"Me leve à igreja
Louvarei como um cão no santuário de suas mentiras
Vou lhe confessar meus pecados
Assim você pode afiar sua faca
E me oferecer essa morte imortal
Bom Deus, me deixe te dar minha vida" Hozier - Take me to church
Ele engoliu o uísque em um único só gole. Perdi-me em vários pensamentos aleatórios, tão condizentes com a realidade quanto um pedaço de queijo rosa. Esperei seu tempo para falar. Ele não falou nada. Franziu o cenho diversas vezes, mas nada disse. E aquilo me corroía por dentro como uma faísca prestes a se tornar um incêndio. Queria poder colocar a máscara de volta e me esconder em qualquer corredor ou quarto do clube. Uma chicoteada de alguém desconhecido doeria menos que seu olhar sem significados sobre mim. Nem mesmo podia ler se estava com raiva, surpreso ou simplesmente sem nada o que dizer.
Luke, o parceiro de Connan, surgiu entre as pessoas segurando um copo de alguma outra batida que não tínhamos na mesa. Cumprimentou-me pela dança e sorriu simpaticamente para todos, sentando-se ao outro lado do moreno de olhos verdes logo após beijá-lo carinhosamente nos lábios. A mulher que acompanhava Tom, a tão famosa Jane, parecia bem mais interessada em me encarar dos pés a cabeça. Não precisaria ler mentes para descobrir o que ela estava pensando sobre mim. Era um dos erros de se trazer 'gente de fora' para o clube. Sempre pensavam pela perspectiva diferente.
Lucciola iniciou uma outra conversa, chamando a atenção em especial do casal mudo. Tom pousou o copo vazio sobre o tampo da mesa, limpando a boca com um guardanapo de seda. Sempre que passeava com os olhos pelo contorno da mesa fazia questão de dedicar alguns milésimos de segundos sobre mim. Quando havia percebido sua jogada, escondi minha satisfação em ter um pouco de credibilidade de sua parte. Talvez ele não fosse do tipo jogador de pedras. Talvez.
— Acho que o Hid ficou mudo. - Connan, vendo o silêncio quase constrangedor, agiu. — Gostou mesmo da dança, Tom?
O ator movimentou a cabeça ligeiramente para o lado, procurando meus olhos. Por mais que escondesse bem suas expressões, podia visualizar uma ameaça de sorriso por trás dos lábios crispados.
— Estou analisando a situação. –disse, esforçando-se para não soar ríspido. — Não sei o que pensar de imediato, mas, como eu disse, foi uma ótima apresentação. Parabéns.
— Obrigada. –respondi sem conseguir encontrar mais nada para dizer.
Nossos olhares se cruzaram novamente, mas desta vez procuramos fugir do campo de visão. Balancei a cabeça negativamente, sentindo-me mais perdida que antes. Nada faz sentido mesmo.
— Então é isso, Luke. –Tom limpou a garganta. — Connan e você fazem... isso nas horas vagas.
— Não praticamos de verdade. Apenas apreciamos e tentamos em raras ocasiões. –Connan tomou a frente para respondê-lo, deixando Luke de boca aberta, indignado.
— Jane e você deveriam tentar. –Luke, por fim, soltou. Falou com um desdém quase imperceptível. — Resolveria muitas questões pendentes em seus subconscientes.
Connan sorriu baixo, cutucando Luke no ombro.
— Adoro quando joga com segundas intenções. Hid está quase enfartando com a ideia. –murmurou. Decidi virar o rosto, tentando não ouvir suas intimidades. O que era um pouco impossível, devido a nossa aproximação na mesa.
— Não acho que isso faça o meu estilo. –disse Tom. — Deixemos isso para os conhecedores.
— Qual a possibilidade de você ensinar a ele ser dócil? –Luke perguntou-me sem tirar os olhos de Connan, sustentando nos lábios rosados um sorriso quase desafiador.
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Lanterna dos Afogados
Literatura FemininaSe adequar à sociedade e aos padrões neurotípicos jamais foi uma tarefa palpável para Amélia, que carrega sobre seus ombros fardos demais para se suportar. Após o término do relacionamento mais intrínseco que tivera e alimentando a certeza que nunca...