Super-humano

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Mike



 Gotículas de suor escorrem pelo meu rosto, fazendo o caminho desde a testa até o queixo, onde derramam-se na cerâmica branca do piso.

 Eu aperto os olhos, gritando de dor, mas o som é abafado pela mordaça posta firmemente contra meus lábios e amarrada atrás da cabeça. Dava para senti-la pressionando o crânio em cada movimento que eu fizesse com a boca, impedindo-me de gritar ao mundo a dor e o ódio que sentia por ser estar enfrentando aquilo.

- Seja forte, garoto, estamos quase acabando por hoje. - diz uma figura de jaleco à medida em que digita algo no computador a alguns centímetros de mim, mas não sou capaz de distinguir seu rosto nem o de mais ninguém que esteja na sala.

 A dor está me deixando enfraquecido, incapaz de ter qualquer atitude, e a visão está embaçada a ponto de não conseguir enxergar nada com exatidão.

 Outra dose de radiação me é aplicada na veia braquial, por um segundo homem de jaleco, e sinto-a queimar tudo enquanto se mescla ao sangue.

Me contorço pela enésima vez, teria derrubado a cadeira se esta não estivesse fixada a uma estrutura de metal semelhante a uma meia parede. Meus pulsos e tornozelos estão presos por braceletes e tornozeleiras eletrônicas, limitando os gestos, e as lágrimas caem pelo rosto antes que possa pensar em contê-las.

Os bipes do monitor cardíaco disparam de supetão, mas da mesma forma repentina que alardiaram, começam a se suavizar.

- Fantástico! - o homem diante do computador exclama, parecendo verdadeiramente extasiado.

- O organismo dele continua limpo, intacto, como se absolutamente nada o tivesse acontecido. - outro complementa, igualmente estupefato - É impossível a qualquer ser humano comum se encontrar neste exímio estado de saúde após toda quantidade de radiação que injetamos nele!

- Não é detectável a presença de tumores ou demais danos irreversíveis nas células. - este último faz uma pausa - Esse garoto está além das nossas expectativas, senhores!

- Enfim fomos capazes de criar um super-humano? - algum outro médico volta a perguntar - imagina a repercussão que isso terá em todo o mundo!

- Os russos finalmente perderão seu reconhecimento diante da inteligência norte americana!

-Que dia memorável!

As exclamações gananciosas me deixam enjoado.

Assim que eles afrouxam a mordaça, levo uma mão ao canto dos lábios, de onde um líquido viscoso escorre para fora. Meus olhos estão fechados, exaustos demais para sequer abrir, posso não estar vendo o que é aquilo, contudo o cheiro ferrugento que adentra em minhas narinas é inconfundível.

 Essa é a minha última lembrança desse momento, pois um segundo depois a consciência me abandona.


Há uma garota parada no meio do corredor entregue à penumbra, com uma arma na mão e dois militares caídos ao seu redor. Um deles, com os olhos abertos e fixados em um ponto inespecífico acima das nossas cabeças.

Eu não lembro de como chegara até ali, nem porque estava vestido com aquelas roupas horríveis de hospital, ou porque tudo parecia tão confuso.

Mileven: Two WorldsOnde histórias criam vida. Descubra agora