltar sobre uma rocha no meio do caminho, minha perna esquerda reclamando pelo impacto brusco e chamando a atenção para o inchaço que a calça jeans escondia.

 Menos de vinte segundos depois, avisto a dupla a alguns centímetros de distância. Chego no justo minuto em que o demodog emite uma espécie de rosnado, ele atacaria em um milésimo de segundo se eu não conseguisse ser mais ágil.

 Ergo uma mão no ar, o interceptando bem na hora em que direciona seus múltiplos dentes à mais nova.

 O bicho se contorce, buscando resistir à força invisível que empurrava-o para baixo. Dou mais alguns passos em sua direção, enquanto a garota de cabelo loiro rastejava para longe do protótipo animalesco com cabeça de planta carnívora.

 - Você não acha que é errado ficar dependendo de meninas indefesas para sobreviver, totó? Tsc tsc tsc - estalo a língua, balançando a cabeça em sinal de reprovação sem baixar a mão - muito errado.

 Ele traz uma pata com garras afiadas em minha direção, tentando me alcançar, porém me aproximo ainda mais dele, fazendo com que se desiquilibrasse e caísse no chão. A flor em sua cabeça abre e fecha como se estivesse colapsando.

Mileven: Two WorldsOnde histórias criam vida. Descubra agora