Capítulo 11 - Terceiro Encontro Parte 1

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          Sábado, o dia amanheceu sem sol, não estava frio, mas havia muitas nuvens, que adivinhavam chuva que deveria cair durante todo o dia. Apesar disso decidi que era o momento ideal para fazer um pouco de exercício físico, na passadeira que tinha em casa. Coloquei fones e deixei que o ritmo da música ditasse a intensidade do meu esforço. Perdi-me na sensação de liberdade que sempre me invadia quando me levava ao limite.

      Após tomar um banho, olhei para o relógio e percebi que já passava da uma da tarde. Era óbvio que me iria atrasar mais uma vez, que quando ele chegasse não ia estar pronta. Parecia que se estava a tornar um hábito e eu não estava particularmente contente com isso. Eu não gostava de ser a primeira a chegar a lado nenhum, porque nunca gostei de estar sozinha, mas também não gostava de estar atrasada. Não queria fazer ninguém esperar.

      Optei por vestir algo prático e que me permitisse mexer sem problemas. Tendo em conta o que tínhamos programado para o dia, eu sabia que ia precisar de todos os meus movimentos disponíveis, porque de certeza que não ia ser nada fácil. Nunca fui muito coordenada. Desde pequena que cair fazia parte da minha rotina diária, e apesar de, em adulta, estar a conseguir equilibrar-me melhor, quando se tratava de situações que desafiassem o meu equilíbrio eu sabia que só podiam terminar de uma maneira. Comigo no chão. A minha única dúvida era o quanto eu me sentiria envergonhada quando isso acontecesse. Na minha família era até alvo de apostas o tempo que eu aguentava sem cair. O meu record tinham sido três meses e eu duvidava que algum dia pudesse fazer melhor.

      Por que razão fui eu dizer que queria experimentar patinagem no gelo? Não podia ter optado por uma coisa menos desafiante? Talvez xadrez fosse uma opção menos perigosa para mim. Tudo que se passasse em terra firme e não exigisse muito movimento eu achava que podia fazer sem problemas. Nunca tinha entendido o conceito dos jogos de grupo, correr em linha reta, sem ter de manobrar uma bola, já era desafio suficiente para mim. Não precisava de mais nenhum obstáculo para me dificultar a vida. Na verdade, caminhar sem tropeçar constituía um exercício de grande complexidade para o meu nível de coordenação, subir e descer escadas então, nem se fala.

      Não pus nenhuma maquilhagem e apanhei o cabelo para que não me atrapalhasse os movimentos. Eu estava mesmo preocupada! Pensei muitas vezes em pedir para alterar o programa para o dia, mas sabia que, mais tarde ou mais cedo ia cair à sua frente, e se ia passar vergonha, ao menos que fosse a fazer algo mais difícil do que caminhar em linha reta.

      A campainha tocou, mas desta vez eu achava que estava quase pronta. Só faltava mesmo calçar e isso não demorava nem dois minutos. Tinha conseguido não me atrasar. Estava orgulhosa de mim própria. Abri a porta. Olhei-o muito rapidamente de cima a baixo. Vestia umas calças jeans pretas e uma camisa branca. O cabelo estava perfeitamente despenteado, o que lhe conferia um ar despreocupado. Por uns segundos deixei-me hipnotizar, e perdi-me naquela selva que eram os seus olhos, que no momento tinham um brilho especial, como se tivesse visto a pessoa mais importante da sua vida. Tentei escapar a esta linha de pensamentos, enquanto lhe dirigi-a as primeiras palavras do dia:

      -Podes entrar. Eu ainda não estou pronta. Desculpa, mas só me falta calçar, são três minutos no máximo. Já sabes onde é a sala, fica à vontade. – Tentei virar-me e andar no sentido oposto, mas senti que me puxavam de volta ao sítio onde estava anteriormente. E de repente estava parada de frente para ele, a apenas uns centímetros de distância.

      -Eu sei que é da tua natureza pedir desculpas, mas neste caso não é preciso. Eu preferia um "Bom dia!" e talvez um sorriso se te apetecer. – Claro que sorri automaticamente e sem que pensasse no assunto, e isso já se estava a tornar tão natural que eu quase não notava quando acontecia.

Henry White (Português)Onde histórias criam vida. Descubra agora