Hello

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"Olá, sou eu
Eu estava me perguntando se depois de todos esses anos
Você gostaria de encontrar, para falarmos sobre tudo
Eles dizem que o tempo deveria te curar
Mas eu não me curei nem um pouco
Olá do lado de fora
Pelo menos eu posso dizer que eu tentei te dizer
Me desculpe por partir seu coração
Mas não importa, claramente isso não te machuca mais
Olá, como você vai?
É tão típico de mim falar sobre mim mesma
Me desculpe, espero que esteja bem
Você conseguiu sair daquela cidade
Onde nada nunca acontecia?
Não é segredo
Que nós dois estamos ficando sem tempo
Então, olá do outro lado
Eu devo ter ligado mil vezes para te falar
Me desculpe por tudo que eu fiz" Adele - Hello




A sensação era devastadora. Doía na mesma proporção na qual causava duvidas. Não. Não mesmo. Isso não pode ter acontecido. Alessandro não é... ele não foi abusado como eu. Não. Algo está errado. De olhos fixos nas mãos entrelaçadas de vovó nas minhas, tremulei minha visão que se tornara turva com a trágica sentença que ela havia dito. O ar escapou por minha boca, em um arfar desesperado que antecipou o derramar de minhas lágrimas pesadas sobre nosso enlaço.

— Pare de mentir para mim –gaguejei entrecortada, afastando-me bruscamente de sua companhia. Percorri minhas palmas por meu rosto, tampando-o em busca de concentração. — Eu não acredito. Não acredito.

— Querida...

— Não! –solucei. — Não, isso não é real! Alessandro teria me dito! Éramos como unha e carne antes dessas merdas acontecerem!

— Por isso ele nunca a contou, Amélia –detectei certa hesitação em sua voz que, aos poucos, aproximava-se de mim. Rumei à porta, fugindo de sua tentativa d consolo. — Querida, volte aqui. Vamos chamar Alessandro e esclarecer esse segredo de uma vez por todas.

— Eu não quero! –gritei a plenos pulmões, compelindo meu punho fechado contra a parede em meu alcance. Vovó encarou-me com expressão espantada, porém, engolindo-a de volta à sua usual sobriedade, avançou em meu encontro. Arqueei as mãos em frente a meu corpo, pedindo para que ela mantivesse a distância. Droga, controle-se, louca. — Por que vocês sempre escondem algo de mim? Por que... por que acham que eu não mereço saber a verdade? Não basta o Jay com suas mentiras para me proteger?

— Amélia, Alessandro não teve culpa em ocultar isso de você. –foi firme, quebrando o bloqueio invisível que montara entre nós. Vovó agarrou-me pelos pulsos, formalizando um abraço apertado que, sem forças, não tive coragem de romper. Em choque, firmei meus braços em volta de seu pescoço e aceitei sua proximidade súbita entre um choro encoberto de pânico. — Ele sempre quis que você soubesse, mas foi impedido de tantas formas que não houve oportunidades para que ele fosse sincero.

— Toda a minha vida parece uma mentira bem planejada. –o aperto veemente de minha garganta causava-me dificuldades em soltar as palavras. Embargada pelo ofegar incessante que a falta de fôlego suscitou, repreendi meu ímpeto agressivo de rebater o que vovó me dissera e viajei mentalmente por minhas lembranças mais distantes, recobrando a amizade que meu irmão e eu tínhamos quando crianças.

Ele fora o primeiro a me apoiar em minha decisão de largar os poucos meses na escola de teatro e abraçar a minha paixão por dança contemporânea. Quando minha estranha afinidade por meninas surgiu, Alessandro não lidou com preconceito. Encorajava-me a aceitar meus desejos e por vezes apresentava-me algumas de suas amigas. Se um de nós entrasse em problemas, contávamos com o outro para acobertar. E por isso doera tanto o mudar abrupto de sua relação comigo. De uma hora para a outra, assim que começara a receber as visitas do maldito que destruíra minha vida, Alessandro tornou-se frio e indiferente comigo.

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