-Diz-me o que te trouxe aqui tão cedo? Faltam mais de duas horas para o jantar.
-Não sei bem. Tenho estado nervoso o dia todo. Não consigo parar de pensar naquilo que tenho de dizer, a tentar programar tudo, para ter a certeza de que não me esqueço de nada. Não sei se vou ser capaz. Acho que me vão faltar as palavras, ou a coragem.
-Claro que consegues. É a tua mãe, vai desculpar-te de qualquer forma. É um amor incondicional que ninguém consegue explicar. As mães perdoam tudo a um filho. Respira fundo, eu vou estar mesmo ao teu lado, vai correr tudo bem. Não penses demais, deixa que saia do coração. – As suas mãos continuavam em volta da minha cintura. Enquanto falava levantei o rosto na direção do seu, e permiti-me olhá-lo diretamente nos olhos. Havia muito pouca distância entre nós os dois e isso não me assustava. Eu sentia a sua respiração tocar de leve o meu rosto. Estávamos tão perto um do outro, que via pela primeira vez pequenas sardas que figuravam as suas bochechas. A minha vontade era acabar com o espaço que existia entre os dois e deixar que os nossos lábios se encostassem pela primeira vez, mas sabia que não era uma boa ideia. Nós tínhamos um jantar a seguir que já o deixaria com demasiadas coisas em que pensar, e eu não queria ser apenas mais um problema para ele resolver. De qualquer forma, nada me impedia de aproveitar aquele momento mais um pouco e foi exatamente o que fiz.
Observei de perto o seu rosto e deixei-me encantar pelas pequenas rugas de expressão que se formavam na sua testa. Percorri todas as suas imperfeições com o olhar e depois de analisar cada uma delas ao pormenor, comecei a duvidar se se podiam realmente definir assim, ou se no seu conjunto o tornavam ainda mais completo. Em algum momento, sorrimos um para o outro e eu fiquei sem ar. Um sorriso como o dele devia ser ilegal. Era demasiado bonito para a minha sanidade mental e eu sabia que tinha de me afastar depressa ou então não seria capaz de o fazer mais tarde.
Tirei as minhas mãos que estavam apoiadas nos seus ombros levantei-me, e dei dois passos atrás, de forma a colocar alguma distância entre nós os dois. Aquela era mais distância do que eu queria que nos separasse, mas sabia que era necessária para que não cedesse à minha vontade de o tocar novamente.
Foi quase dolorosa a sensação que me atravessou o corpo inteiro, foi como se estivessem a puxar cada nervo do meu corpo para fora do mesmo à medida que me distanciava dele. Sabia que se me voltasse a aproximar aquela dor passaria, mas também sabia que não podia. Tinha de me habituar a estar distante, afinal nós eramos apenas amigos e como tal, o meu corpo não tinha o direito de exigir a sua presença. Era mais fácil falar do que fazer.
Todo o meu ser clamava pela proximidade que eu lhe estava a negar, era como se ele fosse o meu vício e eu estivesse em abstinência. Logo eu, que tinha passado a vida inteira a fugir de toda e qualquer substância que me tornasse dependente. Encontrava-me ali agora. Que ironia. Aquela que se gabava de não ter nenhum vício, estava completamente dependente da presença de outra pessoa. Era como se ele tivesse saído do meu inferno pessoal, mas eu, na sua presença sentia-me no céu. Se tivesse de suportar aquela dor para o resto da vida, mas tivesse direito, em contrapartida, à sua presença, então que fosse. Estava pronta para a suportar. Que masoquista, eu sei.
Dei um pequeno passo na sua direção, para poder aplacar a vontade que tinha de estar nos seus braços novamente. O seu olhar mantinha-se, inequivocamente, preso no meu e de alguma forma, contra tudo aquilo que eu era, senti-me relaxar. A sua presença era como um calmante para a minha alma e eu já nem estava preocupada em escondê-lo. Quando estivéssemos juntos, eu acabaria a sorrir, era inevitável e, ao mesmo tempo, tão bom saber isso.
Tudo o que o envolvia ia contra a minha maneira de estar na vida. Eu fazia por estar o mais distante das pessoas que conseguia, não gostava de dar confiança a quem quer que fosse, muito menos ficar dependente de terceiros. Estar com outras pessoas, que não pertencessem à minha família, ou ao meu círculo de amigos próximos, deixava-me nervosa. Eu mantinha uma barreira que me separava do resto do mundo e que me protegia contra todas as desilusões que pudessem advir de qualquer tipo de relações. E ali estava eu, na maior contradição da minha vida. Ele! Que desde o início me tinha feito sentir segura, menos só, compreendida, completa. Eu que sempre me preocupava com tudo, não me tinha, nunca, preocupado com aquilo que nós tínhamos, porque sentia que estava certo.
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Henry White (Português)
RomanceEla é uma mulher decidida, de 23 anos, que largou o seu país por um sonho. Ele, com 25 anos, é incompreendido pela maioria. Ela continua a lutar todos os dias para conquistar o que tanto deseja. Ele desde da adolescência que já tem tudo o que sonho...